O cancro gástrico continua a ser uma das principais causas de mortalidade a nível mundial. Representa o sexto cancro mais frequente na raça humana com uma incidência global de 11.1%, por 100 mil habitantes. Tem uma distribuição geográfica maioritariamente presente na Ásia e Europa Oriental (Japão e Coreia) e América do Sul (Venezuela e Chile), com menor incidência na América do Norte e alguns países Africanos.
É mais frequente nos homens e está relacionado com estilo de vida, uma vez que a incidência desta doença nas populações que migram dos países mais afetados para os menos afetados, diminui ao fim da segunda e terceira geração.
Nas últimas décadas tem se constatado uma diminuição drástica no número de casos, que se pensa ficar a dever ao diagnóstico precoce, tratamento, e compreensão dos fatores que concorrem para o seu aparecimento. No entanto, o envelhecimento da população em países mais desenvolvidos assim como o aumento de casos em populações mais jovens (ainda difícil de explicar) fizeram estabilizar nos últimos anos o número total de casos.
Que tipo de cancro é este?
Classicamente e de uma maneira simplificada existem dois tipos de cancro gástrico quando falamos duma classificação histológica (células gástricas de onde se originam) que são:
Tipo Intestinal - mais frequente em homens e numa população mais idosa e menos agressivo;
Tipo difuso ou infiltrativo - Igualmente frequente em homens e mulheres, mais jovens e, também, mais agressivo e de pior prognóstico.
Quais os factores de risco para contrair a doença?
-Haver uma história familiar de cancro gástrico;
-A existência nas paredes do estômago da Bactéria Helicobacter Pylori;
-Dietas ricas em sal, fritos ,carnes processadas, fumados, enchidos, alimentos curados (ricos num composto químico chamado nitrosamina. Pensa se que a refrigeração dos alimentos que praticamente eliminou outros tipos de preservação destes, diminuiu drasticamente a doença;
-Álcool;
-Tabaco;
-Obesidade;
-Sedentarismo;
-Status socioeconómico;
-Cirurgias gástricas anteriores por outras causas.
E quais os fatores de proteção?
-Dietas ricas em fruta , vegetais, antioxidantes, vitamina C;
-Hormonas femininas (causa de ser menos frequente na mulher);
-Exercício Físico.
Como podemos estar alerta?
É fundamental diagnosticar a doença precocemente e passar a informação que todos podemos contribuir para isso.
Para além de evitar, tipos de dieta e estilos de vida de risco é igualmente importante estarmos atentos a sinais da doença dos quais os principais são a dor e o emagrecimento inexplicável. Recorrer regularmente ao médico assistente e principalmente se notarmos algum destes sintomas. No contexto atual, pandemia Covid-19, temos vindo a verificar um progressivo atraso no diagnóstico precoce de todos os cancros e este não é exceção. É necessário estar alerta para os sintomas e não atrasar a execução dos exames necessários. Saiba que nas unidades de saúde têm sido tomadas e reforçadas medidas de segurança na execução dos exames e no tratamento desta doença durante estes tempos difíceis para todos.
Joaquim Costa© DR
O exame que habitualmente faz o diagnóstico da doença é a endoscopia digestiva Alta com biópsia (procedimento que para além da evidência pela imagem recolhe tecido do estômago), e que posteriormente poderá ser complementado por análises e exames de imagem (TAC, ressonância magnética Nuclear).
É exatamente nesta área que existe alguma dúvida e controvérsia... só devemos fazer a endoscopia quando temos queixas? Ou como já é habitual ou deveria ser, no exame do intestino grosso, (colonoscopia), a partir de uma certa idade? ou quando pertencemos a um dos já mencionados grupos de risco?
Em países como o Japão ou Coreia do Sul, onde por a incidência desta doença ser muito elevada aconselha-se a execução de endoscopias digestivas altas de três em três anos a partir dos cinquenta anos(Japão), ou de dois em dois anos dos 40 aos 75 anos (Coreia do Sul).
No nosso País não existe nenhuma recomendação nesse sentido. Neste momento a discussão centrada no aconselhamento da população à imagem do que se faz para o intestino grosso em que sugere uma colonoscopia aos 50 anos, fazer simultaneamente a endoscopia digestiva alta.
Nós médicos constatamos cada vez mais que são os próprios doentes a sugerir a associação destes dois exames uma vez que habitualmente são feitos sob sedação/anestesia e por isso mais facilmente toleráveis.
O que motiva o sucesso do tratamento?
Na verdade o diagnóstico precoce é muito importante para o sucesso do tratamento e isso a maior parte das vezes só se consegue com programas de rastreio - o que não é o caso no nosso país. Daí ser tão importante
A abordagem da doença, por equipas médicas multidisciplinares (oncologistas. radioterapistas, cirurgiões, gastroenterologistas) aumentou em muito o sucesso do tratamento. Tratamento este que também tem tido grandes progressos, o que tem permitido diminuir drasticamente a mortalidade, aumentado a sobrevida e melhorando o prognóstico da doença.
A possibilidade de tratar através de endoscopia (ressecção endoscópica) a doença em fases muito precoces é uma realidade dos nossos dias. Também o recurso a tratamentos como a quimioterapia e a radioterapia, antes ou depois da cirurgia, quando esta é indicada, tem melhorado muito a sobrevida e a qualidade de vida dos doentes a longo prazo. A própria cirurgia passou a ser feita em alguns centros, por acesso mini-invasivo laparoscópico (cirurgia dos furinhos) ou robótico, o que permite uma recuperação muito mais rápida e retomar a atividade mais cedo. Outras abordagens terapêuticas da doença como, anticorpos, vacinas, e outros já deram e continuam a dar resultados muito promissores.
Tal como acontece na maioria dos tipos de cancro também o cancro gástrico continuará a ser alvo de maior investigação, tanto ao nível da sua prevenção como de tratamentos cada vez mais personalizados e menos invasivos.