"Se não me elegerem, paciência. Não me meto nas trapalhadas dos partidos"

O cabeça de lista do Partido Democrático Republicano (PDR) às eleições europeias, António Marinho e Pinto, é o entrevistado de hoje do Vozes ao Minuto.

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© Orlando Almeida / Global Imagens

Sara Gouveia
16/05/2019 09:40 ‧ 16/05/2019 por Sara Gouveia

Política

Marinho e Pinto

É  conhecido pelo seu discurso controverso, inflamado e por não ter papas na língua. Em 2014, pouco depois de ter sido eleito como eurodeputado pelo Movimento Partido da Terra (MPT) abandonou o partido por divergências políticas e fundou o Partido Democrático Republicano (PDR), por quem se apresenta como cabeça de lista nestas eleições europeias, que se realizam no próximo dia 26 de maio.

Criticou por várias vezes o Parlamento Europeu, mas em conversa com o Notícias ao Minuto António Marinho e Pinto assume que continuou o mandato de eurodeputado até ao fim e que agora se recandidata porque não é "dos que fogem aos combates". Depois de ter sido uma surpresa eleitoral nas eleições de 2014, ao garantir dois mandatos, e de, nesta segunda candidatura, estar perante projeções que não lhe são tão favoráveis, assume-se como "um tipo de português que só faz prognósticos no final do jogo".

Quer "combater a teatralização que os partidos políticos levam para o Parlamento Europeu" e defende a criação de Forças Armadas europeias e a diminuição do salário dos eurodeputados, pois considera ser "preciso refundar a Europa em torno dos valores e não em torno das mordomias e dos privilégios dos dirigentes políticos europeus". 

É isto que é preciso mudar na Europa: esta cultura gastadora, esta cultura que lança dinheiro para cima dos problemas sem os resolverQual foi a sua maior conquista no seu mandato como eurodeputado?

Não vejo isso em termos de conquista de um deputado. Inseri-me numa delegação de portugueses que lutam pela Europa e lutam pela defesa dos interesses de Portugal. Se quisermos falar em termos de sucessos parlamentares, acho que a diretiva sobre direitos de autor no espaço digital é talvez aquele trabalho de que mais me orgulho porque significa uma defesa da cultura europeia, significa uma defesa da liberdade de imprensa. Na internet, que é um espaço de partilha por natureza, faltava partilhar uma coisa: uma parte pequena dos gigantescos lucros das plataformas americanas com os criadores europeus e com aqueles que fornecem os conteúdos para que essas plataformas obtenham esses gigantescos lucros. Estamos a falar de dezenas de milhares de milhões de euros e o que se pede, e se pretende, é que ao menos uma centena de milhões de euros sejam pagos e distribuídos por quem faz, produz, cria os conteúdos que essas plataformas oferecem de forma gratuita.

Por outro lado, é gratificante o resultado final, porque em cinco anos no Parlamento Europeu os meus colegas mais velhos dizem que nunca antes tinha havido uma tão intensa campanha de manipulação e de intoxicação da opinião pública como aconteceu com esta diretiva, para fazer crer e enganar as pessoas de que vem aí a censura e vem aí a destruição da internet, quando o que se está a fazer é o contrário.

Outro dos trabalhos, que apesar de não ter obtido êxito, me orgulho muito, foi um relatório, de que fui nomeado relator, sobre a reforma do Tribunal de Justiça da União Europeia. O sucesso das pessoas e das ideias políticas faz-se nas vitórias políticas, mas também se faz nas derrotas. Esse projeto não foi aprovado, mas orgulho-me de, juntamente com outros quatro deputados portugueses, ter sido dos únicos que defendeu a justiça nesse projeto. É fácil de o explicar: o Tribunal de Justiça pediu ao Parlamento Europeu que aprovasse uma diretiva prevendo a nomeação de mais 12 juízes. O Parlamento aprovou e o relatório seguiu para o Conselho Europeu para fazer a nomeação, mas o Conselho é constituído por 28 membros e, por isso, não se entenderam para nomear apenas esse número de pessoas. A maioria dos membros - 16 -  não nomeava nenhum e por isso bloquearam as outras nomeações. Como é que foi resolvido? Quiseram nomear cada um o seu, apesar de o Tribunal querer apenas 12. Ou seja, não foi para resolver um problema do Tribunal foi para resolver um problema do Conselho. Isto demonstra o desprezo que algumas instituições da União Europeia, mesmo das instituições políticas mais importantes como é o caso do Conselho, têm pelos contribuintes europeus. Contra isto me opus, contra isto me bati, mas enfim no Parlamento Europeu a maioria dos eurodeputados, provavelmente sem saber o que estavam a votar, votaram contra isto.

É isto que é preciso mudar na Europa: esta cultura gastadora, esta cultura que lança dinheiro para cima dos problemas sem os resolver.

Mas não crê que na altura a questão do Artigo 13 foi, talvez, mal explicada ao público?

Poderá ter havido aí alguma falha, mas não foi por isso. Foi pela intensa campanha de intoxicação. Foram pelos milhões e milhões de dólares que essas empresas americanas - a Google, o Facebook - utilizaram para manipular a opinião pública, aproveitando-se de pessoas disponíveis e dos ingénuos que acreditaram nessa mentira. 

É preciso denunciar esta propaganda e combater as encenações que sistematicamente estão a fazer, combater a retórica panfletária que esses partidos usam para semear ilusões nos eleitores portuguesesO que é que deixou por fazer que pretende pôr em prática desta segunda vez, se for eleito?

Combater a teatralização que os partidos políticos levam para o Parlamento Europeu. Há muita falsidade, há muita mentira, muita propaganda, muitos partidos a dizer que defendem os interesses, mas é mentira. Por exemplo, o PCP e o Bloco de Esquerda votaram contra um acordo de Pescas entre a UE e o Reino de Marrocos, que permitia aos pescadores portugueses e europeus pescar nas águas territoriais de Marrocos como sempre fizeram. Pois esses partidos votaram contra os interesses dos pescadores portugueses para defender os interesses da Frente Polisario.

É preciso denunciar esta propaganda e combater as encenações que sistematicamente estão a fazer, combater a retórica panfletária que esses partidos usam para semear ilusões nos eleitores portugueses. Assistimos no Parlamento Europeu a uma convergência estratégica entre, por exemplo, PSD e PS nas questões europeias e nas questões nacionais, mas chega à altura das eleições e começam a fazer um teatro absolutamente grotesco, que chega a ser obsceno e a criar artificialmente rivalidades que não existem. Tudo isto para enganar e para fanatizar os eleitores, para os fidelizar em torno dos respetivos partidos. É isto que afasta os eleitores dos eleitos, é isto que está a degradar a democracia portuguesa europeia, é isto que está a corroer a democracia.

Outro ponto importante para mim, é combater politicamente a extrema-direita. A extrema-direita e a ascensão da extrema-direita não se combatem com a intensificação da propaganda. Não, combatem-se com a adoção de políticas que respondam aos interesses dos povos europeus. Para isso não pode haver tamanha distância em termos de salários ou remunerações, a nível de privilégios e de mordomias, é preciso que continuemos a pertencer àqueles de onde saímos para representar os povos e as pessoas. É este combate que tem de ser feito com firmeza e com determinação, mesmo que muitas vezes signifique a oposição e a hostilidade de uma certa comunicação social.

As projeções do Parlamento Europeu não deixam grande margem para esperanças. Acredita mesmo numa reeleição?

Não sei, não ligo às projeções. Pertenço a um tipo de português que só faz prognósticos no final do jogo e, portanto, também só faço previsões depois de contados os votos. Em todo o caso, em 2014 as sondagens davam-me 1,7%, depois tive a votação que tive [7,1% com o MPT]. Agora não faço previsões, gostava era de poder apresentar as minhas ideias como fazem os outros partidos todos.

Gostava a RTP convidasse todos os partidos com representação parlamentar para debater e que não selecionasse uns e excluísse outros. Gostava que os órgãos de comunicação, sobretudo os órgãos de comunicação  públicos, como é a RTP e a RDP respeitassem o pluralismo e cumprissem, ao menos de 5 em 5 anos durante 10 ou 12 dias, as regras deontológicas do jornalismo, ou seja, ouvir todos de igual forma e não estar a promover uns e a fazer propaganda a uns e críticas e ataques a outros.

Porque é que acha que isso acontece?

Não sei, as estações privadas puseram e com justeza. Vão fazer um debate com os partidos representados representados no Parlamento Europeu e convidaram-me porque tem lá um deputado. A RTP não o fez, foi aliás a única que teve este comportamento ao longo do mandato. Durante os cinco anos do mandato promoveu mensalmente debates entre os deputados eleitos, dos 21 deputados fui o único que foi excluído deliberadamente desses debates. Por isso digo que são a vergonha da informação em Portugal e é a vergonha da própria democracia. Podem não gostar de A, B ou C, mas devem ouvir igualmente uns e outros.

A provocação que lhes lanço é essa: Sou profundamente liberal em política, mas sou profundamente democrático na economia

Pertence ao grupo parlamentar ALDE - Aliança dos Liberais e Democratas pela Europa. Como é a sua relação com a família política?

O ALDE integra dois grandes partidos europeus: o Partido da Aliança dos Democratas e Liberais pela Europa e o Partido Democrata Europeu. Sou vice-presidente do Partido Democrata Europeu e o presidente é o francês François Bayrou. A minha relação no ALDE é muito clara. Sinto-me bem lá dentro porque estou em desacordo em muitas coisas e discuto e exponho. Muitas pessoas escolhem as famílias políticas com quem mais se identificam, eu escolho aquelas com quem tenho divergências, que me desafiam e que posso provocar também. O ALDE é maioritariamente constituído por deputados liberais de países democráticos ricos, desenvolvidos - Suécia, Dinamarca, Holanda, Reino Unido, Alemanha, Áustria, Finlândia - são os chamados bloco de países ricos da Europa e que têm, a respeito dos países como Portugal, opiniões nem sempre muito favoráveis. E eu debato com eles essas questões, apresento-me como português pertencente a essa escola e temos tido debates espantosos. Eu mudei, mas eles também estão a mudar.

Ainda no passado mês de março almocei, em Bruxelas, a uma mesa com várias pessoas e com oito primeiros-ministros desses países, portanto é bom que esteja lá um português que pense de maneira diferente deles. Muitos mudaram a opinião que tinham sobre Portugal e é evidente que defendo os meus pontos de vista, como ao dizer que só se pode ser liberal se se for ao mesmo tempo social.  E a provocação que ao mesmo tempo eu lhes lanço é essa: Sou profundamente liberal em política, mas sou profundamente democrático na economia.

Por isso, considero que esta família política europeia é o sítio onde, como português, devo estar. Talvez pelas minhas convicções ideológicas estaria mais próximo de outros, mas que estaria lá eu a fazer, era mais um a dizer as mesmas coisas. Assim onde estou aquilo que digo pode ser mais útil.

Na sua primeira candidatura ao Parlamento Europeu foi cabeça de lista do MPT, passado pouco tempo acabou por se afastar do partido e fundou o PDR. Criticou o Parlamento Europeu, mas continuou como eurodeputado, porquê?

Pela mesma razão que continuei em Portugal quando criticava a ditadura e me aconselhavam a deixar o país. Fico para mudar, não sou dos que fogem aos combates. Critiquei, continuo a criticar e portanto fiquei lá para mudar.

Muita coisa já está a mudar. Também pela minha ação porque hoje em dia já há muito mais deputados a dizer aquilo que se ganha [no Parlamento Europeu] é demais, que é “imoral” como alguns agora já dizem, que na altura estiveram calados quando o disse da primeira vez e que tinham estado calados durante décadas. Que dizem que é preciso que o Parlamento Europeu tenha iniciativa legislativa e não esteja a fazer debates ‘faz-de-conta’ que é o que mais faz. Só entre 2014 e 2018 fez 358 debates sobre a situação interna de 90 países que não têm nada a ver com a Europa é preciso ficar onde se está mal para as coisas mudarem. E no Parlamento isso já é visível.

Depois de chegar a dizer que o "Parlamento Europeu não tem utilidade”, que é “um faz de conta”, vemo-lo a candidatar-se novamente. O que é que pesou nessa decisão?

Muitos debates são um 'faz-de-conta' e muitos debates são absolutamente inúteis para a Europa. É uma questão de mudar as coisas, estou na política para mudar este país, para mudar a própria Europa. É preciso refundar a Europa em torno dos valores e não em torno das mordomias e dos privilégios dos dirigentes políticos europeus.

Não conheço ninguém que tenha abdicado dos salários, mas cada um faz o que quer com aquilo que ganha. O problema não está nos deputados que recebem, mas sim no Parlamento que paga  Outras das críticas que fez foi sobre os “ordenados vergonhosos” dos eurodeputados, uma polémica que surgiu novamente durante esta campanha, em que os salários foram classificados como “imorais”. Disse que “Não se pode ganhar 30 vezes mais, ou 20 vezes mais o salário mínimo para representar pessoas que recebem o salário mínimo”.  Qual é a solução?

A solução é reduzir os salários dos eurodeputados, é aproximá-los de quem representam. Um deputado pelo facto de ser eleito não deve ter privilégios que a maioria das pessoas não tem. Deve ter as remunerações necessárias para uma vida condigna e para fazer face às despesas que tem, mas mais nada.

Não conheço ninguém que tenha abdicado dos salários, mas cada um faz o que quer com aquilo que ganha. Sei que houve aí algumas pessoas que receberam o salário todo e depois andaram para aí a gabar-se que pagava e que dava. Sempre fiz as minhas ações de solidariedade, mas não as vou contar para os jornais, para fazer propaganda política.

O problema não está nos deputados que recebem, mas sim no Parlamento que paga. Uma das razões por que o populismo está a crescer na Europa, sobretudo um populismo de extrema-direita, deve-se ao facto de os deputados das forças democráticas reivindicarem para si demasiados privilégios em relação àqueles que representam, a quem pedem os votos.

Caso seja novamente eleito, quais são as suas prioridades para os próximos cinco anos?

As minhas prioridades são mudar a Europa. Temos várias prioridades como defender um exército europeu, umas Forças Armadas europeias, por exemplo. Isso significaria que os estados-membros e os contribuintes europeus iriam pagar muito menos. Neste momento temos 28 Forças Armadas na UE, mais a NATO e os contribuintes estão a pagar para isso. Os países da UE gastam cerca 10 vezes mais na Defesa do que a Rússia e, no entanto, têm Forças Armadas muito menos eficazes. É possível gastar menos e ter maior capacidade de Defesa. Queremos umas Forças Armadas europeias comandadas por europeus e não por não-europeus, que estejam dependentes do poder político democrático e não como uma NATO que não responde perante nenhum poder político e que está em roda livre ao sabor das variações belicistas de muitos dos seus generais.

Queremos um programa europeu de mobilidade que responda aos problemas de mobilidade no espaço europeu, queremos a abolição das fronteiras internas na Europa, mas queremos um reforço das fronteiras externas que não podem estar abertas como têm estado. Tem de existir uma política comum de defesa das fronteiras europeias, desde o sul e norte da França até à fronteira marítima portuguesa.

E seria possível chegar a um consenso nesse aspeto?

Se não houver consenso a democracia tem resposta para isso: é a maioria. Queremos acabar com a regra das unanimidades nos órgãos democráticos. A unanimidade não é uma regra democrática, é dos comités centrais dos partidos comunistas, é dos parlamentos dos partidos dos países das ditaduras. Na democracia funciona a maioria, portanto onde houver unanimidade não haverá verdadeiramente democracia. Queremos que nenhum membro de um órgão colegial tenha poder de veto sobre as decisões maioritárias desse órgão.

Há o risco de desmoronamento, mas sou dos que acreditam que a Europa não põe aos europeus problemas que estes não possam resolver Nos próximos cinco anos vamos assistir a uma Europa fortalecida ou a desmoronar-se?

Há o risco de desmoronamento, mas sou dos que acreditam que a Europa não põe aos europeus problemas que estes não possam resolver. Agora, temos de facto uma situação grave na Europa que é a falta de dirigentes com visão, com inteligência, com capacidade de ver além da linha do horizonte, como tivemos no passado. Dirigentes com um estatuto ético e político do sr. Durão Barroso é que têm afundado a Europa, ou como Tony Blair, David Cameron, Sarkozy… É preciso uma nova vaga de pessoas que sejam capazes de antever o futuro e criar hoje as soluções para os problemas com que nos defrontaremos amanhã.

Referiu anteriormente a sua preocupação com a extrema-direita. Como é que vê a escalada destes movimentos que têm ascendido a lugares de destaque na política internacional, como ocorreu na Áustria, Itália, Hungria, Polónia ou Espanha?

A ascensão da extrema-direita deve-se às fragilidades éticas e de ação política dos partidos democráticos. No caso dos países ricos deve-se também ao medo que a generalidade das pessoas têm de perder o seu nível de bem-estar social conseguido ao longo de mais de sete décadas. A Europa são 510/511 milhões de habitantes pertencentes a 28 países, representam cerca de 6,5% da população do planeta, mas produzem mais de 20% do PIB, de toda a riqueza mundial e gastam mais de 50% de todas as despesas sociais do planeta, isto significa que 6,5% da população gasta consigo mesmo mais de 50% das despesas sociais do planeta e que aqui se atingiram níveis de bem-estar nunca antes atingidos em nenhuma outra época histórica nem agora existe em nenhum outro ponto do planeta.

O surgimento destes movimentos tem sido maior e mais visível justamente nos países mais ricos onde pensávamos que a democracia estava consolidada. Há erros gravíssimos dos dirigentes democráticos desses países que demonstram não compreender a gravidade ou a intensidade de certos fenómenos que têm a ver com a identidade cultural, política e religiosa da Europa.

Tendo em conta aquilo a que temos assistido nos últimos meses no parlamento britânico, em que basicamente os deputados não parecem querer nenhuma das opções que são colocadas em cima da mesa, como é que vê a candidatura do país às eleições europeias?

Vejo com naturalidade, ainda não saiu, é da União Europeia, por isso vai concorrer na mesma. Não temos de estar a antecipar coisas que ainda não aconteceram, nem podemos antecipar consequências de factos que ainda não ocorreram. Não se consumou o Brexit por isso o Reino Unido continua a ser um parceiro da UE em pleno direito. Digo isto com algum à vontade porque acho que a saída do Reino Unido é muito prejudicial para Portugal. Temos afinidades enormes com o Reino Unido, não só na nossa história, porque lhes devemos em parte a nossa própria independência, como eles temos também uma vocação atlântica e expandimo-nos pelo mundo através do Atlântico, temos um espaço enorme à nossa frente que não nos deve separar dos outros continentes, mas que nos deve aproximar. Depois eles têm a Commonwealth, nós temos uma comunidade de povos de língua portuguesa e portanto seja qual for o resultado vamos ficar mais frágeis na Europa com a saída do Reino Unido.

Uns acusam os outros de deixar pessoas morrer no Mediterrâneo, os outros acusam de volta de quererem abrir as fronteiras da Europa a todos os que aqui vêm. É impossível uma e outraA União Europeia continua a debater-se com a questão dos migrantes e refugiados no Mediterrâneo. Este mandato que passou foi o que teve de lidar mais de perto com a responsabilidade de responder à crise. Como vê o que foi feito? O que faria diferente, se faria?

O problema é muito grave e tem sido apresentado numa visão ou com um discurso que assenta em modelos de pensamento binário de um extremo ao outro. Uns acusam os outros de deixar pessoas morrer no Mediterrâneo, os outros acusam de volta de quererem abrir as fronteiras da Europa a todos os que aqui vêm. É impossível uma e outra. A Europa tem de ser mais solidária na proteção da vida daqueles que atravessam em condições precárias o Mediterrâneo, mas a Europa também não pode abrir indiscriminadamente a todos os que lhe batem à porta, porque se não viria toda a África para a Europa em menos de uma década.

A solução a adotar é ter políticas de repatriamento, socorrer, tratar os migrantes e depois repatria-los para os seus países de origem. É preciso também colaborar e desenvolver políticas que ponham fim às guerras para promover políticas de paz em África e no Médio Oriente, porque o que a Europa tem feito e a UE também, é promover as guerras no Iraque, na Líbia e na Síria e portanto há um interesse económico das indústrias armamentistas para poderem vender as suas produções. Isto tem de ser combatido e tem de ser denunciado.

Até porque muitas vezes não são as pessoas mais miseráveis que estão a fugir para a Europa, são as que têm dinheiro para pagar um preço elevado aos traficantes, que é outra situação que tem de ser combatida também, essas organizações criminosas, verdadeiras máfias, que fazem esse tráfico de pessoas a quem cobram quantias exorbitantes.

É uma das questões fundamentais que o PDR e eu defendemos para a UE, a criação de um programa de investimento em África para criar emprego nessa região, porque criar emprego lá é criar mercado para produtos europeus. Em vez de termos pessoas pobres, na miséria, famintas, a fugir e a tentarem entrar por todos os meios na Europa, vamos tentar criar condições para que se fixem lá. O que está a acontecer é errado, há pessoas prisioneiras em campos de refugiados, em condições indignas, mas essas pessoas também não podem entrar todas de uma vez, a Europa não tem essa capacidade.

É preciso dar passos concretos para que se adotem políticas concretas que resolvam os problemas concretos com que nos deparamos.

O seu programa eleitoral para as europeias de 2019 não diverge muito daquele que apresentou nas últimas eleições. Apresenta como “objetivo apresentar ideias e trazer ideias novas” para aproximar “os povos das instituições democráticas europeias”, como é que se põe isso em prática? O que é que teria de mudar?

Com políticas de aproximação. Já propus, por exemplo, uma redução a metade dos ordenados dos eurodeputados, isso dava um estatuto mais próximo dos eleitores. Um eleitor vota numa pessoa e pensa: “vou votar nele e ele vai ganhar 20 mil euros por mês com o meu voto?”. Ninguém fica bem na fotografia. O ordenado são 8.800€, depois são mais cerca de 4.500€ fixos de subsídio mensal, mais 320€ de subsídio diário, mais o subsídio de deslocações, mais 25 mil euros por mês para pagar a funcionários que são contratados livremente. No caso do meu grupo [ALDE] ainda são mais 30 e tal mil euros por ano para atividade política. Isto não é próprio da democracia, as ditaduras é que se remuneravam assim. O pior de tudo isto é que só paga imposto sobre 8.000€, 10% na UE e depois o IRC e o IRS em Portugal sobre 6 mil e tal, não é justo isso, porque os portugueses pagam imposto sobre tudo o que recebem. Isto é escandaloso e ofensivo para a dignidade dos eleitores e isto não se combate com propaganda, combate-se enfrentando a realidade e enfrentando a verdade.

Qual é para si a reforma mais urgente a ser feita na forma como funcionam os órgãos da União Europeia?

Para mim o mais urgente é respeitar o princípio de separação de poderes na UE e o princípio do autogoverno do Parlamento Europeu. Quer isto dizer que o Parlamento Europeu deveria fixar a sua própria sede e não andar de 'armas e bagagens' entre Bruxelas e Estrasburgo, como acontece pelo menos uma vez por mês.

Depois o princípio da separação ainda exige que seja o Parlamento a fixar a sua própria agenda legislativa e não é. Quem fixa a agenda legislativa do Parlamento Europeu é a Comissão Europeia, porque o Parlamento não tem iniciativa legislativa, só a Comissão pode fazer propostas de lei e o Parlamento só pode discutir as propostas que vêm da Comissão. É por isso preciso capacidade legislativa plena ao Parlamento Europeu. Isto é sagrado, sem isto não há reforma nenhuma que se possa fazer nas instituições europeias no sentido da sua democratização e da sua aproximação aos eleitores.

Defendo ainda o bi-parlamentarismo, ou seja um parlamentarismo bi-camarário, que haja um senado, que já existe o Conselho da União Europeia e que deve haver uma Câmara de Representantes, que já existe que é o Parlamento Europeu, mas é preciso haver uma definição clara das competências de cada um. É preciso perceber quando é que é necessário uma decisão dos dois e quando bastará um para a tomar. O que hoje acontece é que o Parlamento Europeu está limitado a montante pela Comissão Europeia, porque é quem faz as propostas de lei e depois está limitado a jusante pelo Conselho Europeu porque têm de as aprovar. Ou seja, mesmo que o Parlamento faça alterações às propostas apresentadas pela Comissão têm sempre de passar pelo Conselho e isso origina muita mentira por aí a dizer que o Parlamento fez isto ou aquilo, quando não é assim. Discute as leis que a Comissão apresenta e as alterações que fizer têm de passar pelo Conselho, porque se não não entram em vigor, não têm efeitos normativos.

A extrema-direita não é democrática, nos anos 30 usou o fascismo, a violência para tomar o poder, e agora está a usar a inteligência e o populismo para o mesmo efeito, mas é na verdade xenófoba e racistaCinco anos depois de ter chegado ao Parlamento Europeu quais são as principais diferenças que vê na União Europeia?

Acho que a juventude está mais consciente do seu papel na transformação europeia, acho que estamos mais próximos de uma verdadeira refundação europeia, até diria de um novo renascimento na União Europeia. Há mais jovens a intervir, há mais mulheres a intervir, há mais igualdade, há ainda resquícios de coisas muito velhas, de olhar para outros povos com superioridade, de olhar para África como se fosse uma espécie de asilo dos pobres. Há muita coisa que está em mudança, mas umas boas e outras más.

A ascensão da extrema-direita é uma das más, porque está a ameaçar o projeto europeu. A extrema-direita não é democrática, nos anos 30 usou o fascismo, a violência para tomar o poder, e agora está a usar a inteligência e o populismo para o mesmo efeito, mas é na verdade xenófoba e racista. Isso é perigoso porque a União Europeia é pluralidade. Havendo uma identidade europeia essa é plural. Nunca serei igual a um alemão ou um francês, mas é essa diversidade que faz a diferença.

Não torço por ninguém, mas vou-lhe dizer que neste mandato houve cinco deputados portugueses no Parlamento Europeu a quem dou méritoSem ser por si, por quem é que está a ‘torcer’ dos cabeça de lista portugueses às europeias? Porquê?

Não torço por ninguém, mas vou-lhe dizer que neste mandato houve cinco deputados portugueses no Parlamento Europeu a quem dou mérito. Dois deles são Paulo Rangel [PSD] e Maria João Rodrigues [PS], dois grandes eurodeputados portugueses que foram fundamentais em momentos-chave para os interesses portugueses e tenho pena que Maria João Rodrigues tenha sido afastada das listas do Partido Socialista porque Portugal vai perder muito com a sua ausência. Os outros dois são também do PSD e do PS e foram igualmente fundamentais: José Manuel Fernandes [PSD], sobretudo nos orçamentos, é um deputado essencial para o país e outro deputado, que também saiu, Ricardo Serrão Santos que é um académico açoriano de uma competência extraordinária. Por fim, Miguel Viegas, do PCP, que também já saiu, que é um dos melhores deputados portugueses. Dos cabeças de lista de agora não voto em nenhum, nem torço por nenhum, no caso de Rangel faço-lhe apenas justiça ao mandato anterior, para o futuro acho que a opção dos eleitores deve ser o PDR e eleger-me a mim, se não me elegerem, paciência. Não me meto nas trapalhadas dos partidos. Porque o que eles querem é levar para lá as encenações da Assembleia da República.

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