Diz que foi o facto de ter nascido num dos "principais destinos turísticos nacionais" que o fez abandonar Direito e querer ser uma mais-valia para o turismo nacional. Luís Araújo assumiu em 2016 as rédeas do Turismo de Portugal e, coincidência ou não, desde então os números têm vindo a aumentar.
Para Luís Araújo, a estratégia passa não só por atrair turistas, como investimento. E embora o excesso de turistas já seja motivo de descontentamento, o empresário defende que Portugal só tem a beneficiar com isso.
Como tal, destaca que os seus objetivos passam por descentralizar a oferta e garantir que a procura se mantém homogénea durante todo o ano.
Licenciou-se em Direito, mas acabou por afastar-se um pouco da área, enveredando antes pela hoteleira e turismo. Porquê essa mudança?
Acredito que o facto de ter crescido num dos principais destinos turísticos nacionais contribuiu para cultivar este meu fascínio pelo turismo. Surgida a oportunidade, por que não conjugar as duas áreas que me interessam? Ambas colocam, ou deveriam colocar, o foco nas pessoas.
Assumiu a liderança do Turismo de Portugal em 2016 com que objetivo?
Com o objetivo de contribuir ativamente para o reforço da competitividade de Portugal enquanto destino turístico. E acredito que estamos no caminho certo. O ano passado (2016) fomos considerados o 14.º país mais competitivo do setor turístico no Índice de Competitividade das Viagens & Turismo do Fórum Económico Mundial. Subimos uma posição relativamente a 2015.
Nos últimos anos temos vindo a assistir a progressos extraordinários no que se refere à qualidade das infraestruturas turísticas, à melhoria da formação profissional, ao desenvolvimento de novos produtos e à transformação dos modelos de negócio. Com a estratégia que temos para os próximos 10 anos bem delineada e assente em objetivos realistas, ainda vamos conseguir desenvolver mais a competitividade de Portugal.
Trata-se de um trabalho conjunto onde o envolvimento de todos os agentes públicos e privados tem concorrido para se alcançarem este resultados.
O facto de estarmos em 'maré alta' só torna a minha tarefa e o trabalho do Turismo de Portugal ainda mais difícil e o desafio muito maiorFala em progressos extraordinários no setor. Que caminho tem traçado para não os deixar esmorecer?
É um facto que os resultados do turismo em Portugal têm vindo a atingir máximos históricos. O facto de estarmos em 'maré alta' só torna a minha tarefa e o trabalho do Turismo de Portugal ainda mais difícil e o desafio muito maior. Como conseguir ultrapassar estes resultados, já de si tão positivos?
Na realidade, terminámos 2016 com todos os indicadores a crescer. Registámos 19 milhões de hóspedes - crescemos 9,7% - e, pela primeira vez, o número de estrangeiros ultrapassou o número da população portuguesa: recebemos 12 milhões de hóspedes estrangeiros. Naturalmente, os aumentos refletiram-se também nas receitas, com um crescimento de 10,4%, para 12,7 mil milhões de euros. A estratégia que delineámos em articulação com todo o sector, assente em objetivos tangíveis, está a revelar-se eficaz e há que continuar a implementá-la.
É fundamental fazer do empreendedorismo e do apoio à inovação duas prioridades absolutas na estratégia para o futuro do turismoE que estratégia é essa?
A aposta na inovação é fundamental para assegurar a sustentabilidade do setor. O turismo é uma das atividades mais digitalizadas e dinâmicas do mundo e o Turismo de Portugal foi pioneiro nesta aposta tendo, hoje, toda a sua estratégia orientada para o digital. Desde a promoção à gestão do conhecimento, passando pela aposta na tecnologia. A digitalização do turismo é essencial ao seu crescimento, se queremos posicionar Portugal como um polo de referência na inovação, no empreendedorismo e na produção de bens e serviços para a indústria. No entanto, e apesar da sua crucial importância, o digital não é tudo. É por isso fundamental continuar a aposta nas acessibilidades, na visibilidade do pais e na estratégia de parcerias com a distribuição.
A sustentabilidade desta atividade depende, em muito, da reinvenção sistemática das experiências nos destinos e melhoria dos sistemas de suporte. Para que isso possa acontecer é fundamental fazer do empreendedorismo e do apoio à inovação duas prioridades absolutas na estratégia para o futuro do turismo.
Estamos prestes a inaugurar o Centro de Inovação do Turismo, projeto âncora do Programa Turismo 4.0, que tem como missão a identificação das tendências internacionais de inovação no turismo e o apoio à promoção internacional da inovação feita em Portugal. Com os objetivos a serem concretizados através da experimentação de projetos e da capacitação das empresas no domínio da inovação e da economia digital.
Para a consolidação da competitividade é, também, essencial a qualificação dos recursos humanos. O Turismo de Portugal tem estado a reformular a sua oferta formativa e a rever os seus currículos, no sentido de integrar nos seus cursos as competências assinaladas pelo mercado.
Noutra vertente é fundamental continuar a apostar em iniciativas de estruturação de produtos ajustados a diferentes segmentos da procura, em que se incluem produtos específicos, designadamente para famílias, seniores, jovens, surf, turismo equestre.
Outro objetivo prende-se com a captação de rotas aéreas. Em 2016 surgiram 64 novas operações aéreas, o que nos tem permitido uma maior diversificação de mercados, com crescimentos expressivos do mercado norte-americano, polaco e brasileiro. Agora contamos, também, com uma ligação direta à China, o que nos abrirá portas a um dos principais mercados emissores de turistas.
Queremos que nos vejam como um destino autêntico e seguro, que prima pela simpatia e hospitalidadeO Turismo de Portugal lançou, recentemente, a iniciativa 'Can’t Skip Portugal'. Qual a mensagem transmitida lá fora sobre o nosso país?
A campanha mostra, pelos olhos de terceiros, o país como um destino único, composto por várias regiões, que pode ser visitado ao longo de todo o ano. Apresenta um país seguro e estável, que prima pela simpatia e pela arte de bem receber. Queremos que nos vejam como um destino autêntico e seguro, que prima pela simpatia e hospitalidade, que pode ser visitado ao longo de todo o ano e onde há experiências para todos os gostos e motivações.
Agora temos um rumo, somos reconhecidos e é visível o nosso contributo para o crescimento do paísDe que forma é que esta iniciativa se diferencia das já feitas pela instituição?
Destinada exclusivamente a meios digitais, a campanha será exibida ao longo de dois anos em 20 mercados, nomeadamente nos mercados tradicionais – Reino Unido, Espanha, Brasil, França, Holanda e Alemanha –, mercados em crescimento – Rússia, Polónia e Itália –, mercados de aposta – Estados Unidos, China e Índia – e mercados de aposta seletiva – Japão e Coreia do Sul –, entre outros. Permitir-nos-á chegar aos turistas que consomem mais e que trazem mais riqueza para o país que, acreditamos, serem os que vão proporcionar a estabilidade e a sustentabilidade que queremos também garantir em termos de turismo do futuro.
É preciso continuar, de forma criativa, a alargar a atividade turística a todo o ano, reduzindo os efeitos da sazonalidade e apostar neste segmento dos eventos. Acabámos, também, de lançar a plataforma Meetings in Portugal que, em rede com a oferta dos Convention Bureaux, agrega toda a informação relevante sobre eventos no território nacional.
Todos estes objetivos estão inscritos no nosso plano estratégico para dez anos: a Estratégia Turismo 2027. Agora temos um rumo, somos reconhecidos e é visível o nosso contributo para o crescimento do país.
Não é por acaso que o World Economic Forum nos considera o 14.º país mais competitivo, do ponto de vista turístico, de um total de 140 paísesQuais as potencialidades de Portugal para atrair mais investimento?
Não é por acaso que o World Economic Forum nos considera o 14.º país mais competitivo, do ponto de vista turístico, de um total de 140 países. Os bons resultados do setor comprovam que a estratégia delineada para o Turismo está a resultar. E essa estratégia passa, naturalmente, por captar turistas, mas também, investimento.
Ano após ano, assente num trabalho articulado entre entidades públicas e privadas, essa estratégia leva-nos a atingir resultados históricos. 2016 não foi exceção e assistimos, novamente, ao crescimento de todos os indicadores - dormidas, receitas, hóspedes, emprego e exportações - com o Turismo a ser considerado a maior atividade económica exportadora do país, sendo responsável por 16,7% das exportações globais e 48,3% das exportações de serviços.
O que queremos mostrar aos potenciais investidores são estes resultados, ou seja, que este é o momento certo para investir em Portugal. Mostrar-lhes a facilidade com que se abre uma empresa, a facilidade em recrutar mão-de-obra qualificada, a simplificação e desburocratização de todo o processo. Uma das nossas metas passa, precisamente, por agilizar o relacionamento da administração pública com as empresas do turismo, bem como reforçar e aproximar o Turismo de Portugal das empresas, no investimento, na capacitação, nos mercados e no conhecimento.
A nossa estratégia a dez anos posiciona Portugal como um destino para visitar, mas também, para investir, viver, estudar, investigar e criar empresasMas de que forma é que pretende transmitir essa confiança aos investidores?
Estamos a criar instrumentos financeiros específicos para o Turismo, com prazos e condições adaptadas ao investimento turístico. Falo, nomeadamente, da Linha de Apoio à Qualificação da Oferta (com uma dotação de 60 milhões de euros e capital de risco), do Programa Capitalizar (que visa a aceleração da execução do Portugal 2020) e do programa Valorizar (com linhas especificas para as acessibilidades, o Wi Fi grátis nos centros históricos e uma linha específica para projectos no interior do país).
O Turismo de Portugal tem vindo a desenvolver também operações de estímulo para a captação ativa de investimento direto estrangeiro, através de ações nos mercados externos como roadshows, missões empresarias, elaboração de dossiês e instrumentos de prospeção de mercados e de atração de investimento. Apostamos em ações de suporte e acompanhamento ao investidor e ao empresário, com a disponibilização de informação completa, acessível e em interfaces que permitem uma comunicação eficaz, permanente e interativa, como uma plataforma específica para o investidor. Veja-se como exemplo o programa REVIVE em que 33 imóveis do domínio público serão concessionados para uso turístico.
A nossa estratégia a dez anos posiciona Portugal como um destino para visitar, mas também, para investir, viver, estudar, investigar e criar empresas. Um país onde se valorizou e investiu nas pessoas e nas suas qualificações, atraindo talento. Um país de referência na produção de bens e serviços para a atividade turística à escala mundial. Queremos mostrar que as oportunidades de investimento em Portugal vão além do mercado imobiliário.
Apesar dos benefícios a nível económico, há quem também critique o excesso de turismo, sendo a cidade de Lisboa o principal rosto destas queixas [o presidente do CCB disse, por exemplo, que Lisboa parecia Bombaim porque estava sobrecarregada]. Concorda com esta crítica?
De todo. Assistimos atualmente a uma crescente qualificação da oferta turística. Nunca houve um investimento tão significativo em infraestruturas, em equipamentos, em formação na área do turismo. E o país, como um todo, só tem a beneficiar com isso.
Queremos que a procura turística se distribua pelo país de forma mais homogéneaMas como se pode descentralizar essa procura? Que outros destinos dentro de portas podem e devem ser promovidos?
A nossa estratégia passa por promover Portugal enquanto território coeso, queremos que a procura turística se distribua pelo país de forma mais homogénea. Claro que Lisboa, Madeira e Algarve ainda são as regiões mais procuradas, mas começa a assistir-se a uma descentralização com outras regiões - Norte, Centro, Açores e Alentejo - a criarem produtos estruturados, diferenciadores e com qualidade.
Criámos, por exemplo, no ano passado, um departamento no Turismo de Portugal especializado na captação de grandes eventos e uma linha de apoio a eventos estratégicos para o país. Qualquer região ou qualquer cidade se pode candidatar, mas decidimos dar prioridade de apoio a regiões menos turísticas e, nas mais turísticas, privilegiar o apoio na época baixa. Há todo um trabalho em rede muito significativo de identificação de propostas e de criação de sinergias para que essas propostas sejam viáveis.
Há muito trabalho ainda por fazer, mas, unindo esforços entre regiões, entre entidades públicas e privadas, acredito que os resultados serão muito positivos.
E como olha para as novas plataformas de alojamento como o Aibnb? São uma mais valia para o setor?
Sem dúvida. Se existem, é porque têm procura e fechar a porta à procura é perder competitividade.
Importa agora regulamentá-las e certificarmo-nos que contribuem positivamente para a qualificação da nossa oferta. Ambicionamos crescer, sim, mas em qualidade.
Portugal tem sido, por diversas vezes, elogiado lá fora. Mais do que o é por quem cá vive. Por que razão considera que isso acontece? Não sabemos dar valor ao que temos?
Não estou de acordo. Tenho a perceção de que tanto somos elogiados no estrangeiro como 'cá dentro'. Acho é que os acontecimentos dos últimos meses - e falo, naturalmente, do facto de sermos campeões europeus de futebol, de termos um secretário-geral das Nações Unidas português e vencedores do Festival Eurovisão da Canção – nos deram uma projeção internacional a que não estávamos habituados.
O mesmo se pode dizer do sector Turismo: em 2016 tivemos 16 mil referências e artigos internacionais sobre Portugal. No primeiro semestre de 2017 ultrapassamos este valor com 16.350 artigos publicados.
Como é a relação do Turismo de Portugal com o Governo? Os apoios do Estado para esta área são suficientes?
Trabalhamos para objetivos comuns, logo, diria que temos uma relação de confiança e perfeita simbiose não apenas com a nossa tutela (Secretaria de Estado do Turismo e Ministério de Economia) como com todos os gabinetes ou demais organismos públicos.
Claro que, na sua essência, os recursos são sempre escassos. Se tivéssemos mais recursos, poderíamos fazer muito mais. E ambicionamos ter sempre mais. Mas considero que estamos a fazer o nosso melhor com os recursos existentes e com as regras de funcionamento e os condicionalismos que existem na administração pública. E o balanço é muito positivo. Acreditamos que o retorno está à vista não apenas no volume de receitas para o país como na criação de postos de trabalho e valorização de outras atividades.
Acredita que o turismo pode ser a principal fonte de receita a aproveitar pelo Estado para ultrapassar as dificuldades financeiras vividas recentemente?
Creio que os números e os bons resultados do setor, a nível nacional, têm vindo a comprovar que o turismo é, e pode ser cada vez mais, um fiável gerador de emprego. O turismo é atualmente uma das atividades económicas mais dinâmicas em Portugal, posicionando-se como o maior exportador de serviços no país.
O peso do saldo turístico sobre o PIB atingiu, em 2016, os 4,8%, tendo o total das receitas turísticas um peso de 6,9% sobre o PIB – dados que confirmam a tendência de crescimento verificada nos últimos anos e a importância que esta atividade detém na economia nacional.
Estes resultados são a demonstração da forte competitividade do turismo e das empresas do setor em Portugal, que evidenciam a vitalidade do setor e reforçam o papel fundamental do turismo para a estratégia de crescimento e de criação de emprego no país.
E quanto à TAP, continua a ser o maior parceiro de Portugal no Turismo?
É um parceiro indispensável, sem dúvida, como todos são. É graças a este esforço conjunto, entre todos os parceiros, que conseguimos alcançar resultados tão positivos.
Daqui a uns anos, espero olhar para trás e ver que a minha contribuição para o crescimento sustentado desta atividade foi positivaCom apenas 46 anos, já trabalhou com grandes nomes da hotelaria internacional e é hoje líder da principal organização dedicada ao Turismo em Portugal. Era uma meta ambicionada?
Não diria isso, de todo. A única ambição que sempre tive foi a de aprender, cada vez mais. Nunca deixar de aprender e ser feliz a fazer o que faço.
E o que se segue?
Seguem-se tempos de muito trabalho. Para fazer do Turismo de Portugal um organismo ainda mais reconhecido pela sua competência e inovação e para fazer do turismo em Portugal uma opção top-of-mind não só para visitar, mas também para estudar, investir, ou, até, morar.
Daqui a uns anos, espero olhar para trás e ver que a minha contribuição para o crescimento sustentado desta atividade foi positiva.