Entre a "razão" e a "estupefação". Pedro Nuno e imigração dividem PS

Declarações de Pedro Nuno Santos sobre imigração geraram críticas dentro do Partido Socialista, falando de uma aproximação à Direita. Contudo, houve também quem saísse em sua defesa. Eis o que foi dito.

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© Horacio Villalobos#Corbis/Corbis via Getty Images

Notícias ao Minuto com Lusa
25/01/2025 08:35 ‧ ontem por Notícias ao Minuto com Lusa

Política

PS

O secretário-geral do Partido Socialista (PS), Pedro Nuno Santos, dividiu o partido, depois de ter afirmado, numa entrevista ao Expresso, que não se fez tudo bem nos últimos anos quanto à imigração, anunciando que vai apresentar uma solução legislativa que permita regularizar imigrantes que estão a trabalhar, mas recusando recuperar a manifestação de interesse.

 

As declarações geraram críticas entre os socialistas, nomeadamente por parte de ex-ministros e antigos colegas de Governo do atual líder do PS. Um desses casos foi Ana Catarina Mendes.

A antiga ministra socialista e atual eurodeputada mostrou-se estupefacta com a "mudança de posição" do PS sobre a imigração e o discurso sobre aceitação de culturas, criticando uma aproximação à agenda da direita e extrema-direita.

"Vejo com enorme estupefação esta mudança de posição do PS quer quanto à manifestação de interesse quer naquilo diz respeito ao discurso sobre a cultura e aceitar as culturas", criticou, em declarações à agência Lusa. 

Também o antigo ministro da Administração Interna José Luís Carneiro considerou "um erro" dizer que a manifestação de interesse provoca "um efeito de chamada" de imigrantes, como afirmou o líder do PS, alegando que este é o resultado do crescimento da economia. 

"O que produz efeito de chamada nos movimentos migratórios é o crescimento da economia. Exemplo: a Expo 98 atraiu imigrantes de todo o mundo, de tal ordem que depois teve de haver uma regularização extraordinária de imigrantes", reagiu, em declarações à Lusa, o opositor de Pedro Nuno Santos nas últimas eleições internas do PS.

a deputada socialista Isabel Moreira realçou que "a ideia de um único modo de vida ou de uma única cultura" é estranha ao PS. "Não sei o que significa respeitar 'um modo de vida' ou 'uma cultura'. Sei que a Constituição estipula que portugueses e estrangeiros estão sujeitos aos mesmos deveres e são titulares dos mesmos direitos. O meu campo de afirmação de valores e princípios é o da lei fundamental e esta não quer saber da nacionalidade de ninguém", destacou, numa nota na sua página na rede social Facebook. 

Para Isabel Moreira "a ideia de um único modo de vida ou de uma única cultura não tem base constitucional" e "é estranha" ao campo político de esquerda. A deputada socialista realçou também que tem recusado que existam "dados ou estudos que suportem a ideia de 'efeito chamada' da manifestação de interesses".

"Essa retórica nasceu no PSD de Montenegro. Ela foi tática e é nova. O número de imigrantes que recorreu a esse mecanismo é, aliás, demonstrativo disso. Tenho afirmado que onde há oferta de trabalho há imigração. E onde há leis muito rígidas e trabalho também há imigração. Simplesmente ela é ilegal", vincou Isabel Moreira.

Por sua vez, em declarações à SIC Notícias, o antigo líder da bancada parlamentar do PS Eurico Brilhante Dias admitiu que o léxico usado por Pedro Nuno Santos o "deixa relativamente incomodado", mas afirmou que todos têm direito "a ter um momento menos bom".

Para Brilhante Dias, este "tipo de abordagem cultural, que aponta aos imigrantes comportamentos diferentes" não é a linguagem do PS, mas sim um discurso usado "por quem quer dividir" que é "tipicamente a extrema-direita e alguma direita que vai a reboque".

"Não é uma questão em cima da mesa, nunca foi ponderada e misturá-la com política de imigração é um mau serviço a quem quer defender direitos iguais para todos e igualdade", disse.

De acordo com o antigo líder parlamentar do PS, "a manifestação de interesse foi um instrumento muito útil" e a "economia portuguesa cresceu". "Dizer que a manifestação de interesse permitiu uma política de portas escancaradas não é apenas injusto, é errado", concluiu.

Das críticas à defesa

Mas houve também quem saísse em defesa do secretário-geral do PS. O eurodeputado socialista Francisco Assis, que foi mandatário de Pedro Nuno, disse concordar com o líder "na forma como aborda o tema".

Numa publicação no Facebook, Assis considerou ser "vantajoso" que haja capacidade de "discutir este assunto de forma livre e séria no interior do PS". "É um tema difícil, mas não podemos permitir que o debate se faça entre o discurso racista e xenófobo da extrema-direita e um discurso assente em proclamações morais e desprovido de dimensão política", afirmou. 

Outra voz a levantar-se em defesa de Pedro Nuno Santos foi o antigo ministro da Administração Interna Eduardo Cabrita. Em entrevista à SIC Notícias, o ex-governante disse terem sido cometidos erros nos governos socialistas neste tema e apontou que a frase "mais complexa" dita por Pedro Nuno foi aquela que incidiu sobre "o modo de vida", algo que deve "esclarecer". 

Também Ana Gomes apoiou Pedro Nuno Santos. Nas redes sociais, a socialista escreveu que este "tem razão". "PNS [Pedro Nuno Santos] tem razão. E isto 'não é virar ao centro', é virar à Esquerda, incluindo por reconhecer erros de governação PS", disse, referindo ainda que quem deu "munições" à Direita foi "o Governo de Costa". 

Quem também se manifestou a favor do líder socialista foi António Vitorino. Em entrevista ao Público, considerou que o mecanismo de manifestação de interesse "subestimou o impacto e o efeito de chamada de um mecanismo mais simplificado, que explica a subida crescente do número de imigrantes num curto espaço de tempo". 

"Uma questão sensível da gestão da imigração é essa: um grande fluxo num curto espaço de tempo, que coincidiu também com as dificuldades burocráticas geradas pela extinção do SEF e pela difícil transição para a AIMA, situação que espero que esteja regularizada num espaço de poucos meses", apontou.

E fora do partido? 

Um dos partidos a pronunciar-se sobre as declarações de Pedro Nuno Santos foi o Bloco de Esquerda. O líder parlamentar do BE, Fabian Figueiredo, manifestou-se surpreendido, considerando que o socialista adotou uma "análise que era estranha" aos socialistas.

"Fomos surpreendidos com o facto de o PS querer também um entendimento com o PSD em matéria de política migratória, que é um facto recente, que é o secretário-geral do PS adotar uma análise que era estranha ao PS, que o próprio há umas semanas contrariava, que os seus deputados na Assembleia da República contrariavam", criticou o líder parlamentar bloquista em declarações à Lusa.

Também Rui Rio, antigo líder do PSD, recorreu às redes sociais para reagir e criticar os socialistas. "Parece que o PS não quer ter emenda. No momento em que Pedro Nuno Santos faz declarações sensatas e ponderadas sobre imigração, não falta quem no partido o venha logo criticar, vendo extrema-direita por todo o lado. Será estratégico? Ou apenas um tique teimoso que tarda em passar?", questionou.

"O PS, depois de atacar, percebeu que o Governo está correto"

Numa reação à entrevista do líder socialista, no Campus XXI, em Lisboa, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, saudou "a mudança de opinião" do secretário-geral do PS sobre a política da imigração do Governo, dizendo que Pedro Nuno Santos "dá razão" agora ao primeiro-ministro, que atacava há algumas semanas nesta matéria.

"O PS destruiu o SEF, deixou o Estado sem capacidade e o Governo está a recuperar os atrasos. O PS desabilitou a capacidade de integração dos imigrantes que recebemos, o Governo está a retomar e a exigir que os direitos sejam respeitados, mas também haja um compromisso com os valores institucionais. O primeiro-ministro traçou um rumo e o PS, depois de atacar, percebeu que o Governo está correto", afirmou Leitão Amaro.

Pedro Nuno desvaloriza críticas

Já depois da polémica, o líder socialista desvalorizou as críticas e defendeu que um partido humanista se deve preocupar com a forma como Portugal recebe quem chega para trabalhar. Além disso, considerou que os socialistas que se pronunciaram "fizeram o melhor que era possível". 

"Estamos a falar de pessoas que tiveram responsabilidades governativas, que fizeram o melhor que estava ao seu alcance para acolher e dar resposta à procura por parte de empresas e de trabalhadores estrangeiros trabalharem em Portugal. Fizeram o melhor que era possível e acreditam no instrumento manifestação de interesse, um instrumento no qual eu não acredito", afirmou Pedro Nuno Santos.

O secretário-geral do PS referiu que, quem o conhece e fala consigo sobre imigração, há muito tempo sabe que é um crítico desse instrumento "e, portanto, desse ponto de vista, não há nenhuma mudança".

Algumas horas antes, Pedro Nuno Santos também já havia recusado qualquer contradição nas suas posições, afirmando que não foi ao encontro das do Governo. "Eu não fui ao encontro do governo sobre este tema, há uma grande confusão sobre isso. Não há nenhuma cambalhota, não há nenhuma contradição, porque o instrumento legal que existia não era o mais adequado, o vazio legal que o Governo deixou ainda é pior porque empurra muitos trabalhadores estrangeiros para a ilegalidade", respondeu.

Leia Também: Pedro Nuno aponta incompetência na Saúde. Ministra? "Está a prazo"

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