"Vocês estão a usar o gás africano e negam-nos o uso do gás africano. Isso é moralmente indefensável. As pessoas têm de compreender a profundidade do sentimento em África sobre esse assunto", disse Mo Ibrahim num debate por videoconferência sobre energia e alterações climáticas.
Organizado pela Fundação África-Europa e pela Fundação Mo Ibrahim, o debate foi o primeiro de três que visam antecipar a cimeira União Africana (UA) -- União Europeia (UE), prevista para fevereiro.
No seu discurso de encerramento, o milionário anglo-sudanês, cuja fundação visa apoiar o progresso do continente africano, referia-se à decisão anunciada na cimeira do clima de Glasgow, a COP26, em novembro, de 39 países e agências de desenvolvimento que prometeram parar o financiamento de projetos de combustíveis fósseis no exterior.
A decisão tem sido criticada pelos países africanos, que argumentam que o gás é o mais limpo dos combustíveis fósseis e pode ter um papel na transição energética no continente.
"Achamos um bocadinho estranho que a Europa esteja a chafurdar em gás russo, gás africano, projetos de gás em todo o lado, e quando se trata de África dizem não, não, não, não vamos financiar gás aí", disse o filantropo.
No mesmo debate, a secretária-executiva da Comissão Económica das Nações Unidas para África (UNECA), Vera Songwe, lamentou que, embora a energia seja um equalizador, esteja a ser transformada num agente de desigualdade "quando se diz aos africanos para não usarem parte da sua energia para tornarem o seu continente mais próspero".
A responsável lembrou que em novembro do ano passado a Europa viveu "uma enorme crise" quando os preços do gás quadruplicaram e recordou que em Moçambique, onde se vive uma crise e o crescimento económico está em queda, ainda se produz gás para consumo na Europa.
"Como é que um moçambicano que não tem acesso energia -- só 17% o têm -- vê as empresas europeias a continuar a explorar o gás para levar para a Europa quando os europeus dizem aos africanos para não produzirem mais gás", exemplificou.
Vera Songwe sublinhou que o gás permite reduzir o custo da energia e garantir mais investimento para África e acrescentou que a questão das alterações climáticas não se coloca: "Quando produzimos mais gás reduzimos a produção de emissões de carbono em quase 38%".
A cimeira de chefes de Estado e de Governo da UE e da UA, a sexta, inicialmente marcada para 2020, está agendada para fevereiro em Bruxelas, depois de sucessivos adiamentos devido à pandemia da covid-19.
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