Após as violentas inundações que causaram na semana passada 11 mortes e dois desaparecidos na região de Marche, o primeiro-ministro cessante, Mario Draghi, veio alertar que a "fragilidade" do risco hidrogeológico que existe "há séculos" nalgumas zonas do país "tornou-se uma emergência com as mudanças climáticas".
À Lusa, Ilario Lombardo, jornalista político do jornal La Stampa, sublinhou que os partidos que colocam no topo da agenda as questões climáticas são o Movimento Cinco Estrelas e o Partido Democrático (PD), tendo este, no seio da coligação de centro-esquerda, unido forças com o Partido Verde ambientalista.
Segundo Lombardo, os partidos seguem "uma abordagem pragmática" ditada pela pandemia e pela guerra que os obrigou a "adiar questões que eram prioritárias". "A mudança climática é um tema que parece unir todos, mas não excitar ninguém", adiantou.
Gianfranco Pasquino, professor de Ciência Política da Universidade de Bolonha, referiu que o programa do centro-esquerda "abraçou totalmente o programa do governo de Draghi, que já destinou fundos para a transição ecológica".
Quanto a centro-direita, adiantou, "nunca foi ambientalista e nos seus programas vemos apenas indicações gerais".
A crise energética e aumento dos preços das matérias-primas está a levar Itália a procurar fontes alternativas ao gás russo. Todos os analistas ouvidos pela Lusa concordam que a guerra na Ucrânia tornou mais difícil o objetivo de abandonar o gás como principal fonte de energia no país.
"A Itália não tem autonomia energética, por isso hoje o debate tornou-se voltar a produzir gás internamente, perfurar, instalar regaseificadores e comprar gás de outros países que não seja a Rússia. É claro que mesmo o Movimento 5 estrelas, que nos últimos anos tem sido muito crítico de alguns projetos, como por exemplo o Gasoduto Tap [Trans-Adriático ligando Itália a países produtores da Ásia Central], nem hoje consegue dizer 'não ao gás imediatamente' porque sabe que é uma posição totalmente insensata", adiantou Lombardo.
O debate mais aceso em torno do clima e energia relegou para segundo plano a discussão sobre Giorgia Meloni, cujo partido Irmãos de Itália (FdI, na sigla em italiano) lidera destacadamente as intenções de voto, sobre as ligações daquela formação ao pósfascismo italiano, e ainda sobre suspeitas de financiamento russo ao seu parceiro de coligação, Matteo Salvini.
"É correto que os parceiros europeus perguntem o quanto Meloni se livrou do seu legado pósfascista, dado que o FdI nasceu de um pedaço da Aliança Nacional, que por sua vez nasceu de um pedaço do MSI que era um partido pósfascista. Dito isto, o FdI nasceu com uma componente liberal representada por Guido Crosetto [fundador do partido juntamente com Meloni] que de qualquer forma pouco tem a ver com a história do fascismo", disse Lombardo à Lusa.
No entanto, o que confunde quem tenta analisar esse partido é a "ambiguidade" do comportamento e das declarações de Giorgia Meloni e, "nas suas alianças, [Meloni] muitas vezes encontra-se com partidos que chamaríamos de pósfascistas", adiantou o jornalista.
"Por exemplo, sua escolha de subir ao palco do Vox, um partido espanhol pósfranquista, antiaborto e que limita os direitos das minorias, é uma forma de seduzir um eleitorado de direita que relembra ideias pósfascistas num tom nostálgico e de uma forma folclórica. Ao mesmo tempo - e esta é a sua verdadeira ambiguidade - [Meloni] tenta limpar a sua imagem sublinhando as suas posições euroatlânticas e europeístas", disse Lombardo.
Para os analistas ouvidos pela Lusa, apesar das ambiguidades de Meloni, caso ganhe as eleições esta não deverá estar sujeita no governo a influências de correntes fascistas.
"Para fins eleitorais, é compreensível que o Partido Democrata enfatize esse risco, mas eu o acho exagerado e talvez até contraproducente", disse Pasquino.
A campanha eleitoral italiana, em que a oposição às sanções europeias à Rússia divide a coligação de extrema-direita e o Partido Democrático (esquerda) e aliados, foi abalada nos últimos dias também por revelações de fontes anónimas dos serviços de informações norte-americanos, citadas pela imprensa, de que a Rússia desde 2014 aplicou 300 milhões de dólares no financiamento de políticos em mais de 20 países da Europa, África e Sul da Ásia "para tentar influenciar a política local".
Havendo antigas suspeitas sobre a Liga, o próprio primeiro-ministro cessante, Mario Draghi, disse na sexta-feira feira ter colocado a questão de haver ou não informações sobre italianos envolvidos ao secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, que terá dito num telefonema entre ambos que "a Itália não está nessa lista".
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