A líder parlamentar do Partido Socialista (PS), Alexandra Leitão, classificou o silêncio do Ministério dos Negócios Estrangeiros e do Ministério da Educação como sendo “bastante insuportável”, na sequência de um questionário dos Estados Unidos dirigido a universidades portuguesas.
“Este é mais um passo na caminhada dos Estados Unidos em direção à ditadura, não há outra maneira de dizer. Dentro de portas, já tinha utilizado a questão do financiamento federal como forma de condicionar a liberdade de investigação, de expressão. As universidades têm sido alvos preferenciais, como são sempre dos ditadores. […] Este é mais um passo, desta feita fora de portas, para demonstrar autoridade e porque podem”, disse a socialista, na CNN Portugal.
A responsável salientou que as questões prendiam-se com a associação a “projetos de diversidade, relações comerciais com países e projetos ambientalistas”, como se tratassem de “uma coisa má”.
“É inaceitável”, disse, ao mesmo tempo que teceu uma “palavra de apreço e elogio” aos reitores das universidades, que “não responderam, e muitos disseram publicamente que não respondiam e não aceitavam”.
“As universidades são redutos de liberdade, é preciso nunca esquecer isto. É por isso que muitos regimes autoritários começam exatamente nas universidades”, recordou.
A líder parlamentar do PS apontou, além disso, que “a UE deve tentar captar estes cientistas, investigadores e académicos, que muitos estão a ser afastados dos Estados Unidos”.
“A ironia da história é terrível. Foi o que os Estados Unidos fizeram, protegendo e recebendo cientistas que fugiam da Alemanha nazi”, disse.
Recorde-se que o governo dos Estados Unidos cancelou ao Instituto Superior Técnico (IST) um programa que permitia ter nas suas instalações um espaço de divulgação da cultura americana, tendo a instituição portuguesa sido questionada sobre ligações a organizações terroristas.
O presidente do IST, Rogério Colaço, disse à Lusa que recebeu em 5 de março a comunicação do cancelamento, com "efeito imediato", do programa 'American Corner' e, no mesmo dia, um inquérito com "questões bastante desadequadas" sobre se o IST colaborava ou não, ou era citado ou não em acusações ou investigações envolvendo associações terroristas, cartéis, tráfico de pessoas e droga, organizações ou grupos que promovem a imigração em massa.
O diretor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL), Hermenegildo Fernandes, disse à Lusa que recebeu o mesmo questionário, que o deixou estupefacto pela "dimensão do descaramento" das perguntas, nomeadamente sobre "agendas climáticas", se a instituição tinha "contactos com partidos comunistas e socialistas" ou "relações com as Nações Unidas, República Popular da China, Irão e Rússia" e o "que fazia para preservar as mulheres das ideologias de género".
Contactada a Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, a direção da instituição indicou à Lusa, sem mais detalhes, que o 'American Corner' é "um projeto anual que terminará em setembro".
"Estamos a avaliar a hipótese de nos candidatarmos à continuação do projeto ou não", acrescentou a faculdade numa breve declaração.
O reitor da Universidade de Aveiro e presidente do Conselho de Reitores lamentou os termos da comunicação feita pela Embaixada dos Estados Unidos, condicionando a continuidade de financiamento à resposta a perguntas "intoleráveis".
Segundo Paulo Jorge Ferreira, as universidades portuguesas que até agora têm beneficiado de financiamento dos EUA, através do programa American Corner, receberam sexta-feira, dia 7 uma inesperada comunicação da Embaixada norte-americana, com a rescisão unilateral das subvenções em vigor, caso não fosse preenchido um formulário com perguntas tidas como "inadequadas".
"O conselho de reitores discutiu o assunto e as perguntas, pela sua natureza, configuram uma intromissão intolerável na autonomia das instituições e na sua liberdade de investigação e da ação académica", disse à Lusa.
De acordo com o portal da Embaixada dos Estados Unidos em Portugal, os "espaços americanos" totalizam mais de 600 em mais de 140 países e estão localizados, designadamente, em universidades, centros comerciais, bibliotecas e instalações de embaixadas.
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