'Sem justiça não há paz' e 'Em defesa da polícia'. Foram estes os lemas das duas manifestações que estiveram na mira dos portugueses este sábado à tarde, em Lisboa.
O movimento Vida Justa anunciou, na quinta-feira, que a sua manifestação iria ter início no Marquês de Pombal pelas 15h00 e estava prevista terminar na Assembleia da República. No entanto, o presidente do Chega, André Ventura decidiu anunciar uma contramanifestação cujo fim seria no mesmo local da 'Sem Justiça não há paz'.
De forma a evitar que os protestos coincidissem, a iniciativa Vida Justa, com objetivo reclamar justiça pela morte de Odair Moniz, o homem de 43 anos baleado por um agente da PSP após uma perseguição policial na Amadora, decidiu alterar o seu percurso e terminar na Praça dos Restauradores.
A hora do encontro chegou e, pelas 15h00, estavam concentradas na Praça do Município cerca de duas centenas de pessoas, com bandeiras do Chega, também algumas do partido ADN, e de Portugal, e cartazes onde se lia "Respeitem as nossas polícias" e "Polícias sim. Bandidos não!".
Por outro lado, na Avenida da Liberdade, milhares de pessoas entoavam gritos de protesto, onde a principal palavra de ordem era "Justiça para o Odair", e onde era segurada, por familiares e vizinhos, uma faixa com a fotografia do homem de 43 anos.
Dois protestos distintos
Em dois protestos com objetivos bastante distintos, André Ventura clamava por “polícias com mais meios” e por "mais autoridade da polícia", em declarações aos jornalistas. Enquanto que, na manifestação da Vida Justa, se empunhavam cartazes onde podia ler-se: "Que a voz da revolta seja a voz da justiça", "Abaixo a repressão policial, morte ao fascismo", "Sem justiça, não há paz" ou "Parem de nos matar".
A manifestação 'Sem justiça não há paz' contou com a presença de associações antirracistas, comissões de moradores de vários bairros da Área Metropolitana de Lisboa, nomeadamente no Bairro do Zambujal, na Amadora (onde residia a vítima), várias personalidades públicas e políticos que quiseram marcar a sua posição.
"Portugal não pode continuar a tratar os bairros da periferia de Lisboa como tem acontecido, onde falta tudo. Falta a presença do Estado social, falta a escola, falta o hospital", referiu o líder parlamentar do Bloco de Esquerda (BE), Fabian Figueiredo, que esteve presente na manifestação do movimento Vida Justa.
Também a socialista Ana Gomes não faltou ao encontro e acusou André Ventura de ter como objetivo "semear a divisão na sociedade portuguesa" com a contramanifestação 'em defesa da polícia', que acusa ainda de ter sido marcada com "intuito provocatório".
Em resposta ao outro protesto, o presidente do Chega dividiu o país em "dois lados", um que está com "a bandidagem", com "as minorias e os coitadinhos" e "sempre contra a polícia e contra a autoridade", após o trajeto de 45 minutos da manifestação de apoio às autoridades convocada pelo partido.
A contestar as palavras de André Ventura, esteve Cláudia Simões, cidadã que acusou um agente da PSP de a agredir, numa paragem de autocarro na Amadora, em 2020.
"Somos castigados e ainda saímos do tribunal como criminosos. Espero que este processo não passe em branco como o meu", podia ouvir-se, salientando que a polícia trata as pessoas de alguns bairros "como lixo".
A manifestação de apoio a Odair, onde estiveram algumas pessoas de cara tapada, terminou cerca das 18h00 com um minuto de silêncio.
A presença policial foi visível nas iniciativas e, em comunicado, a Polícia de Segurança Pública (PSP) afirmou que as manifestações decorreram de forma "pacífica" e agradeceu a "serenidade e civismo" a todos os cidadãos que nelas participaram.
Odair Moniz, de 43 anos e morador no Bairro do Zambujal, na Amadora, foi baleado por um agente da PSP na madrugada de segunda-feira, no Bairro Cova da Moura, no mesmo concelho, no distrito de Lisboa, e morreu pouco depois, no hospital.
A Inspeção-Geral da Administração Interna e a PSP abriram inquéritos, e o agente que baleou o homem foi constituído arguido.
Na sequência do acontecimento têm sido registadas, pela PSP, centenas de ocorrências. Na noite de segunda-feira registaram-se desacatos no Zambujal e, desde terça-feira, noutros bairros da Área Metropolitana de Lisboa, onde foram queimados autocarros, automóveis e caixotes do lixo.
Foram ainda detidas cerca de duas dezenas de cidadãos e identificado um número semelhante de pessoas. Somam-se sete feridos, um dos quais com gravidade.
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