Eurogrupo enfrenta reunião decisiva: Tudo o que está em discussão
Os ministros das Finanças da zona euro reúnem-se na terça-feira, por videoconferência, num encontro decisivo sobre a resposta comum da União Europeia face aos efeitos profundos da pandemia covid-19 sobre as economias dos Estados-membros.
© Reuters
Economia Eurogrupo
Eis os principais elementos das discussões em curso sobre a resposta económica à covid-19:
Série de reuniões
Esta será a quarta reunião por videoconferência dos ministros das Finanças europeus consagrada à resposta aos efeitos da pandemia covid-19 nas economias europeias, no espaço de sensivelmente um mês.
As anteriores reuniões presididas por Mário Centeno -- e alargadas aos países que não fazem parte da moeda única -- tiveram lugar em 04, 16 e 24 de março.
Polémica na última reunião
Na anterior reunião do Eurogrupo, realizada em vésperas da cimeira de líderes da UE de 26 de março, o ministro das Finanças holandês teve a 'famosa' intervenção que suscitou a indignação dos países do sul da Europa, com o primeiro-ministro António Costa à cabeça.
De acordo com fontes citadas na imprensa europeia, Wopke Hoekstra afirmou que a Comissão Europeia devia investigar países, como Espanha, que afirmam não ter margem orçamental para lidar com os efeitos da crise provocada pelo novo coronavírus, apesar de a zona euro estar a crescer há sete anos consecutivos.
Dois dias depois, em conferência de imprensa após a reunião do Conselho Europeu, António Costa, questionado sobre a opinião expressa por Hoekstra, considerou-a "repugnante". A indignação teve eco internacionalmente, várias vozes juntaram-se à do primeiro-ministro português, e cinco dias volvidos, em 31 de março, o ministro holandês reconheceu publicamente que foi infeliz e que mostrou pouca "empatia" para com os países do sul da Europa.
Este episódio e o atual braço de ferro entre os países do norte e do sul são no entanto um sinal evidente de que as velhas feridas da anterior 'crise do euro' não sararam por completo ao longo dos últimos 10 anos, e bastou chegar uma nova crise para ficarem de novo expostas (se é que não estavam já nas discussões sobre o próximo orçamento plurianual da UE, com o 'combate' entre os países da coesão e os chamados 'frugais').
«Convite» do Conselho Europeu coloca pressão
Nesta reunião, os ministros das Finanças têm uma missão declarada, que lhes foi confiada pelos chefes de Estado e de Governo da União Europeia, no final de uma tensa cimeira por videoconferência celebrada em 26 de março: chegar a um acordo.
No final dessa cimeira, que se prolongou por cerca de seis horas, os 27 "convidaram" os ministros das Finanças da zona euro a apresentar, no prazo de duas semanas, propostas concretas sobre como enfrentar as consequências socioeconómicas da pandemia, que "tenham em conta a natureza sem precedentes do choque de covid-19", que afeta as economias de todos os Estados-membros.
O prazo de duas semanas surgiu na declaração conjunta muito por insistência pelo primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, que se recusava a subscrever uma declaração mais vaga, tendo como consequência Mário Centeno convocado uma reunião para 07 de abril, considerada a todos os títulos decisiva, pois novos adiamentos de decisões não são uma opção.
Proposta de linha de crédito do MEE, a opção mais discutida
Entre as várias propostas sobre a mesa, aquela na qual os ministros das Finanças mais se concentraram até agora, por ser a que menos resistências conhece, é a de acionar linhas de crédito do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE), o fundo de resgate permanente da zona euro.
A ideia passaria por o MEE -- que tem uma capacidade de empréstimo de até 410 mil milhões de euros -- conceder linhas de crédito até 2% do Produto Interno Bruto (PIB) de cada país comunitário afetado pela covid-19, com poucas condicionalidades, sendo a principal que as verbas sejam naturalmente dirigidas exclusivamente a medidas para combater os efeitos da pandemia na economia.
Os opositores a esta possibilidade argumentam que, apesar de as linhas de crédito serem disponibilizadas para todos os Estados-membros, o facto de serem os países mais 'fracos' a recorrerem às mesmas criar-lhes-á um 'estigma', com repercussões negativas nos mercados e nas taxas de juro, como sucedeu em anteriores crises.
Proposta de 'coronabonds' defendida pelo sul ainda longe da unanimidade
Defendida por muitos, sobretudo no sul da Europa, a ideia de emissão de títulos de dívida conjunta -- 'eurobonds', chamados atualmente de 'coronabonds' por visarem a crise provocada pelo coronavírus -- continua a conhecer forte resistência por parte dos países que sempre se opuseram à mutualização da dívida, com Alemanha e Holanda à cabeça.
Estados-membros como Portugal, Espanha e Itália consideram que esta é a solução mais justa, solidária e global para fazer face a uma crise que, ao contrário da 'crise do euro', é simétrica, e à qual não se podem apontar quaisquer responsabilidades a este ou àquele Estado-membro.
Atualmente, cada país da zona euro emite títulos de dívida nos mercados de obrigações, com garantias nacionais. Os 'coronabonds' seriam emitidos em nome da União Europeia, o que significa que seriam emissões de dívida partilhadas pelo conjunto dos Estados-membros, protegendo assim os mais frágeis de especulações de mercado e taxas de juro altíssimas.
Face às divergências, o próprio presidente do Eurogrupo, Mário Centeno, defendeu que a discussão sobre 'coronabonds' deve aguardar pelo final desta fase da crise e que os ministros devem concentrar-se agora nas opções que mais consenso geram.
Comissão Europeia com mensagens contraditórias mas mais centrada no 'day after'
Em todo este debate sobre a melhor resposta económica à pandemia covid-19, e em concreto sobre a possível emissão de 'coronabonds', a Comissão Europeia tem dado sinais contraditórios, desde a própria presidente do executivo comunitário -- que catalogou a ideia como mero "slogan" para depois afirmar que não o disse em tom depreciativo e que é uma possibilidade --, passando por comissários que têm expressado diferentes ideias.
Hoje mesmo, questionado sobre diferentes posições assumidas no seio do colégio de comissários, o porta-voz principal da Comissão, Eric Mamer, respondeu que "ainda não há posição da Comissão sobre o assunto em questão", mas sublinhou que "há dois caminhos distintos": o Eurogrupo está a trabalhar num, que é o de ultimar propostas para o imediato, enquanto a Comissão está mais concentrada na tarefa que o Conselho lhe confiou, o de preparar um plano de recuperação para depois da crise da covid-19.
Neste particular, a presidente Ursula von der Leyen já defendeu que esse plano deve assentar no Quadro Financeiro Plurianual da UE para 2021-2027 -- sobre o qual os 27 ainda não chegaram a acordo --, pelo que a Comissão prepara-se para apresentar uma proposta totalmente revista do orçamento plurianual da UE, que tenha já em conta a resposta aos efeitos da pandemia na economia europeia.
"Para já, o que há da Comissão sobre a mesa é o programa SURE, a única proposta da Comissão neste momento", sublinhou o porta-voz, referindo-se ao fundo de 100 mil milhões de euros para empréstimos aos Estados-membros visando suportar esquemas de apoios temporários ao emprego e preservar postos de trabalho durante a crise criada pela covid-19.
E por que não ser a própria Comissão Europeia a emitir dívida?
Esta é uma possibilidade que é defendida por um número crescente de vozes, entre as quais o antigo vice-presidente do Banco Central Europeu (BCE) Vítor Constâncio, para quem a solução mais rápida e eficaz para emitir dívida conjunta seria colocar o executivo comunitário a fazê-lo.
Ao contrário do que sucede com os 'coronabonds', a emissão de títulos de dívida por parte de Bruxelas está já prevista nos Tratados -- e já ocorreu no passado --, e o reembolso dos custos da dívida poderia ser feito através de contribuições adicionais para o orçamento da UE ao longo do tempo, o que não se refletiria imediatamente no acumular das dívidas nacionais, como argumenta o antigo governador do Banco de Portugal.
Também o professor universitário e antigo ministro Miguel Poiares Maduro, em entrevista à Lusa, defendeu esta possibilidade de emissão de títulos de dívida pela Comissão, garantidos por um acordo sobre novos recursos próprios, pelo que os Estados-membros não teriam de desembolsar qualquer montante e endividar-se ainda mais, mas mais numa lógica de esta emissão financiar o tal 'Plano Marshall' de reconstrução da economia europeia no pós-covid-19.
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