Marisa Matias, apoiada pelo Bloco de Esquerda, e André Ventura, líder do Chega!, são dois dos sete candidatos presidenciais às eleições de dia 24 de janeiro e estiveram, na noite desta quinta-feira, em debate na SIC. Num debate tenso e (quase) sempre aceso, ambos trocaram diversas acusações em temas como a Saúde, as minorias e a Escola Pública.
Marisa Matias começou por reiterar que não daria posse a um Governo apoiado pelo Chega!, justificando que um "Presidente que proteja a Constituição não pode dar posse a um Governo que dependa de um ministro racista".
Em resposta, André Ventura questionou: "Deixaria o Governo ficar em banho-maria durante não sei quanto tempo? Ou ia provocar eleições até o resultado que lhe agradasse? É essa a sua lógica de defender a Democracia?" O líder do Chega! chegou a acusar a dirigente do Bloco de "insanidade anti-democrática".
A ida da Polícia Judiciária ao gabinete de Ventura, buscas nas câmaras apoiadas pelo BE e até Ricardo Robles foram 'armas de arremesso' entre os candidatos nos 30 minutos em que estiveram frente a frente. Também o "português comum" foi um dos temas do debate.
Ventura, afirmou a bloquista, é um candidato que "está sistematicamente a mentir ao eleitorado", "tem toda a força para os mais frágeis mas não tem uma palavra sobre o crime económico e os paraísos fiscais". "André Ventura é cobarde, troca-tintas, na realidade é um vigarista".
Marisa Matias não daria posse a um Governo apoiado pelo Chega!
André Ventura: "A razão de repudiar esta decisão é simples. O Chega! é um partido que faz parte da Democracia portuguesa, na última sondagem estava em segundo lugar, destacado do BE. Dizer que não dá posse a um Governo com o Chega! é o mesmo que dizer que... se um dia chegarmos à situação de Chega e PSD forem os únicos capazes à Direita de fazer uma maioria, o que é que a Presidente Marisa Matias fará?
Isto é uma candidatura com uma lógica irresponsável, porque é o mesmo que dizer que o Chega!, por muito que cresça... dizer que esta parte do eleitorado não interessa e que o Chega! tem de estar arredado disto tudo. Acho que se a própria Marisa fosse Presidente faria diferente".
Marisa Matias: "Não faria diferente. O que vimos ontem nos EUA faz-me lembrar o que o meu adversário André Ventura publicou no Twitter quando foi das eleições e onde disse que se a vitória de Trump se confirmasse a Democracia venceria no Mundo. Acho que está tudo dito. A extrema-direita é igual em todo o Mundo.
Não poderia dar posse a um Governo que tenha um ministro que defende o segregacionismo e a discriminação das pessoas com base na sua cor da pele. E estamos a falar de um cenário que é imaginário. Volto a dizer que um Presidente que proteja a Constituição não pode dar posse a um Governo que dependa de um ministro racista".
André Ventura: "O que faria? Deixaria o Governo ficar em banho-maria durante não sei quanto tempo? Ou ia provocar eleições até o resultado que lhe agradasse? É essa a sua lógica de defender a Democracia? Os eleitores podem votar no Chega!, mas eu não gosto do Chega porque é o mauzão e então não lhe vou dar posse? Eu daria posse a um Governo com o Bloco de Esquerda.
Procuraria exercer influência para que as expropriações, a Lei de Bases da Saúde e outros não começassem a destruir a economia portuguesa. [...] Se o BE não é de extrema-esquerda não sei o que é ser de extrema-esquerda. Um partido que diz que tudo o que é privado é para destruir... só o público é que é bom. Isto é extrema-esquerda. Se Marisa Matias tivesse maioria eu não tinha a insanidade anti-democrática que tem de dizer que os portugueses votaram mas eu como não gosto, não lhes dou posse".
Marisa Matias: "Há muitas coisas que nos separam. André Ventura é o único candidato que teve a PJ a fazer buscas no seu gabinete, num caso que tem a ver com questões de corrupção e de financiamento ilícito dos partidos".
André Ventura: "No mesmo dia em que estiveram no meu gabinete, estiveram em 300 e tal autarquias no país. E estiveram nas autarquias que o BE apoia, como a de Lisboa, e não a vi a tirar a confiança política a Medina".
Marisa Matias: "O que é que a PJ esteve a fazer no seu gabinete? O André Ventura tem esta postura interessante que gosta sempre de falar dos outros, mas quando é em relação a ele é tudo uma conspiração. Mas não é tudo conspiração. O André Ventura sabe que nas comissões de inquérito relativas aos paraísos fiscais o gabinete para o qual trabalhou... diz que representa o português comum mas não, o que faz é estar ao lado dos mais fortes. Porque o seu programa e o que defende não é para defender o português comum. André Ventura defende uma taxa de IRS que seja comum a toda a gente, sabe o que isso faz ao português comum?"
André Ventura: "Não sabe do que está a falar."
Defender o "português comum"
Marisa Matias: "Sei que não gosta que falem do seu programa, que não quer que os portugueses levem a sério aquilo que escreveu e que está sempre a fazer troca-tintas. O senhor defende uma taxa de IRS de 15%, o que significa que os portugueses comuns, os que têm salários baixos, que vão ter um aumento de impostos brutal. Mas, ao mesmo tempo, os que têm salários altos, têm um abatimento de centenas de milhares de euros".
André Ventura: "A hipocrisia do BE está aqui toda muito clara. Há buscas na Câmara de Lisboa e a Marisa Matias está em silêncio sobre isso. Diga aqui que o BE vai tirar apoio a Medina. Isso é que os portugueses gostavam de ouvir de alguém que tivesse coragem. Como não tem vem com a ladaínha que toda a gente já conhece: ele é um mauzão. Não foi o Chega! que teve um Ricardo Robles, não foi o Chega! que deu moradas falsas no Parlamento. Escusava de fazer esta figura.
Já percebi que fiscal não é a sua área. Esqueceu-se de dizer que eu trabalhei para a Autoridade Tributária. Mas isso não lhe dava jeito dizer. Fiz muita coisa na vida, ao contrário da Marisa, que fez se calhar menos. A taxa única é aplicada em países que, ainda no ano passado, subiram no ranking. E é combinada com duas lógicas: isenções e deduções. Alguém que ganhasse 650 euros estaria completamente isento".
Marisa Matias: "Eu comecei a trabalhar com 16 anos. O que é essencial é que quem não percebe nada disto é o candidato Ventura e, se não percebe, não estrague. Afeta e ataca o português comum. A segunda forma que o ataca é ter no seu programa destruir o SNS. O que seria deste país em pandemia se não tivéssemos o SNS? Todos os portugueses honrados sabem que se quiserem destruir o SNS votam no André Ventura, se quiserem salvar e reforçar, votam em mim. É a escolha essencial.
André Ventura diz defender o português comum, mas no seu programa fala em vender as escolas. Gostava de saber onde as famílias deste país iam colocar as famílias a estudar. O que sabemos de André Ventura é que é um candidato que não quer que as pessoas saibam o que apresenta no seu programa, que está sistematicamente a mentir ao eleitorado, que tem toda a força em relação aos mais fracos, mas não tem uma palavra em relação ao poder económico a não ser ajudá-lo a fugir para paraísos fiscais. André Ventura é cobarde, troca-tintas, que, na realidade, é um vigarista. Não digo isto como insulto..."
André Ventura: "Sei que está mal nas sondagens, mas não é motivo para ofender dessa maneira. Fica-lhe muito mal ter essa linguagem, não a vou ter consigo e acredite que tenho muitos motivos para a ter consigo, porque se há vigarista nesta mesa... está desse lado."
Continua a defender o fim progressivo do SNS e a privatização da escola pública?
André Ventura: "O Chega! propôs na AR uma comissão de inquérito ao financiamento das campanhas eleitorais. Como votou o BE? Não votou a favor. A Marisa tem razão, parece que andamos a mentir aos portugueses, mas é o BE que anda a mentir aos portugueses. Antecipação da idade da reforma dos Enfermeiros: BE não votou a favor. Revisão salarial dos profissionais do setor da Saúde: apenas o Chega! votou a favor desta proposta. BE votou contra o aumento do salário dos políticos. E o vigarista sou eu?
O que defendemos na Educação é muito simples: o que não queremos é esta Educação à Bloco de Esquerda. Em que quem não tem dinheiro tem de ir para o Público. O BE tem uma enorme cegueira ideológica".
Marisa Matias: "Quando digo que o candidato André Ventura é cobarde, digo porque sabemos bem que ele tem toda a força de ataque em relação aos mais fracos, aos mais pobres. Não tem uma palavra para os que dominam o poder económico neste país. Vemos como está a querer retirar apoios sociais aos mais pobres dos Açores. Quando disse que é troca-tintas é porque na sua trajetória está, sistematicamente, a dizer uma coisa e o seu contrário. É ver o caso do voto do Novo Banco.
Quando disse que é vigarista é porque mentiu e continua a mentir aos portugueses e disse que iria lutar pela exclusividade dos deputados e acumulou três ordenados. Já era candidato à Presidência da República e ainda estava a trabalhar para o tal gabinete que ajuda empresas a fugir aos seus impostos. O candidato André Ventura cada vez que se sente ameaçado ou que tem medo vai buscar casos e vai buscar tudo para o lamaçal".
André Ventura: "Parece que não tem passado. Então explique lá se não defendeu a saída do Euro. Explique a troca-tintas que é a Marisa Matias. Quer explicar isso? Você e o seu partido são maiores troca-tintas da história da Democracia em Portugal".
Marisa Matias: "O senhor é que ainda não respondeu nem vai responder ao que é que a PJ esteve a fazer no seu gabinete. Traz estes casos e estou a debater para a Presidência da República, não vou falar dessas questões".
Fluxo migratório. Onde está o André Ventura com postura humanista?
André Ventura: "Não podemos fechar as portas a quem foge da guerra, do terrorismo e da perseguição religiosa. Por uma razão: porque nós na Europa também já o fizemos. Não é qualquer pessoa que chega de Marrocos de barco, entrar de qualquer maneira na Europa e com os contribuintes europeus a pagar. Não podemos estar a receber barcos de toda a maneira que chegam à costa da Europa. Não podemos ter uma Europa em que uns estão cá para pagar e trabalhar e outros estão cá para chegar e receber tudo sem fazer nada".
Marisa Matias: "É um discurso que envergonha qualquer democrata, estamos a falar de um candidato que, sistematicamente, recorre às minorias, aos refugiados, aos ciganos para por o país contra os mais fragilizados. É um cobarde que usa estas pessoas que precisam de uma resposta para tentar colocar o país contra eles".
André Ventura: "Não serei o Presidente dos pedófilos, dos traficantes de droga. Não serei o Presidente dos que vivem à conta do sistema e de subsídios manhosos do Estado".
Marisa Matias: "Onde os vai por?"
André Ventura: "Vou obrigar o Estado a fazer alguma coisa pela primeira vez, que é o que não faz há 46 anos. Vou fiscalizar, que é o que não quer fazer. Porque andam pessoas a mais a viver à conta dos nossos impostos. Seja corajosa. Há problemas com estes grupos. Os portugueses estão fartos de pagar para quem não quer fazer nada".
Marisa Matias: "É de uma hipocrisia total. Só fala de impostos quando fala dos mais pobres. A sua hipocrisia é tão grande, vai buscar a questão da droga, ainda hoje o vi numa entrevista assumir que já consumiu drogas. Acha que devia ter sido preso por isso? Precisamos de responder às necessidades destas pessoas. Não é usá-las como bode expiatório. É óbvio que não é com uma posição de exclusão, de discurso xenófobo e racista, de profunda ignorância e desconhecimento da realidade.
"O que sei é que os portugueses não podem contar consigo para poder ter mais auxílio nos medicamentos ou na Saúde. A sua proposta é destruir o SNS".
Lei de Bases da Saúde
Marisa Matias: "Defendo na íntegra a proposta de Lei de Bases da Saúde apresentada por Semedo e Arnaut. Temos que utilizar todo o dispositivo que temos, seja ele privado ou não, mas tem de ser o comando do SNS. E tem de ser a preços de custo. Não podemos aceitar o negócio".
André Ventura: "Que enorme hipocrisia. A candidata Marisa Matias e os dirigentes disseram que o privado fechou as portas quando a população mais precisou. Têm permitido acabar com a PPP do Hospital de Braga, que era um exemplo de sucesso. As pessoas ficaram a perder na Saúde pela cegueira ideológica que estes senhores têm de que todos os privados são todos um mauzões e uns trafulhas".
Marisa Matias: "Este senhor chegou a este debate e não respondeu a uma única pergunta. Traz casos, quer fazer de tudo um lamaçal, não assume o que tem no seu programa eleitoral. Nem o próprio candidato André Ventura se leva a sério sou eu que o vou levar a sério? Claro que não.
Lembro-me de André Ventura, dirigente do PSD, aplaudir o que foram as negociatas do PSD com os presidentes da Venezuela. André Ventura aplaudiu os cortes nos salários das forças de segurança, aplaudiu os negócios com a Venezuela. Enquanto dirigente do PSD era tão bem comportadinho e agora apresenta-se com um programa..."
[Última atualização às 22h26]