A dar o tom na cerimónia de abertura, o primeiro-ministro britânico avisou os seus pares que foram a Glasgow para a 26.ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas que lhes espera a "raiva e impaciência" do mundo se falharem as metas centrais do encontro: mais ambição na redução de emissões poluentes e prazos concretos para a neutralidade carbónica.
As alterações climáticas, ilustrou, são uma "máquina do apocalipse", uma bomba-relógio prestes a detonar que exige que os líderes mundiais chamem o seu James Bond interior para desarmar.
Caso contrário, "todas as promessas terão sido apenas 'blá blá blá' e a raiva e a impaciência do mundo serão impossíveis de conter", alertou.
O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, apelou aos líderes mundiais para salvarem a humanidade das alterações climáticas, alertando que se está "a cavar a nossa própria sepultura" e que é tempo de dizer "basta".
"É hora de dizer basta. Basta de brutalizar a biodiversidade, basta de matarmo-nos a nós mesmos com carbono, basta de tratar a natureza como uma latrina (...) e de cavar a nossa própria sepultura", afirmou, pedindo o fim do "vício em combustíveis fósseis" e alertando que, "embora as promessas recentes sejam reais e verosímeis e haja sérias dúvidas sobre algumas delas, ainda estamos a caminho de uma catástrofe".
Um dos líderes cujo discurso era aguardado com mais expectativa, o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, anunciou que o seu país, o terceiro maior poluidor mundial, será carbonicamente neutro em 2070, dez anos a seguir à China e vinte anos depois dos Estados Unidos e da União Europeia.
Numa declaração escrita enviada à cimeira, o Presidente do país do mundo que mais polui mundial, Xi Jinping, centrou-se na defesa do "multilateralismo" como "a receita certa" para enfrentar as alterações climáticas".
Sem anunciar nenhuma alteração substancial às metas que a China - o maior poluidor mundial - já estabeleceu, Xi Jinping afirmou que é dos países mais desenvolvidos a responsabilidade de fazerem eles próprios mais e ajudarem os países em desenvolvimento a fazerem melhor.
Também na cerimónia de abertura, a primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley falou em nome dos países mais vulneráveis, em que se incluem as nações insulares do Pacífico, para sublinhar que deixar o clima global aumentar mais de 1,5 graus até fim do século seria "condená-los à morte".
O primeiro-ministro de uma dessas nações, o fijiano Josaia Vorege Bainirama, considerou que a meta dos 1,5 graus está refém de uma "coligação de viciados em carbono que preferem lutar pelo carvão do que um futuro de bons empregos e indústrias inovadoras criadas pela ambição climática".
"'Carvão limpo', 'gás natural responsável' e 'petróleo com ética' são criações da mente destes egoístas", criticou Bainirama, acusando ainda outros líderes que "praticam uma política de apaziguamento e ficam indolentes enquanto os seus pares mais poluentes destroem o futuro".
O Presidente do Quénia, Uhuru Kenyatta, lamentou que os países africanos estejam em risco de não verem as suas circunstâncias especiais discutidas, salientando que "por toda a África, vulnerável ao impacto das alterações climáticas, os países já estão a sofrer danos de uma dimensão crescente e com maior frequência", afirmou.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, prometeu mais 4,3 mil milhões de euros de financiamento a países vulneráveis além dos 23 mil milhões de euros mobilizados em 2020 para medidas de adaptação, apontando que "a 'Equipa Europa' já é o maior fornecedor de financiamento climático".
Em nome de França, o Presidente Emmanuel Macron pediu mais ambição aos países "maiores emissores" de dióxido de carbono, numa alusão à Rússia e à China, cujos líderes estão ausentes em Glasgow.
Na sua intervenção, o Presidente francês pediu igualmente que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE) verifique que as transferências dos países mais industrializados para mitigar as alterações climáticas nos países em desenvolvimento cheguem realmente ao seu destino.
Também em nome da transparência, António Guterres já tinha, na sessão de abertura, afirmado que há um "défice de credibilidade e um superávite de confusão sobre redução de emissões, com metas e métricas diferentes".
"Por isso, além dos mecanismos estabelecidos no Acordo de Paris, hoje anúncio que irei constituir um grupo de especialistas para propor padrões claros para medir e analisar os compromissos de emissão zero de atores não estatais", anunciou o secretário-geral da ONU.
O Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, prometeu, por seu lado, uma "liderança pelo exemplo" no esforço da redução das emissões com efeito de estufa e introdução de energias renováveis, enfatizando o potencial para o crescimento económico e prometendo "investimentos históricos em energia limpa".
"Queremos demonstrar que EUA não estão apenas de volta à mesa [de negociações], mas vão liderar com o poder do exemplo", numa referência ao regresso ao Acordo de Paris, do qual o seu antecessor, Donald Trump, se tinha afastado.
O chefe do Governo espanhol, Pedro Sánchez, anunciou um aumento da contribuição de Espanha de 50% a partir de 2025 para o Fundo Verde para o Clima, correspondendo a 1.350 milhões de euros anuais.
A chanceler alemã, Angela Merkel, defendeu que fixar um preço para as emissões de dióxido de carbono é a melhor maneira de garantir que as indústrias e atividades económicas se empenham em atingir a neutralidade carbónica.
O primeiro-ministro australiano, Scott Morrison, falou na aposta na tecnologia para combater as alterações climáticas, desafiando a pressão para desinvestir nos combustíveis fósseis que alimentam a economia do país.
O naturalista britânico David Attenborough, que já completou 95 anos, falou como Advogado das Pessoas à COP26 e destoou do fatalismo, declarando que "a motivação não deve ser medo, mas esperança" para criar um mundo mais ecológico.
"Se somos suficientemente fortes para desestabilizar o nosso planeta, também somos suficientemente poderosos para o salvar se trabalharmos juntos", afirmou na sessão de abertura esta manhã.
O primeiro-ministro português, António Costa, esteve ausente desta cimeira, apesar de ter chegado a constar da sua agenda, num momento em que Portugal enfrenta uma crise política desencadeada pelo chumbo do Orçamento do Estado na Assembleia da República na semana passada.
Mais de 120 líderes políticos e milhares de especialistas, ativistas e decisores públicos reúnem-se até 12 de novembro, em Glasgow, na Escócia, na 26.ª Conferência das Nações Unidas (ONU) sobre alterações climáticas (COP26) para atualizar os contributos dos países para a redução das emissões de gases com efeito de estufa até 2030.
A COP26 decorre seis anos após o Acordo de Paris, que estabeleceu como meta limitar o aumento da temperatura média global do planeta entre 1,5 e 2 graus celsius acima dos valores da época pré-industrial.
Apesar dos compromissos assumidos, as concentrações de gases com efeito de estufa atingiram níveis recorde em 2020, mesmo com a desaceleração económica provocada pela pandemia de covid-19, segundo a ONU, que estima que, ao atual ritmo de emissões, as temperaturas serão no final do século superiores em 2,7 ºC.
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