De Jorge Palma à Wikipédia. Os pontos altos dos dois dias de debate do OE

Austeridade, pobreza e inflação foram os temas quentes dos dois dias de debate da proposta do Governo de Orçamento do Estado para 2023. O documento vai obrigar ou não a apertar o cinto? As opiniões divergem.

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Tomásia Sousa
28/10/2022 07:28 ‧ 28/10/2022 por Tomásia Sousa

Política

OE2023

Foram dois dias de intensa discussão, de trocas de acusações e também de alguns anúncios. A resposta do Governo aos efeitos da inflação esteve no centro do debate, que culminou com a aprovação na generalidade da proposta de Orçamento do Estado para 2023 (pela maioria absoluta de deputados do PS e com as abstenções do PAN e do Livre), mas houve ainda espaço para 'cantar' Jorge Palma, recordar Passos e consultar o dicionário.

O primeiro-ministro abriu o debate na quarta-feira, prometendo uma "visão estratégica" até 2026 e um crescimento acima da média da União Europeia. António Costa destacava que a proposta "aumenta os rendimentos do trabalho, as pensões e as prestações sociais", sem esquecer as "contas certas". 

Nos dois dias de discussão, o chefe do Executivo anunciou ainda que ia avançar com a taxa sobre os lucros extraordinários (não só sobre as energéticas, mas também sobre a distribuição) e que será aprovado em breve um diploma que obriga os bancos a renegociar contratos de crédito à habitação quando os juros "subam além do teste de stress".

Uma troca de cantigas

Ao contrário do que aconteceu há um ano, António Costa chegava agora ao Parlamento com outra tranquilidade. A proposta de Orçamento tinha, afinal, aprovação garantida pela maioria absoluta do PS. 

Reconhecendo que a atual conjuntura se caracteriza por uma "brutal" perda de poder de compra em resultado de uma inflação importada, o primeiro-ministro garantiu que a gestão orçamental do Governo permite o combate a este fenómeno.

"Faz precisamente amanhã um ano que, no encerramento do debate orçamental para 2022, tomei a liberdade de pedir emprestadas as palavras do Jorge Palma para garantir desta tribuna que enquanto houver ventos e mar a gente não vai parar. Tentaram parar-nos, mas não parámos. E um ano volvido repito as mesmas palavras e garanto: não vamos parar", afirmou, numa nota de improviso e numa alusão à crise política no final do ano passado.

Já esta quinta-feira, André Ventura, do Chega, citou uma outra música, "eles já estão fartos", para contestar a ideia que as famílias estejam em primeiro neste orçamento.

"Eles já estão fartos de saber o que queres deles, eles já estão fartos de saber quem quer vendê-los, eles já estão fartos de ouvir dizer que tem que ser, eles só queriam agora tentar viver de maneira diferente, de uma maneira qualquer", entoou, deixando um apelo: "Senhor primeiro-ministro, deixe-nos viver de uma maneira diferente".

Austeridade, temos? O PS defende que não

À esquerda e à direita do PS, as críticas à austeridade da proposta de Orçamento foram constantes. 

Ainda que o ministro das Finanças garanta que os próximos quatro anos serão de aumentos, negando que o Orçamento do Estado seja de austeridade ou sintomático de "rolo compressor da maioria", a proposta não convenceu as restantes bancadas, que querem discutir uma maior proteção às famílias na especialidade.

"Peço que não seja previsível e repetitivo nas suas respostas, escusa de falar na direita, na austeridade e na 'troika' porque foram os senhores que as trouxeram em 2010 e 2011", apelou a certa altura Miranda Sarmento, do PSD, a António Costa, que insistia em apelar à memória quando o tema era o "fantasma" da austeridade.

O deputado Rui Afonso, do Chega, recorreu mesmo à Wikipédia para explicar ao Governo o conceito de "austeridade", palavra que - garante - ficará "para sempre associada" a este Orçamento do Estado.

"Eu sei que mete piada", afirmou, perante as gargalhadas no hemiciclo. "A vossa proposta não consegue devolver na íntegra o rendimento aos portugueses."

Passos, o ausente mais presente na discussão

Depois de ter sido notícia, há uns dias, graças aos elogios recentes que o Presidente da República lhe teceu, Pedro Passos Coelho não poderia estar mais 'presente' no âmbito da discussão do Orçamento do Estado para 2023.

É que, quando se falou em austeridade, era esse o nome que o Partido Socialista tinha na ponta da língua. Primeiro, o próprio primeiro-ministro e, depois, a maioria dos deputados socialistas que apostou forte em distanciar as suas políticas daquela que consideram ter sido a verdadeira austeridade: a do Governo PSD/CDS-PP dos tempos da troika.

Se, na quinta-feira, Eurico Brilhante Dias usava a sua intervenção para recuar à governação de Passos Coelho, referindo que o peso da dívida pública no Produto Interno Bruto (PIB) ficou ano após ano acima do previsto, que também "o défice não bateu certo", que houve sucessivos orçamentos retificativos, aumentos de impostos e cortes nas pensões, o líder parlamentar do PS voltou hoje à carga para atacar o legado político dos executivos de Pedro Passos Coelho (2011/2015)

Eurico Brilhante Dias voltou a defender que qualquer comparação entre governos socialistas e do PSD não resiste ao confronto com a história.

O primeiro-ministro, António Costa, apoiou esta análise, observando: "Agora fazem este papel de crocodilo lacrimejante querendo discutir se as pensões devem subir mais ou devem subir menos, quando verdadeiramente a política da direita foi sempre uma: cortar salários, cortar pensões". O chefe de Governo lembrou também "os cortes no subsídio de Natal e no subsídio de férias" feitos pela governação PSD/CDS-PP.

Esta quinta-feira foi a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, a referir-se ao antigo primeiro-ministro ao lembrar que Passos Coelho convidou os jovens a emigrar. "Em Portugal já não se incentiva os jovens a emigrar. Pelo contrário, estamos a abrir Portugal ao mundo, a criar as condições para captar e reter talento, e para que mais pessoas escolham Portugal para viver e trabalhar", afirmou.

E agora, o que se espera?

Além dos anúncios feitos na quarta-feira pelo primeiro-ministro - no que diz respeito à taxa sobre os lucros extraordinários, por exemplo - esta quinta-feira, o ministro da Economia adiantou ainda que Portugal vai "chegar ao fim do ano com exportações a representar 49% do PIB".

Apesar da maioria absoluta do PS, o Governo sinalizou abertura para dar 'luz verde' a algumas medidas de outros partidos, em particular do Livre e do PAN, que se abstiveram na votação na generalidade do documento.

A discussão do documento na especialidade em plenário arranca em 21 de novembro estendendo-se por toda a semana.

O calendário acertado em conferência de líderes prevê que a redação final do documento seja fixada em 14 de dezembro.

Só depois disso é que a proposta pode ser enviada para apreciação do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

Esta é a segunda proposta de orçamento entregue pelo XXIII Governo Constitucional, depois das eleições legislativas antecipadas de janeiro em que o PS obteve maioria absoluta.

Leia Também: OE2023: Proposta do Governo aprovada na generalidade

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