No discurso do adeus do CDS, a ainda líder do partido começou por saudar a assembleia, reunida em Aveiro, recordando que há quatro anos propôs "um caminho focado na resolução concreta dos problemas quotidianos das pessoas e assente na matriz comum, a carta de princípios alicerçada na democracia-cristã" para o partido.
"Esperava-nos um ciclo de oposição, que uns vaticinavam curto, mas que na minha opinião duraria a legislatura completa, como se viria a verificar. Propus um caminho de oposição firme e construtivo com ambição e responsabilidade - A ambição de olhar para todo o país com prioridade para pessoas e territórios mais desfavorecidos, a responsabilidade de propor na oposição o que poderíamos fazer na governação", referiu.
Para a líder dos centristas, era a "isso que obrigava a consciência formada na experiência dura de quatro anos de governação em tempos de Troika". "Tinha para mim que era preciso construir um caminho próprio e que o nosso posicionamento era de oposição responsável e construtiva. De oposição intensa e permanente quer na substância, quer no estilo", acrescentou.
Agora a falar para o PSD, Cristas refere que o CDS se manteve "firme e com uma voz aguerrida", pois "era evidente que nenhum outro partido em Portugal estava interessado em fazer oposição a sério e inequivocamente contra o caminho para o socialismo".
"Dissemos com clareza que queríamos ser parte de uma alternativa de centro e de direita em Portugal e que trabalharíamos para contribuir o mais possível para a conquista dos 116 deputados necessários à governação", continuou, acrescentando: "Cumpri o caminho traçado e a estratégia proposta, mas cumpre-me hoje reconhecer uma evidência - falhei o resultado. Falhei porventura a análise das possibilidades que se abriam com as novas circunstâncias políticas e os resultados ficaram muito aquém das minhas e das vossas legitimas expectativas".
Em jeito de balanço e seguindo a linha até aqui, Cristas defendeu o seu legado à frente do CDS. "Não bastou termos sido uma oposição combativa, tantas vezes isolada, à má ação ou inação deste Governo, com a saúde à cabeça. Não bastou termo-nos batido contra a eutanásia ou as barrigas de aluguer. Não bastou um contacto permanente com as pessoas no terreno, e recordo apenas o caso dramático de Pedrógão. Não bastou termos propostas permanentes para promover a natalidade e ajudar as famílias ou para apoiar as empresas e dinamizar a economia", elencou.
Apontando agulhas aos críticos, a líder do CDS, refere que "uns dirão que a estratégia estava errada, outros que se cometeram erros tácticos ou de comunicação ou que falhámos na avaliação das circunstâncias", mas, reconhece, "este não é nem o momento nem o dia apropriado para dissecar os erros desse roteiro. O tempo encarregar-se-á dessa análise detalhada".
Aos amigos, Cristas resume o que quer dizer "numa única palavra: Obrigada", sendo de imediato aplaudida. Enumerando de seguida os vários agradecimentos "pelos últimos anos": "Obrigada pela confiança que depositaram em mim por duas vezes. Obrigada pelo esforço e pelo apoio que em tantos momentos tantos de vós me demonstraram. (...) Obrigada aos militantes que durante estes quatro anos deram o seu melhor para os resultados serem outros". Os agradecimentos estenderam-se ainda aos "dirigentes nacionais, distritais e concelhios, aos autarcas e funcionários" e ao grupo parlamentar, nomeando Nuno Magalhães e Cecília Meireles.
"O CDS tem um passado que muito nos honra e acredito que saberá construir um grande futuro. Se vos posso fazer um pedido é que o debate deste congresso seja profundo, sério, leal e a olhar para o futuro. Um debate assente nas ideias e nas pessoas, porque em política não há boas ideias sem boas pessoas para as defender. E o inverso também é verdade", apelou.
Recordando que "logo a seguir às eleições [legislativas]" foi questionada sobre se saía da liderança do partido "angustiada e desiludida com a política", recuperando a resposta que deu na altura, Cristas assume ter ficado "triste pelo resultado, mas tranquila". "Dei tudo o que podia por aquilo em que acredito. Do poder transformador da liberdade e da iniciativa privada à defesa comprometida da vida. Da necessidade de criar riqueza para melhor a distribuir à importância da participação das mulheres na vida pública. Da defesa comprometida de todo o país – do mundo rural ao mar – à abertura de Portugal ao mundo", disse.
Assumindo que não saiu desiludida, a centrista afirmou que isso se deveu a nunca ter tido "ilusões". "Sempre soube que em política nunca se pode esperar reconhecimento", acrescentando que sai da liderança "com a mesma liberdade" com que entrou para o partido.
"Continuo a ter confiança no nosso país e a acreditar que está nas mãos de todos, sem exceção, construir o nosso futuro coletivo - um futuro inclusivo e sustentável. Continuo a acreditar, como lembra o Papa, que cada um pode contribuir com a própria pedra para a construção da casa comum", rematou.
Após quatro anos à frente do partido e com um discurso de 13 minutos, Cristas abandonou logo de seguida o pavilhão, pouco antes de os congressistas começarem a discutir as moções de estratégia global.
O programa do congresso começou este sábado com o discurso de despedida de Assunção Cristas, a ex-ministra da Agricultura que sucedeu a Paulo Portas como presidente, em 2016, e que anunciou a sua saída na noite das legislativas de outubro de 2019, quando o CDS perdeu 13 deputados, e ficou reduzido a cinco, com 4,2% dos votos.
Eleita vereadora na Câmara Municipal de Lisboa nas autárquicas de 2017, numas eleições em que o partido ficou à frente do PSD, é aí que vai continuar, acumulando com a sua atividade de docente universitária.
Depois do almoço, será a apresentação e debate das moções de estratégia global. São 15 no total, as cinco dos candidatos a líder - João Almeida, Filipe Lobo d'Ávila, Abel Matos Santos, Carlos Meira e Francisco Rodrigues dos Santos - e mais dez, de dirigentes e militantes, entre elas uma do eurodeputado Nuno Melo e do parlamentar Telmo Correia, que não excluíram, até ao momento, vir a apresentar um candidato.
A votação, em urna, das moções está previsto começar às 23h00 de hoje, prolongando-se até 30 minutos após o fim do debate, o que a mesa do congresso prevê acontecer às 2h30 de domingo.
Um dos momentos decisivos do congresso é a votação das moções dado que é uma espécie de primeira volta para escolher o líder. E quem vencer, por norma, apresenta uma lista candidata à comissão política nacional e demais órgãos do partido. Este é um congresso eletivo onde o seu presidente será escolhido - o CDS já teve eleições diretas, como o PSD ou o PS, mas abandonou-as.
O 28.º congresso nacional do CDS termina no domingo com as eleições para os órgãos nacionais, a sessão de encerramento e o discurso do novo presidente, que ficará em funções por dois anos, até 2022.