Carlos Pereira, Susana Nunes e Tiago Viegas são os três atores que vão dar corpo a todas as personagens deste clássico de Shakespeare revisitado, que vai estar em cena no Chapitô, em Lisboa, até dia 23 de março, e que tem muito pouco a ver com o original, como é prática comum desta companhia, explicou o encenador, José Carlos Garcia.
"Na companhia do Chapitô, acontece às vezes pegar nos clássicos e retirar a sua estrutura e ver o que é que ela sugere para o lado risível da tragédia. Portanto, será sempre um dos primeiros passos que damos para trabalhar um clássico. Onde está o risível da tragédia? E esse trabalho é o que, normalmente, depois transformamos", disse o encenador à agência Lusa.
José Carlos Garcia explicou que daí resulta um texto em que "não fica quase nada do texto original" e que, através dos corpos dos atores a improvisar, "vai-se recriando e criando as cenas e as estruturas".
É sempre, e neste caso até mais, "um pouco do metateatro, para sobreviver a esta tragédia", porque o "metateatro é um mecanismo que mostra como estava, como se cria o espetáculo ou se vê a forma como ele está construído dentro do próprio teatro. E foi por aí também que nós fomos um pouco, estamos a jogar ao teatro, não existe a quarta parede".
A companhia de teatro do Chapitô é uma das que mais tem trabalhado peças de Shakespeare -- já fizeram 'Romeu e Julieta', 'Macbeth', 'Hamlet' e agora o 'Rei Lear' --, porque nos clássicos conseguem encontrar-se sempre temas "interessantes" e "universais".
"Neste caso, é o poder, a loucura, a traição, é a fragilidade humana, a saúde mental. É interessante, porque o Lear vai ficando cada vez mais louco. E também é interessante nessa mudança que é preciso ir quase à loucura, ao sofrimento dessa loucura para encontrar a sabedoria", destacou.
A escolha desta peça em particular teve que ver com os "tempos que vivemos nesta crise política, nestas instabilidades sociais".
"Porque, às vezes, são os senhores que mandam, que assinam decretos e que, por um momento, nessa decisão, são afetadas milhares de pessoas. E vivemos nesse mundo, neste momento e foi um pouco a esse encontro", acrescentou.
A tragédia que serve de base a este espetáculo que também promete humor, conta a história de Rei Lear, que decide dividir o seu reino entre as suas filhas.
Antes de o fazer, porém, desafia-as a provar o seu amor. As duas mais velhas agem conforme esperado, mas a mais nova recusa-se a afirmar seja o que for.
A sua relutância enfurece o rei, a jovem é banida para sempre e o país é dividido entre as suas duas filhas mais velhas.
Julgando mal a sua lealdade, rapidamente Lear se vê despojado de todas as armadilhas de estado que o definiam - poder e riqueza.
Nesta versão minimalista de Rei Lear proposta pela companhia do Chapitô, os três intérpretes dão corpo a todas as personagens, movendo-se numa ação incessante de liberdade, num espaço sem cenário e quase sem nenhuns elementos cénicos. "É só mesmo os corpos dos atores a contar aquela história".
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