Os manifestantes estiveram no Congresso a bater panelas e na Plaza de Mayo, lugar onde a Associação de licenciados em Enfermagem realizou uma "marcha de tochas" para exigir o reconhecimento profissional e protestar contra um decreto anunciado por Javier Milei na quarta-feira.
O decreto de necessidade e urgência (DNU), com mais de 300 reformas, com as quais pretende, de uma só vez, lançar as bases para a reconstrução da economia argentina através da desregulamentação económica e da reversão do défice fiscal
Também decorreram manifestações na cidade de Viedma e em diferentes localidades da província de Jujuy, contra o DNU, que defendem tratar-se de "um golpe de Estado contra os interesses nacionais", segundo a agência de notícias argentina Télam.
Os protestos foram replicados nas cidades de Morón, San Miguel, de Mar de Ajo, Rosario, Mar del Plata, Bariloche, Ushuaia, Córdoba, Junín, Resistencia, entre outras.
Horas antes, Milei afirmou que o decreto de medidas de desregulamentação económica é "a favor do povo" e criticou os que saíram às ruas para protestar, alegando que sofrem da "síndrome de Estocolmo" em relação ao governo anterior, liderado pelo peronista Alberto Fernández.
Da ex-Presidente Cristina Fernández (2007-2015) a figuras do radicalismo, o plano de Milei, anunciado na quarta-feira, está a gerar forte rejeição, que vai além do descontentamento expresso nas ruas.
Esta circunstância coloca em cheque o desejo de Milei em implementar um plano de estabilização da economia da Argentina através da aprovação do DNU.
"Não devemos colocar argentinos contra argentinos", reagiu Cristina Fernández, que criticou Milei por colocar a ênfase na repressão de tumultos em vez de garantir os direitos dos argentinos.
"Quando a democracia celebra 40 anos de continuidade, o nosso país testemunha um evento de extrema gravidade institucional nunca antes visto. O poder executivo, num ato de claro abuso de poder, avançou sobre as competências exclusivas do poder legislativo", escreveu na rede social X o ex-presidente Alberto Fernández (2019-2023).
Milei deverá ter sérias dificuldades em conseguir que o plano passe pelo crivo do parlamento. O DNU, de 82 páginas e com 366 artigos, só pode ser aprovado ou rejeitado na totalidade.
"O Presidente deve substituir este DNU inválido por uma 'lei espelho' que possa ser votada em capítulos e convocar [sessões] extraordinárias para a tratar com urgência. Dessa forma, as reformas positivas, que terão consenso, poderão ser aprovadas e as que não forem, poderão ser evitadas", propôs o presidente da União Cívica Radical, um partido com ampla representação de legisladores e governadores.
Martin Lousteau sublinhou que "o respeito pela institucionalidade evita abusos que prejudicam a sociedade".
Na Propuesta Republicana (PRO), partido de centro-direita fundado pelo ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019) e com líderes a ocuparem cargos de destaque na administração de Milei, a discussão sobre o plano ainda não está definida.
"Neste momento frágil e ameaçador, temos de ter a consciência da urgência de tomar medidas corajosas. Se não o fizermos, expomo-nos ao risco de uma hiperinflação que pode ser devastadora para a vida de milhões de argentinos", alertou Macri.
No mundo sindical, porém, as vozes de rejeição fazem-se ouvir cada vez mais. As confederações sindicais consideram que as medidas reduzem os direitos trabalhistas e sociais.
A Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT), a principal central sindical do país, que se tinha abstido de participar nas manifestações de protesto até se conhecer o alcance do decreto, convocou uma marcha para 27 de dezembro, para exigir a revogação do plano.
A CGT vai interpor uma ação em tribunal para anular a DNU, rejeitando as medidas propostas, que têm um impacto direto na legislação laboral.
Por outro lado, as associações empresariais manifestaram forte apoio ao ajustamento fiscal e à desregulamentação propostos pelo governo. A Associação Empresarial Argentina (AEA), a União Industrial Argentina e a Câmara de Comércio Argentina aprovaram o decreto que visa transformar as empresas estatais em sociedades anónimas com vista à "posterior privatização", a fim de desregulamentar a economia argentina.
"O início do novo Governo gera a esperança de que o nosso país possa inverter um longo período caracterizado pela estagnação económica, taxas de inflação muito elevadas e um aumento muito significativo da pobreza", afirmou a AEA.
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