Vieira da Silva falava na apresentação do livro do ex-presidente da Assembleia da República e antigo líder do PS Eduardo Ferro Rodrigues, intitulado "Assim vejo a minha vida -- Memórias", no Centro Cultural de Belém, em Lisboa.
Tendo a ouvi-lo o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e o primeiro-ministro, António Costa, Vieira da Silva referiu-se ao período em que Ferro Rodrigues foi secretário-geral do PS entre 2002 e 2004. E fez uma alusão indireta ao processo judicial Casa Pia, no âmbito do qual o então dirigente socialista Paulo Pedroso foi preso preventivamente e depois libertado por decisão judicial.
"Não ficava bem comigo mesmo, porque vivi com o Eduardo [Ferro Rodrigues] boa parte dos episódios da sua vida política, se não dissesse que a vida, a vida política, lhe abriu feridas. E elas estão lá. Eduardo teve a coragem de não as esquecer", apontou o antigo ministro dos governos socialistas de José Sócrates e de António Costa.
Segundo Vieira da Silva, que esteve ao lado de Ferro Rodrigues logo no MES (Movimento da Esquerda Socialista), após ó 25 de Abril de 1974, esses tristes episódios "talvez não sejam feridas abertas, mas não estão cicatrizadas".
"Porque, se o Eduardo diz que o seu partido, o nosso partido, lhe deu mais do que ele próprio lhe retribuiu, a sociedade portuguesa, nós todos, não fomos capazes de compensar, de alguma forma de fazer cicatrizar, as feridas que, de forma absolutamente injusta, lhe foram abertas, a ele e a alguns mais", declarou.
Vieira da Silva definiu o antigo ministro das pastas do Trabalho e da Solidariedade, e depois do Equipamento Social, de António Guterres, como um exemplo de "nobreza" na ação política.
"Há poucas pessoas que têm tanta legitimidade como Eduardo Ferro Rodrigues, porque como poucos que eu tenha conhecido, ele sempre colocou a coisa pública no centro da sua vida, no centro da sua atividade -- e nunca, mas nunca, o interesse ou a vantagem pessoa. E isso é que é ser republicano, isso é que é ser socialista, isso é que é ser um de nós", acentuou, recebendo muitas palmas.
Na intervenção de Vieira da Silva, houve também momentos de humor, quando lembrou que ele e Ferro Rodrigues fizeram parte do MES e, depois, quando contou alguns episódios dos tempos em que ambos fizeram parte dos governos de António Guterres entre 1995 e 2002.
"Tenho de fazer uma inconfidência: Eu e o Eduardo nunca saímos bem do MES, sempre ficou uma parte de nós lá. Quando o Eduardo vinha das reuniões do Conselho de Ministros, no tempo dos governos do engenheiro Guterres, trazia um papelinho em que contava quantos ex-MES estavam lá, quantos eram do Sporting e quantos de outros clubes", revelou.
A transição do MES para o PS, em 1988, segundo Vieira da Silva, é explicada por Eduardo Ferro Rodrigues neste livro, adiantando que se trata de "uma realidade pouco estudada".
"A linha da liberdade, a linha do equilíbrio entre a utopia e a realidade, vai até à entrada no PS. Ferro Rodrigues não fez essa transição [do MES para o PS] pelo peso da vida, não foi por ficar mais velho que saiu do esquerdismo para entrar na social-democracia. Fê-lo porque a reflexão sobre as pessoas, sobre o país, o levou a fazer essa mudança", justificou Vieira da Silva.
Eduardo Ferro Rodrigues, com 73 anos, foi eleito presidente da Assembleia da República há precisamente oito anos, em 23 de outubro de 2015, cargo para o qual foi reeleito em 2019 e que exerceu até março de 2022, quando terminou a anterior legislatura.
Em abril de 2022, o Presidente da República, foi condecorado pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, com a grã-cruz da Ordem Militar de Cristo.
Economista, licenciado pelo Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, a cuja Associação de Estudantes presidiu, Ferro Rodrigues foi fundador do Movimento de Esquerda Socialista (MES), a seguir ao 25 de Abril de 1974, e aderiu ao PS em 1988.
Foi ministro do Trabalho e Solidariedade e do Equipamento Social nos governos de António Guterres, entre 1995 e 2002, e secretário-geral do PS, entre 2002 e 2004.
Marcaram presença nesta sessão o primeiro-ministro, António Costa, os ministros Fernando Medina, Mariana Vieira da Silva, Pedro Adão e Silva e José Luís Carneiro e figuras do PS como João Cravinho, José Vera Jardim, Alberto Martins, Jorge Lacão, Ana Gomes.
Entre os presentes estiveram também o antigo diretor-geral da Saúde Francisco George, o historiador e antigo dirigente do PSD José Pacheco Pereira, a campeã olímpica Rosa Mota, o presidente da associação 25 de Abril, Vasco Lourenço, e António Filipe, do PCP.
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