"Quem vimos muito nas consultas de apoio emocional foram os auxiliares que são aquelas pessoas a quem ninguém vai bater palmas à janela, ninguém fala na televisão", afirmou a também diretora do Departamento de Psiquiatria Hospital Fernando-Fonseca (Amadora-Sintra) no Fórum de Saúde Mental em Contexto Laboral: Desafios Atuais e Novas Respostas, que está a decorrer em Lisboa.
Fala-se mais dos médicos, dos enfermeiros, mas "os auxiliares são os que ganham menos, são mais vulneráveis e têm menos facilidade no contacto" com os especialistas.
"Nós criámos as consultas de apoio emocional, também criámos no Hospital Amadora-Sintra, mas há muitas pessoas que não precisam da linha telefónica, conhecem-nos e vêm ter connosco diretamente. É a vantagem de se trabalhar num hospital e nos conhecermos diretamente", contou.
Segundo a psiquiatra, "o medo de não estar à altura foi o que inquietou mais as pessoas", mas não as impediu de fazer o que era necessário.
"Os profissionais de saúde tiveram sintomas, mas não quer dizer que sejam doenças", disse, explicando que a maior parte teve momentos de insónia, ansiedade, um sentimento de impotência, de desespero, de ter medo de fazer o que não estava certo.
Por isso, defendeu ser muito importante demonstrar às pessoas que o que sentem são sintomas e não doenças.
"É óbvio que as pessoas adoecem. No entanto, sabemos que existe um maior risco de as pessoas desenvolverem quadros estruturados de depressão, ansiedade, 'burnout', stress pós-traumático e descompensação de quadros anteriores, que é o aspeto que tem surgido mais", salientou.
Daí ser importante saber quem são as pessoas mais vulneráveis, nas quais se incluem as pessoas que estão mais isoladas, com antecedentes psiquiátricos ou de consumo, pessoas excessivamente exigentes com elas próprias, chefias e quem apresente sintomas.
"Nós trabalhámos muito em termos preventivos, fizemos formação para chefias", ensinando-lhes estratégias para lidar com este desgaste e para divulgar junto dos profissionais.
Para Teresa Maia, "as pessoas assumiram o papel que têm, que é serem profissionais de saúde e fazerem aquilo que achavam que tinham que fazer, deu uma força enorme e um contributo brutal" nesta luta contra a pandemia.
"Não quer dizer que não haja pessoas que precisam de ajuda, e que nesta altura não estão a pedir, e é isso que não queremos que aconteça", mas a verdade é que "as pessoas demonstraram ter uma capacidade de adaptação e uma resiliência enorme" e o trabalhar em conjunto e saírem da sua zona de conforto "foi dos motores mais importantes para força que conseguiram ter".
Apontou como uma "situação muito difícil" as especialidades terem deixado de trabalhar, o que "implicou um sofrimento enorme: são as pessoas que agora estão a ver quadros que ninguém viu durante um monte de tempo".
Também presente no fórum, promovido pela associação AlertaMente, com o apoio do Programa Nacional de Saúde Mental, o diretor do Serviço de Medicina Intensiva do Hospital Garcia de Orta, em Almada, partilhou a sua experiência como médico e como doente covid-19.
Antero Fernandes contou que esteve 14 dias em casa, quase a necessitar de ser ventilado, e assistiu à morte da irmã no serviço que dirige, mas não baixou os braços, tal como os outros profissionais.
"Se nós traçássemos uma curva, percebíamos que estávamos mais fortes e com mais capacidade de enfrentar as adversidades", salientou.
O especialista contou que depois da fase crítica da doença a "vontade enorme" que teve foi voltar ao serviço e integrar a equipa da linha da frente, que tinha na altura cerca de 55 doentes internados e todos ventilados
"Podia ter entrado em 'burnout'. Tenho quase 60 anos e podia ter ficado em casa quatro ou cinco meses, mas não foi esta a minha posição, nem a posição de quem connosco trabalha", rematou.
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