"Embora no plano de direito definimos fronteiras, no plano prático o oceano é o oceano, os mares não têm fronteiras e o que acontece no mar vizinho, par alá das nossas fronteiras, automaticamente e impacta no nosso lado e vice-versa", disse à Lusa o Presidente da República, José Ramos-Horta.
"Não havendo pelo menos acordos regionais e cooperação regional para proteção da riqueza marítima, da pesca por exemplo, Timor-Leste pode seguir uma política rigorosa de proteção, mas é afetado por centenas de barcos que pescam ilegal e impunemente nas nossas zonas", sublinhou.
José Ramos-Horta falava à Lusa no Aeroporto de Díli onde hoje se foi despedir de Xanana Gusmão, o ex-Presidente timorense, que vai representar o país na Cimeira dos Oceanos em Lisboa.
O chefe de Estado vincou a necessidade de que se adotem políticas concretas a nível internacional para assim garantir uma maior proteção dos recursos marítimos de Timor-Leste e outros pequenos Estados em desenvolvimento.
"Se se esgotam os recursos de pesca no mar do sul da china, no mar à volta dos países vizinhos, deixará de haver também muitas espécies, migratórias, nos nossos mares. No nosso caso depende do estado dos corais e aqui as alterações climáticas também afetam esses corais", enfatizou.
O chefe de Estado recordou que Timor-Leste faz parte do Triangulo dos Corais e que "tem dos corais mais saudáveis desta região e do mundo", algo que considera se deve à geografia, com a ilha a beneficiar de uma corrente fria, mas também ao facto do país não ter indústrias poluentes.
Referindo-se a iniciativas com o triângulo entre Timor-Leste, o Território Norte da Austrália e a província indonésia de Nusa Tenggara Timur, Ramos-Horta admitiu sentir alguma "frustração" pelo facto de sucessivas reuniões não terem produzido resultados concretos.~
"Os acordos não podem ser entre o Território Norte, que nem sequer é um estado australiano, com a NTT que é uma província fraquinha e Timor-Leste que é um país pobre", afirmou.
"É preciso um plano regional envolvendo os três países a nível nacional, ainda que delegando depois nas regiões, para aspetos como a proteção contra pesca ilegal ou a destruição ambiental", afirmou.
Combater a poluição marítima, a nível nacional e regional e proibir práticas penosas para os oceanos, como pesca de dinamite e cianeto, são outras medidas que devem ser implementadas.
"A economia azul é obviamente vital, mas é preciso que haja, no mínimo, um plano sério regional", vincou.
Ramos-Horta deu o exemplo do impacto global de conflitos ou crises que "penalizam duas vezes" as pequenas ilhas ou estados frágeis e em desenvolvimento, e pediu que se avance, especialmente no contexto do atual conflito da Ucrânia, com o perdão da dívida.
"Somos vítimas várias vezes, das nossas crises e conflitos internos, e cada país e liderança tem que responder por isso, mas também de conflitos de outras partes do mundo, como a Ucrânia, que nos afetam dramaticamente", afirmou.
"Se os nossos países já são pobres, quando há conflitos dessa natureza, o impacto é grande. Em conflitos destes mobilizam-se logo milhares de milhões de dólares da UE, dos EUA, mas depois praticamente nada é feito em termos de perdão da dívida a países com problemas", vincou.
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