Na quarta-feira, a Guarda Costeira tunisina tinha avançado ter recuperado 10 corpos e resgatado 72 migrantes com vida depois do naufrágio de uma embarcação precária ao largo de Sfax, centro leste do país, que partira com um número ainda por determinar de imigrantes a bordo da Tunísia em direção à costa italiana no Mediterrâneo.
As autoridades indicaram hoje ter recuperado os corpos dos 14 migrantes, seis deles de mulheres e também o do "capitão" tunisino da embarcação.
Segundo as autoridades de segurança tunisinas, estarão ainda desaparecidos 10 a 15 migrantes.
A Tunísia, com alguns trechos da costa a menos de 150 quilómetros da ilha italiana de Lampedusa, regista com muita regularidade incursões de migrantes, principalmente de países da África subsaariana, que pretendem chegar à Europa, via Itália.
As tentativas intensificaram-se após um discurso violento proferido a 21 de fevereiro pelo Presidente da Tunísia, Kais Saied, em que criticou a imigração ilegal.
Saied afirmou que a presença na Tunísia de "hordas" de imigrantes ilegais da África subsaariana constitui uma fonte de "violência e de crime", salientando que tal faz parte de um "empreendimento criminoso" destinado a "mudar a composição demográfica" do país.
Após o discurso, grande parte dos 21.000 cidadãos da África subsaariana registados oficialmente na Tunísia, e uma grande quantidade de outros em situação irregular, perderam os empregos, geralmente informais, e a autorização de residência como resultado da campanha contra os imigrantes ilegais.
A maioria dos migrantes africanos chega à Tunísia e depois tenta imigrar ilegalmente por mar para a Europa.
O alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Türk, que lamentou as declarações de Saied, pediu hoje "esforços conjuntos para garantir um resgate imediato e tratamento digno, eficaz e completo para um local seguro" dos migrantes que tentam cruzar o Mediterrâneo.
Mas a onda de choque causada pelas declarações de Saied foi sobretudo sentida por centenas de requerentes de asilo e refugiados na Tunísia à espera de serem enviados para países terceiros.
Na terça-feira, dezenas de requerentes de asilo acampados em frente à sede do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) em Tunes foram dispersos pela polícia, que utilizou gás lacrimogéneo. As autoridades tunisinas alegam ter dispersado os migrantes a pedido do próprio ACNUR.
Após terem sido obrigados a abandonar o local, os requerentes de asilo engrossaram as fileiras de outro acampamento improvisado em frente aos escritórios da Organização Internacional para as Migrações (OIM), onde residem no meio de uma miséria absoluta.
Duas organizações não-governamentais (ONG), bem como o Fórum Tunisino de Direitos Económicos e Sociais (FTDES), exigiram hoje "um lugar seguro" para os migrantes.
"A prioridade é proteger essas pessoas, especialmente mulheres e crianças, que devem ser colocadas num local seguro," disse Zeineb Mrouki, da organização Advogados Sem Fronteiras (ASF), numa conferência de imprensa em Tunes.
A Tunísia é signatária da Convenção de Genebra (de 1951, sobre a proteção de refugiados), pelo que é obrigada a garantir os direitos fundamentais dos migrantes.
"Precisam com urgência de um local para se instalarem. E alguns deles têm muitos problemas de saúde que precisam de ser assistidos", disse Romdhane Ben Amor, do FTDES, exigindo às autoridades que permitam que organizações de ajuda e cidadãos apoiem os refugiados e migrantes.
Confirmando a prisão de um voluntário nos últimos dias, Ben Amor denunciou o facto de Tunes estar a recorrer a uma lei recentemente aprovada que "criminaliza qualquer forma de assistência a pessoas em situação irregular".
A 07 de abril, a Guarda Costeira da Tunísia anunciou ter resgatado ou intercetado nos primeiros três meses deste ano 14.406 pessoas, das quais 13.138 da África subsaariana, sendo as restantes tunisinas, números cinco vezes superiores ao registado no mesmo período de 2022.
A Tunísia integra a chamada rota do Mediterrâneo Central, uma das rotas migratórias mais mortais, que também sai da Líbia e da Argélia em direção à Europa, nomeadamente aos territórios italiano e maltês.
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