"Eu acredito que é possível um entendimento amplo em São Tomé e Príncipe", afirmou António José Cassandra, em entrevista à Lusa, em Lisboa, durante a qual sustentou também que o Presidente da República são-tomense, Evaristo Carvalho, deveria ter um papel "um pouco mais interventivo".
Questionado sobre a viabilidade deste entendimento entre os partidos, após a crispação que marcou a campanha para as eleições legislativas de 07 de outubro e, sobretudo, o período pós-eleitoral, o governante reiterou que há essa possibilidade.
"Eu acho que sim, se as pessoas estiverem de espírito aberto para olharem para o país e a necessidade dessa ampla convergência, porque os desafios nos próximos tempos são muito duros", disse o presidente do Governo Regional do Príncipe, apontando a necessidade de realizar reformas num "país sem dinheiro e sob a orientação do Fundo Monetário Internacional".
Segundo os resultados oficiais das legislativas, proclamados pelo Tribunal Constitucional são-tomense na sexta-feira passada, a ADI (Ação Democrática Independente, liderada por Patrice Trovoada, no poder) ganhou as eleições com 25 deputados, enquanto o MLSTP-PSD (Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe - Partido Social Democrata) conquistou 23 mandatos, a coligação PCD-UDD-MDFM elegeu cinco deputados e o Movimento de Cidadãos Independentes conseguiu dois lugares.
Num cenário de coligação pós-eleitoral - ainda não confirmada -, ADI e independentes, eleitos pelo distrito de Caué, ficariam com 27 dos 55 lugares na Assembleia Nacional, enquanto a oposição consegue, junta, maioria absoluta, com 28 mandatos.
'Tozé' Cassandra, como é conhecido, alertou que o país pode "facilmente entrar em convulsões, porque com a diferença de um deputado, 27-28, é muito complicado para um governo garantir a sua sustentabilidade durante quatro anos".
O líder do Governo Regional afasta a ideia de um executivo de unidade nacional -- uma hipótese admitida, na semana passada, pelo atual primeiro-ministro -, defendendo antes "coligações fortes que suportem a governação".
Cassandra reconheceu que, após quatro anos de governação da ADI, com maioria absoluta, "é muito grande a crispação", apontando que a reforma da Justiça causou "muita mágoa".
"Há fortes desconfianças hoje na sociedade pela forma como foram constituídos os tribunais [Supremo e Constitucional]. Era necessária uma maioria forte para garantir essas reformas", comentou.
Depois de Patrice Trovoada ter admitido, em entrevista à Lusa, afastar-se do poder para viabilizar um governo, António José Cassandra garantiu não estar disponível para assumir a liderança de um futuro executivo em São Tomé e Príncipe.
"Por uma simples razão: é que nós avançámos com propostas muito fortes para o próximo mandato no Príncipe e a população do Príncipe não veria com bons olhos, agora, depois das eleições, do resultado que me deram, a confiança que depositaram em mim, eu largar tudo, partir para um outro projeto, sem dar satisfação à população. Eu, pessoalmente, não ficava de bem com a minha consciência se avançasse para outro projeto", disse Cassandra, que foi reeleito, com maioria reforçada, para um quarto mandato na ilha do Príncipe, nas eleições regionais realizadas também no dia 07 deste mês.
Cassandra adiantou que não teve, até agora, qualquer contacto com dirigentes da ADI, quer o presidente, Patrice Trovoada, quer o secretário-geral, Levy Nazaré, que, por estes dias, também têm passado por Portugal.
Sobre o papel do chefe de Estado, Evaristo Carvalho, perante a atual situação pós-eleitoral, Cassandra comentou: "Este é um outro problema que temos. O Presidente da República, para esta transição, devia ser um pouco mais interventivo e, sobretudo, mais dialogante".
Para este responsável, o chefe de Estado deveria ter "uma posição mais ativa, chamar as partes todas e participar nisto como um alto magistrado, um grande conselheiro".
"Não basta estarmos apenas por razões conjunturais, chamarmos uns e tentarmos acalmar as coisas. A coisa é bem mais profunda. Devíamos olhar para um São Tomé e Príncipe em que todos olhemos para a Constituição e possamos respeitá-la", defendeu António José Cassandra.