Incontinência. Esta condição de saúde é vulgarmente associada à população mais idosa e a grande maioria relacioná-la-á com perdas urinárias. Não está totalmente errado, mas também não está totalmente certo. Além da urinária, existe, por exemplo, a incontinência fecal - que consiste na perda involuntária de gases e fezes - e não, não afeta só pessoas mais velhas, podendo acometer outras faixas etárias e ganhando, nesses casos, contornos ainda mais estigmatizantes. Vejamos.
São mais de 400 milhões as pessoas que, em todo o mundo, são afetadas por algum tipo de incontinência. Só em Portugal, estima-se que a incontinência urinária afete cerca de 600 mil portugueses e que entre 5 e 18% da população sofra de algum tipo de incontinência fecal. Saliente-se ainda que existe uma tendência para que este número aumente com o envelhecimento da população.
Ao mesmo tempo, o sexo feminino é o mais afetado por incontinência urinária, sobretudo entre os 45 e 65 anos, sendo que a proporção de casos desta condição é de três mulheres para cada homem.
Para lá da incontinência urinária e da incontinência fecal, existem ainda outras patologias associadas à disfunção pélvica como: prolapso útero-vaginal; dor pélvica crónica; disfunção miccional; alterações da função defecatória; prolapso retal; alterações da função sexual e obstipação. Este último problema é também muito frequente em Portugal, atingindo pelo menos 80% da população em algum momento das suas vidas.
Embora seja mais comum do que se possa pensar, a incontinência tem tratamento, pelo que é essencial procurar ajuda. Quer a incontinência urinária quer a incontinência fecal podem ser vividas como verdadeiramente devastadoras por parte de quem delas sofre, levando, nomeadamente, ao isolamento social e tendo um impacto muito pernicioso na qualidade de vida dos pacientes, pelo que importa combater o estigma por via da informação e da procura de ajuda especializada.
O projeto 'Toilet Talks', apoiado pela Medtronic e pela Associação Portuguesa para a Disfunção Pélvica e Incontinência (APDPI), pretende, justamente, promover a literacia nestes temas tantas vezes tabu, dando voz, com alguma descontração, a pacientes e médicos da área e desmistificando assim algumas ideias assentes no desconhecimento.
O atleta Carlos Leitão, que sofre de incontinência urinária desde que foi vítima de um acidente, é um dos participantes, podendo assistir abaixo ao seu testemunho.
Abordemos, agora, mais a fundo cada uma das patologias.
O que é a incontinência urinária?
A incontinência urinária resulta da incapacidade em armazenar e controlar a saída da urina, sendo caracterizada por perdas urinárias involuntárias, que podem ser muito ocasionais e ligeiras, ou perdas mais regulares e graves.
Há vários tipos de incontinência urinária: incontinência urinária de esforço, incontinência urinária de urgência, incontinência urinária mista, incontinência urinária de refluxo e incontinência urinária funcional.
No caso das mulheres, a incontinência urinária está relacionada com músculos do pavimento pélvico mais débeis e pouco flexíveis - o pós-parto, a título de exemplo, pode originar esta situação -, levando a que atividades banais possam resultar em perda de urina. Muitas vezes, um espirro pode ser quanto baste.
No caso dos homens, a incontinência urinária manifesta-se, por norma, através de gotejamento contínuo, sendo a causa mais frequente o aumento do tamanho da próstata.
No fundo, todos temos uma elevada probabilidade de vir a sofrer de incontinência urinária. As boas notícias são que a maioria dos tratamentos é pouco invasiva e a taxa de cura fixa-se na ordem dos 90%.
Também no âmbito do 'Toilet Talks', o urologista Ricardo Pereira e Silva fala sobre esta condição.
O que é a incontinência fecal?
A incontinência fecal - também designada de incontinência anal - é uma situação clínica, de causas multifatoriais, caracterizada pela incapacidade de controlar a emissão de gases ou de fezes, sólidas ou líquidas.
Existem três classificações para a incontinência fecal: incontinência passiva, incontinência de urgência e incontinência mista.
Traumas obstétricos e cirúrgicos podem estar na origem desta condição, mas há outros fatores de risco como a idade, doenças inflamatórias intestinais, doenças do foro neurológico e psiquiátrico, doenças metabólicas, ou efeitos secundários de alguns medicamentos.
Joana Oliveira, fundadora da Associação Portuguesa para a Disfunção Pélvica e Incontinência (APDPI), confrontou-se com o diagnóstico de incontinência fecal após o parto da terceira filha e relata, no vídeo abaixo, o seu caso. Neste episódio do 'Toilet Talks' participa ainda a Técnica Superior de Diagnóstico e Terapêutica em Neurofisiologia Ana Lopes.
Na maioria dos casos, a incontinência fecal pode ser corrigida ou pelo menos muito melhorada. Além da abordagem farmacológica ou cirúrgica - que será sempre a última linha de tratamento -, a neuromodulação sagrada é, nos dias que correm, o procedimento de eleição, sendo uma técnica pouco invasiva e aquela que apresenta melhores resultados. É fundamental, pois, que quem sofra desta condição consulte um especialista nas áreas de gastrenterologia e de cirurgia geral para avaliar os sintomas e determinar a melhor solução de tratamento para o seu caso em concreto.
A fisioterapia do pavimento pélvico é outra abordagem possível, podendo contribuir para a melhoria de problemas relacionados com o pavimento pélvico e ajudando também a controlar sintomas tanto nas situações de incontinência urinária, como nas de incontinência fecal.
A cirurgiã geral Ana Povo elucida melhor em que consiste a incontinência fecal e as diferentes linhas de tratamento, em mais um vídeo inserido no projeto 'Toilet Talks'.
O que é a obstipação?
Sobejamente conhecida por "prisão de ventre", a obstipação pode ser definida por uma dificuldade persistente em evacuar ou por evacuações que requerem um grande esforço e que acontecem menos de uma a duas vezes por semana. As fezes tornam-se mais secas, duras, fragmentadas e difíceis de expelir, provocando vários sintomas generalizados de mal-estar e desconforto.
A obstipação pode ser ocasional ou crónica. Ambos os casos devem ser alvo de avaliação por parte de um profissional de saúde, com o intuito de perceber se existe alguma complicação médica subjacente.
Independentemente da patologia relacionada com disfunção pélvica, procurar auxílio médico, reforçamos, é caminho de sentido obrigatório. Para lá de só assim ser possível encetar esforços para tratar o problema, desbrava também terreno para dizer adeus ao estigma de vez!
Pode saber mais sobre estas condições de saúde e acompanhar o trabalho desenvolvido pela Associação Portuguesa para a Disfunção Pélvica e Incontinência (APDPI) nas redes sociais, mais precisamente no Facebook, no Instagram e no YouTube.