Angela Merkel "foi uma grande chanceler. Vai ser muito difícil substituí-la, não há ninguém que se aproxime. Dos candidatos à corrida, não votaria em nenhum", disse à Lusa a enfermeira Sónia Sequeira, a trabalhar na cidade alemã de Cuxhaven, comentando as próximas eleições legislativas de 26 de setembro.
O analista político português, Gonçalo Gomes, concorda com Sónia Sequeira. A viver em Berlim, considera que o sucessor terá "o difícil fardo de substituir alguém que é considerado quase insubstituível" na história recente do país.
"Não existem pessoas consensuais, mas a Angela Merkel é o mais consensual que pode haver em política. Foi a primeira mulher, primeira cientista e a mais nova chanceler da Alemanha, mas nunca fez disso bandeira. Aliás, é interessante pensar que alguém que nunca se esforçou para ser popular, acaba por atingir este nível de admiração, não só na Alemanha, mas a nível europeu e mundial", salientou Gonçalo Gomes, em declarações à Lusa.
"O começo foi atribulado, com uma fraca prestação em termos de resultados eleitorais e uma coligação que não inspirava confiança a muita gente relativamente à sua durabilidade. Mas a verdade é que Merkel se tornou a pessoa que a esquerda, pelo seu humanismo, e a direita, pela sua honestidade e rigor, passaram a admirar", continuou.
A "baixa expectativa" que caiu sobre Merkel quando começou a governar, não valerá para o seu sucessor ou sucessora, considera o analista político português, apontando os três principais candidatos à corrida, Annalena Baerbock, dos Verdes, Armin Laschet, da União democrata-cristã (CDU), e Olaf Scholz do Partido Social-democrata alemão (SPD).
"O próximo chanceler terá grandes desafios, a começar por uma Alemanha pós-corona que terá que voltar à normalidade e uma economia que precisa de um plano ambicioso, para além do potencial crescimento da extrema-direita, que se manteve moderado durante a governação de Merkel", revelou.
Gonçalo Gomes salienta "três momentos chave" nos 16 anos de governação Merkel: a crise financeira que colocou em causa o Euro, a abertura aos refugiados e o processo do 'Brexit', em que a Alemanha assumiu a liderança do bloco europeu.
Pela resposta a esses momentos de tensão, os alemães alcunharam Merkel de "Mutti" (mamã): "As mães não se esquecem e Merkel nunca será esquecida pelos alemães".
No último ano, a ação do governo tem sido penalizada pela estratégia de combate à Covid-19, admite Sónia Sequeira, que exerce enfermagem há 27 anos no país.
"O governo falhou em certas coisas. Não culpo a senhora Merkel individualmente, bem pelo contrário, acho que ela queria ter feito mais e acabou por ser travada pelos ministros-presidentes dos estados federados, mas funcionou", partilhou com a agência Lusa a enfermeira portuguesa.
A burocracia "atrapalha muitas vezes", e a vacinação tem sido turbulenta, disse admitindo que "em Portugal as coisas funcionaram melhor que aqui".
Por outro lado, a falta de pessoal de saúde não é um problema de agora, explica Sónia Sequeira, mas tem vindo a agravar-se nos últimos meses.
"Temos tido mais trabalho, eu e os enfermeiros e enfermeiras de outros serviços, porque tivemos de fechar alguns para dedicá-los exclusivamente à covid-19", recordou, embora separando a atual chanceler desses problemas de gestão quotidiana.
"Acho que a 'Frau' Merkel não será lembrada pelas suas políticas na área da saúde. Por outros assuntos sim", resumiu.
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