No mesmo ano do alegado crime, a outra filha do arguido, de 21 anos, tinha já apresentado uma denúncia de violência doméstica, por "maus tratos físicos e psíquicos" alegadamente infligidos pelo arguido à esposa e duas filhas ao longo dos anos, refere o Ministério Público (MP) no despacho de acusação a que a agência Lusa teve acesso.
O arguido, preso preventivamente, é acusado pelo MP de homicídio qualificado na forma tentada.
Segundo a acusação, a vítima saiu de casa dos pais, situada no Bairro Social de Carromeu, e passou a residir com a sua filha, de oito anos, em 2014. A 29 de julho de 2015, também a esposa do suspeito e a filha mais nova do casal saíram de casa e passaram a morar com a vítima, contra a vontade do homem, pintor de profissão.
O arguido não se terá conformado "com a separação" da sua esposa, com quem estava casado desde 1989, tendo "por diversos meios" tentado convencer a mulher a regressar a casa, "perseguindo-a e recorrendo a intermediação de terceiros", conta o Ministério Público.
A 24 de agosto, a esposa, a vítima e a sua filha dirigiram-se à casa do suspeito por volta das 11:00 para utilizarem a máquina de lavar roupa, por a máquina existente na casa da vítima se encontrar avariada.
A fim de evitarem qualquer contacto com o arguido, a esposa e a sua neta ficaram na rua perto do carro, enquanto a filha mais velha dirigiu-se sozinha à garagem da habitação para utilizar a máquina de lavar.
Lá dentro, a vítima terá sido abordada pelo arguido, que pediu para que "intercedesse junto da mãe, no sentido de a convencer a regressar a casa", refere o despacho.
Perante a recusa, o homem terá ido buscar uma faca de cozinha com uma lâmina de 24 centímetros de comprimento e, aproveitando o facto de a vítima se encontrar de costas, ter-lhe-á desferido um golpe na coxa direita.
Segundo o MP, a vítima voltou-se, "surpreendida pelo ataque", momento em que o arguido alegadamente desferiu "com força um outro golpe no tórax", provocando a queda da vítima.
Colocando-se em cima da vítima, o suspeito terá tentado novamente espetar a faca no peito da filha, que agarrou com as suas mãos na lâmina da faca, travando a trajetória.
"Não faças isso. Olha a tua neta. Olha a tua vida", terá gritado a filha, que se conseguiu soltar e fugir para fora da residência, onde foi socorrida pela mãe e por populares.
Após a fuga, o MP afirma que o arguido se terá autoflagelado com outra faca de menores dimensões.
No decorrer do processo, o homem terá alegado a sua eventual inimputabilidade, mas a própria avaliação psiquiatra realizada no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, aquando do alegado crime, concluiu que o doente não padecia de patologia do foro mental.
O julgamento inicia-se na quarta-feira, às 09h15.