No início do julgamento, o arguido, acusado de homicídio qualificado na forma tentada, negou parte dos factos presentes na acusação do Ministério Público (MP), sublinhando que não teve intenção de tentar matar a sua filha mais velha.
Visivelmente abalado e nervoso, tendo chorado em vários momentos da audiência, o homem, que era pintor na Câmara Municipal de Mira, contou que desde que a sua mulher e filha mais nova saíram de casa, a 29 de julho de 2015, que entrou "em depressão" e que "só bebia e fumava".
A 24 de agosto, quando a filha mais velha foi à sua casa para utilizar a máquina de lavar este ter-se-á ajoelhado e pedido para o levar "ao hospital", contou, contrariando a versão da acusação que refere que o homem terá pedido para que a filha convencesse a mãe a regressar a casa.
O arguido disse que de seguida agarrou na faca "da matança do porco" com a mão direita, sem saber explicar o porquê de o ter feito, - altura em que a filha se virou contra ele, ao que este respondeu com "um empurrão" com a mão esquerda.
Posteriormente, o homem, com cerca de 50 anos, terá tentado abraçar a filha para acabar com o conflito, momento em que terá atingido a filha "na perna", sem intenção, alega.
"Assim que senti o sangue fiquei completamente atrapalhado e larguei a faca. Não dei mais golpes", salientou, indo novamente contra os factos alegados pela acusação, que refere que este terá tentado atingir a filha no peito.
Já a vítima, que prestou declarações com o pai fora da sala de audiências a seu pedido, confirmou a acusação e frisou que o arguido, naquele dia, pediu para "obrigar" a mãe a voltar a casa.
Emocionada, a filha contou que teve de agarrar a faca com as mãos, para não ser atingida no peito pelo pai. Caso não o fizesse, "não estaria aqui", realçou.
Apesar de considerar que, num primeiro momento, a intenção do arguido não seria matar, "num segundo momento a intenção já era outra", notou.
Um psicólogo que tinha consultado o arguido antes do alegado crime afirmou em tribunal que o homem "estava numa situação descontrolada", tendo ficado com "a noção clara de que o senhor, embora tivesse consciência, tinha uma perturbação de impulso".
Na altura, o psicólogo aconselhou o arguido a efetuar uma avaliação psiquiátrica e neurológica.
Durante a audiência, foi requerida uma perícia psiquiátrica ao Instituto Nacional de Medicina Legal.
No mesmo ano do alegado crime, a filha mais nova do arguido, de 21 anos, tinha já apresentado uma denúncia de violência doméstica, por "maus tratos físicos e psíquicos" alegadamente infligidos pelo arguido à esposa e duas filhas ao longo dos anos, refere o Ministério Público (MP) no despacho de acusação a que a agência Lusa teve acesso.