Pós pandemia: O "agora ou nunca" na luta contra as alterações climáticas

As associações ambientalistas apostam no "agora ou nunca" e dizem que este é o momento de Portugal optar por uma nova economia e escolhas que levem à luta contra as alterações climáticas e ao respeito pela natureza.

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Lusa
04/06/2020 09:57 ‧ 04/06/2020 por Lusa

País

Ambiente

A propósito do Dia Mundial do Ambiente, criado pela ONU para se assinalar todos os 05 de junho, a Lusa perguntou a várias associações de defesa do ambiente se a recuperação económica depois da crise da pandemia covid-19 poderia por em causa as metas sobre ambiente e alterações climáticas. Todas admitiram esse medo, mas também que esta é a grande oportunidade para mudar de vida.

Catarina Grilo, diretora de Conservação e Políticas da Associação Natureza Portugal, que trabalha em parceria com a internacional World Wide Fund For Nature (WWF), lembra o tema deste ano para a efeméride, "Tempo para a Natureza" e um dos seus motes, "para cuidarmos de nós temos de cuidar da natureza", para recordar que a pandemia de covid-19 veio mostrar claramente a ligação entre perda de biodiversidade, zoonoses (doenças provocadas por micro-organismos e transmitidas pelos animais ao Homem) e saúde pública.

E avisa: "As escolhas que o Governo fizer agora para fomentar a recuperação económica irão determinar a trajetória do nosso país na próxima década, considerada decisiva para fazer face às alterações climáticas e para travar a perda de biodiversidade".

Um alerta semelhante de outro deixado por Paula Nunes da Silva, presidente em exercício da Quercus. Diz a responsável que as decisões no curto prazo têm de ser coerentes com as metas para 2030 e 2050, no âmbito do Plano Nacional de Energia e Clima, e em linha com o exigido no Acordo de Paris, "para travar as alterações climáticas, que são a maior ameaça à humanidade".

Ou também de Ana Paz, membro da Direção Nacional da LPN, que em discurso direto é também ela direta: "Não podemos aceitar que se continue a promover o crescimento económico, quando sabemos que os recursos terrestres não o podem suportar e quando sabemos que não serve a melhoria na qualidade de vida das populações. Precisamos de uma economia estável, justa e verdadeiramente sustentável, o que não é possível com base num crescimento eterno". Basicamente, defende a responsável, os orçamentos dos Estados deviam ser baseados na qualidade de vida e não no crescimento do PIB.

Quando os países ocidentais estão a começar a emergir de uma crise sanitária, que, além de milhares de mortos e milhões de infetados, devastou as economias, e quando tanto se fala na recuperação económica, é também um alerta que deixa Susana Fonseca, da direção da associação Zero. "É fundamental tornar a sociedade portuguesa mais resiliente às diferentes crises que poderemos/teremos que enfrentar no futuro", e não voltar ao "normal", quando o "normal" assenta numa economia que destrói o ambiente e abre a porta a futuras pandemias.

E depois lembra que com a crise provocada pela covid-19 não desapareceram as crises climática, a da escassez de recursos ou a da perda de biodiversidade.

"Os indicadores são claros nas consequências muito graves que irão resultar para todos nós, caso não promovamos uma relação mais harmoniosa entre o nosso modelo económico e os limites do Planeta".

É por isso que a Zero entende que a crise atual é a oportunidade para avançar "de forma clara" na luta contra as alterações climáticas e para refletir no papel de todos os humanos na existência da pandemia, "devido à degradação ambiental" que o modelo de produção e consumo fomenta.

E é por isso que defende que não se podem promover políticas e medidas que perpetuem vulnerabilidades. "Não aproveitar esta oportunidade em que se irão injetar milhões de euros na sociedade" para prevenir consequências de futuras pandemias, ou de alterações climáticas, "só pode ser entendido como uma enorme irresponsabilidade política e deixará claro que os atuais líderes políticos não estão à altura dos desafios", diz Susana Fonseca.

Catarina Grilo afirma também que não se pode apostar na "velha economia", que esgota recursos naturais e degrada a biodiversidade, que é poluente e geradora de elevadas emissões de gases com efeito de estufa. Fazê-lo é dar continuidade ao "business as usual" que nos trouxe até aqui, afirmou à Lusa.

O que é preciso, acrescentou, é "orientar os apoios públicos para setores, atividades e projetos que são bons para o planeta e para a economia", como a democratização do acesso a energias renováveis, a renovação de edifícios (mais eficiência energética), a aposta na ferrovia e acabar com "aberrações" como um novo aeroporto ou voos com menos de 01:30 de duração.

A direção da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) lança mais desafios, começando por lembrar que Portugal, com mais de 20% do território classificado como Rede Natura 2000, "só pode beneficiar com políticas que apoiem a biodiversidade, com a criação de novas áreas de negócio e novos empregos na gestão das áreas protegidas, na conservação e recuperação dos habitats naturais e na dinamização do turismo de natureza e do território".

E depois, num país com tanto mar e tanta agricultura tradicional, devem valorizar-se políticas que favoreçam a pesca e a produção agrícola sustentáveis.

"Os nossos governantes têm de estar conscientes deste enorme potencial de Portugal e trabalhar mais com as organizações não governamentais de ambiente", diz a SPEA.

A nível global, segundo um balanço da agência de notícias AFP, a pandemia de covid-19 já provocou mais de 380 mil mortos e infetou quase 6,4 milhões de pessoas em 196 países e territórios.

Mais de 2,7 milhões de doentes foram considerados curados.

Em Portugal, morreram 1.447 pessoas das 33.261 confirmadas como infetadas, e há 20.079 casos recuperados, de acordo com a Direção-Geral da Saúde.

A doença é transmitida por um novo coronavírus detetado no final de dezembro, em Wuhan, uma cidade do centro da China.

Depois de a Europa ter sucedido à China como centro da pandemia em fevereiro, o continente americano passou a ser o que tem mais casos confirmados (cerca de três milhões, contra quase 2,2 milhões no continente europeu), embora com menos mortes (mais de 168.500, contra mais de 180 mil).

Para combater a pandemia, os governos mandaram para casa 4,5 mil milhões de pessoas (mais de metade da população do planeta), paralisando setores inteiros da economia mundial, num "grande confinamento" que vários países já começaram a aliviar face à diminuição dos novos contágios.

 

 

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