"A situação financeira do município não permite que se utilize como pretexto o pagamento desta multa para recusar as necessárias respostas de que a cidade de Lisboa necessita, nomeadamente no plano social", lê-se numa nota hoje divulgada.
A nota foi divulgada depois de ter sido tornada pública a decisão da CNPD de multar a Câmara de Lisboa em 1,2 milhões de euros no processo relativo ao tratamento de dados pessoais de participantes em manifestações e a reação da autarquia a essa multa.
A atual liderança da Câmara de Lisboa disse que a multa "é uma herança pesada" e que condiciona medidas previstas no orçamento apresentado.
"Esta decisão é uma herança pesada que a anterior liderança da Câmara Municipal de Lisboa [sob a presidência do socialista Fernando Medina] deixa aos lisboetas e que coloca em causa opções e apoios sociais previstos no orçamento agora apresentado", lê-se na reação escrita enviada à Lusa pela autarquia, atualmente liderada pelo social-democrata Carlos Moedas.
No comunicado, os vereadores do PCP "registam a decisão" da CNPD, mas defendem que deve ser feita no futuro uma "análise mais detalhada dos fundamentos invocados para a multa agora aplicada".
"Os vereadores do PCP reafirmam que a transmissão, por parte da Câmara Municipal de Lisboa [CML], de dados pessoais de organizadores de manifestações, a entidades externas à CML, que não o Ministério da Administração Interna e a Polícia de Segurança Pública, constitui uma prática grave, que nunca deveria ter ocorrido e que não pode voltar a acontecer", lê-se na nota.
Os vereadores relembram também que é "necessário ainda apurar e identificar todas as situações de transmissão de dados ocorridas para além daquelas que constam do relatório preliminar então avançado".
A polémica em torno deste caso -- que originou uma série de protestos, desde a Amnistia Internacional aos partidos políticos - surgiu em junho do ano passado, quando foi tornado público que o município, então presidido pelo socialista Fernando Medina, fez chegar às autoridades russas os nomes, moradas e contactos de três ativistas russos que organizaram em janeiro um protesto pela libertação de Alexey Navalny, opositor do Governo russo.
Fernando Medina pediu "desculpas públicas" pela partilha desses dados, assumindo que foi "um erro lamentável que não podia ter acontecido".
Na apresentação de uma auditoria interna sobre o assunto, Fernando Medina reconheceu que a autarquia desrespeitou reiteradamente um despacho de 2013 assinado por António Costa, presidente do município à data e atual primeiro-ministro.
O despacho dava "ordem de mudança de procedimento no sentido de só serem enviados dados à Polícia de Segurança Pública e ao Ministério da Administração Interna".
Em julho, a CNPD anunciou que tinha identificado 225 contraordenações nas comunicações feitas pelo município no âmbito de manifestações, comícios ou desfiles.
Nesse mesmo mês, a Câmara de Lisboa aprovou por maioria (com oito votos a favor, seis contra e três abstenções) a exoneração do encarregado de proteção de dados do município e coordenador da equipa de projeto de proteção de dados pessoais, Luís Feliciano.
No dia anterior, a presidente da CNPD, Filipa Calvão, ouvida no parlamento sobre esta matéria, defendeu que o encarregado de proteção de dados não deveria ser destituído, sublinhando que a responsabilidade deveria ser imputada apenas ao município.
Medina recusou que a exoneração do responsável tivesse servido como "bode expiatório" e definiu-a como uma necessidade para "restabelecer a confiança no funcionamento dos serviços".
Para Luís Feliciano, a sua destituição só pode ser compreendida "em face do atual contexto político e pré-eleitoral" (as autarquias foram a votos em setembro de 2021). Ao Público, o ex-encarregado da proteção de dados disse só ter tido conhecimento do envio da informação sobre os manifestantes aquando da receção da queixa, à qual deu razão e que reencaminhou para o gabinete do presidente, pedindo para mudar procedimentos.
Também confrontado com o caso, o embaixador da Rússia em Portugal, Mikhail Kamynin, afirmou em junho que a embaixada eliminou os dados dos manifestantes do protesto, frisando que as informações não foram transmitidas a Moscovo.
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