"Os níveis recorde da dívida e as elevadas taxas de juro colocaram muitos países no caminho para a crise", disse o economista-chefe e vice-presidente do Banco Mundial, Indermit Gill, na apresentação de um relatório sobre a dívida internacional, hoje divulgado em Washington.
"A cada trimestre que as taxas de juro continuam altas, os países em desenvolvimento enfrentam mais sobre-endividamento, e enfrentam também a difícil escolha entre servir a dívida pública ou investir na saúde, educação e infraestrutura", referiu.
O responsável do Banco Mundial avisou que "a situação exige uma ação rápida e coordenada por parte dos governos devedores, dos credores privados e oficiais, e das instituições financeiras multilaterais, para além de mais transparência, melhores ferramentas para a sustentabilidade da dívida e acordos de reestruturação mais rápidos, porque a alternativa é mais uma década perdida".
No relatório, o Banco Mundial salienta que o pagamento da dívida aumentou no ano passado 5% face a 2021 para todos os países em desenvolvimento, e que os 75 países elegíveis para financiamento da Associação Internacional de Desenvolvimento (IDA), que inclui todos os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa com exceção de Angola, pagaram 88,9 mil milhões de dólares (82,4 mil milhões de euros).
"Durante a última década, os pagamentos de juros quadruplicaram para um máximo histórico de 23,5 mil milhões de dólares (21,7 mil milhões de euros) em 2022, com o custo geral do serviço da dívida para os 24 países mais pobres a dever aumentar exponencialmente, cerca de 39%, em 2023 e 2024", de acordo com o relatório.
O aumento da dívida pública no seguimento da pandemia de covid-19, que exacerbou um problema que já se vinha a formar, "fez subir as vulnerabilidades dos países em desenvolvimento, levando a 18 incumprimentos financeiros em 10 países em desenvolvimento, o maior número das últimas duas décadas", lê-se no relatório.
Atualmente, acrescenta, cerca de 60% dos países de baixo rendimento estão em elevado risco ou já em sobre-endividamento.
O relatório do Banco Mundial aponta ainda duas preocupantes mudanças estruturais relativamente à dívida: o valor dos empréstimos aos governos e às empresas públicas caiu 23%, para 371 mil milhões de dólares (343 mil milhões de euros), o nível mais baixo em dez anos, e os credores privados basicamente afastaram-se dos países em desenvolvimento, recebendo mais 185 mil milhões de dólares (171 mil milhões de euros) em pagamentos do que aquilo que emprestaram.
"Esta foi a primeira vez desde 2015 que os credores privados receberam mais fundos do que o que colocaram nos países em desenvolvimento, com as emissões de títulos destes países a caírem mais de metade de 2021 para 2022, e as emissões dos países de baixo rendimento a caírem mais de três quartos, para apenas 3,1 mil milhões de dólares [2,8 mil milhões de euros]", diz o Banco Mundial.
A redução, contudo, foi compensada por um aumento do financiamento concessional dos credores multilaterais aos países em desenvolvimento, para 115 mil milhões de dólares, 106 mil milhões de euros, em 2022, refere o BM.
A segunda tendência preocupante é o aumento do volume da dívida em comparação com o crescimento económico: "os países elegíveis para a IDA passaram a última década a acumular dívida a um ritmo que excede o seu crescimento económico, o que é um sinal vermelho para as perspetivas de desenvolvimento nos próximos anos", subindo para 1,1 biliões de dólares (mais de um bilião de euros) mais do dobro do nível de 2012.
Desde esse ano até 2022, os países mais pobres acumularam mais 134% de dívida pública, ultrapassando os 53% de crescimento nacional bruto, conclui o Banco Mundial no relatório.
Leia Também: Banco Mundial prevê contração de 3,7% na economia palestiniana