O chefe de departamento de Prevenção de Violência e Proteção dos Direitos da Crianças do Instituto Nacional da Criança (Inac), Bruno Pedro, considera grave o problema que atinge todo o país e classes sociais, com maior destaque para as províncias de Luanda (2.102), Benguela (1.281), Huíla (246) e Huambo (562).
De acordo com Bruno Pedro, os casos abrangem desde professores, pastores (religiosos), jornalistas, taxistas, polícias e militares, sendo estas duas classes profissionais as mais denunciadas.
"Estamos satisfeitos porque há agora uma colaboração muito grande com esses dois órgãos [polícia e forças armadas], porque todas as situações tão logo os responsáveis tenham conhecimento, por um lado, denunciam e encaminham para aqui. Por outro lado, temos sido recorrentemente solicitados para fazer trabalhos de sensibilização, de informação", observou.
"A fuga à paternidade (...) tem sido o tipo de violência contra criança que mais se pratica nos nossos registos", disse Bruno Pedro.
Segundo o assistente social, o problema é grave, porque a ausência do pai e, em alguns casos, também abandono por parte das mães, deixa traumas nas crianças que podem tornar-se futuros cidadãos "desprovidos de várias habilidades para viverem socialmente".
"Hoje, nós olhamos para a crise no seio das famílias e da sociedade, mas precisamos nos questionar que tipo de cidadãos é que temos, sendo que uma boa parte deles vêm de um contexto em que foram vítimas da fuga à paternidade", frisou.
Para Bruno Pedro, os números estão aquém da realidade, apesar de irem aumentando as denúncias, salientando que se verifica um aumento do número de crianças na rua, que dizem ter família.
"Temos situações nos bairros de muitas crianças que à noite circulam desacompanhadas, atravessam de uma província para outra sozinhas. Reconhecemos um ambiente de muita fragilidade e que dá azo a que muitas crianças sejam vítimas de rapto, tráfico, abuso sexual, atropelamento e outras coisas", disse.
O ambiente familiar, as competências familiares, precisam ser fortalecidas, prosseguiu o responsável, acrescentando que são alegadas como causas para a fuga à paternidade, o desemprego, a insuficiência de recursos quando arranjam outra família, dúvidas sobre a paternidade, disputa da guarda da criança, entre outras.
"Temos situações concretas de pais, até pais com estudo superior, que simplesmente não aceitam assumir a paternidade porque acreditam que essa criança seja fruto de uma situação de feitiçaria ou coisas relacionadas com isso, são várias as situações", realçou.
Apesar de os juristas separarem os casos, considerando a fuga à paternidade como falta de reconhecimento legal das crianças distinta da falta de prestação de alimentos, o INAC junta as duas realidades, reconhecendo que é maior o número daqueles que não dão sustento aos filhos.
"Isso [registo civil] também nos preocupa. O registo é importante para garantir que ela tenha acesso a outros direitos, mas a falta de prestação de alimentos é determinante para a vida da criança", comentou.
Em 2024, de acordo com Bruno Pedro, preocupou também o aumento de casos de exploração do trabalho infantil (2.875), a violência física (1.722), a violência psicológica (875), a violência sexual (649), entre outros casos relacionados à violência contra a criança.
"Precisamos muito de sensibilização, porque há uma consciência de normalização de violência contra a criança, que precisamos desmistificar", apelou.
"Muitas vezes é falta de informação, de formação, da cultura jurídica das pessoas, de conhecimento sobre a psicologia do desenvolvimento (...) há crianças que podem vir ao mundo com alguma deficiência, podem ser autistas, e por não entendermos isso acusamos de feitiçaria", observou.
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