A divisão no canal de notícias conservador está a aprofundar-se cada vez que Trump repete as alegações de fraude eleitoral.
"Não vimos nada que constitua fraude ou abuso do sistema", disse o correspondente da Casa Branca para a Fox News, John Roberts, em direto, da mesma sala de imprensa em que o Presidente falara segundos antes.
Nos estúdios, em Nova Iorque, os apresentadores repetiam continuamente. "Não vimos nenhuma prova".
Horas depois, em programas de opinião noturnos, a apresentadora da Fox News, Laura Ingraham, deu uma volta de 180 graus e questionou num editorial o facto do voto pelo correio ser contado, afirmando que "a América deve encontrar o vencedor na noite das eleições ou na manhã seguinte".
A mesma estação, o canal pago de notícias mais assistido, foi palco de grande tensão na noite da eleição de terça-feira, depois de declarar o rival de Trump, o democrata Joe Biden, vencedor do Arizona, antes que outros 'media' o fizessem.
A diferença de critérios na programação da Fox News reflete a tensão editorial que existe entre os jornalistas de uma empresa que vive um dilema: decidir entre continuar a apoiar a deriva do discurso de Trump ou a verificação das suas denúncias contra o sistema eleitoral.
Enquanto isso, as três principais estações de sinal aberto - NBC, ABC e CBS - cortaram e desmentiram veementemente o discurso de Trump em pleno direto.
"Temos de interromper Trump porque o Presidente fez uma série de afirmações falsas", disse o jornalista Lester Holt, apresentador do NBC Nightly News, um dos três programas de notícias mais seguidos na televisão em sinal aberto.
O mesmo foi feito por David Muir, apresentador do noticiário mais seguido no país, com oito milhões de telespetadores diários, o ABC World News Tonight.
"Simplesmente não houve prova, em nenhum desses estados, de que haja votos ilegais", disse.
Em seguida, o jornalista explicou que, devido à pandemia do coronavírus, a votação por correspondência aumentou, quebrando recordes: mais de 100 milhões de norte-americanos votaram antes, o que prolongou o escrutínio.
A CBS, a terceira em audiências, iniciou um apuramento de factos quando Trump terminou o discurso e desmentiu todas as acusações de "fraude" e "corrupção do sistema".
Mais contundentes foram os serviços de informação da rádio pública norte-americana, NPR: "Trump, mais uma vez, reivindicou falsamente a vitória nas eleições de 2020. Ele não ganhou. Os votos ainda estão a ser contados", afirmou.
Por sua vez, os canais pagos de notícias CNN e MSNBC, conhecidos por posições mais liberais, comentaram duramente: "Que noite triste para os Estados Unidos".
Trump "está a tentar atacar a democracia com uma série de falsidades. Mentira após mentira após mentira", lamentou o apresentador Jake Tapper.
No programa da CNN, Rick Santorum, um comentador do partido de Trump e ex-senador, declarou-se "impressionado e dececionado" depois de ouvir o Presidente.
Praticamente nenhum grande meio de comunicação corroborou as acusações de fraude eleitoral feitas pela campanha de Trump.
"Trump disse sem provas que a eleição foi corrupta e fraudulenta", publicou Nicole Carroll, editora do USA Today, um dos jornais generalistas mais lidos nos Estados Unidos.
O Washington Post, o New York Times e o Los Angeles Times também desmentiram o Presidente.
Da mesma forma, a Justiça da Geórgia e do Michigan negou provimento aos primeiros processos movidos por Trump, que depende do apoio mediático da Fox News, que se vai diluindo, e de plataformas "alternativas" que surgiram nas redes sociais.