Francisco Louçã considerou, esta sexta-feira, que o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, está a "colocar-se numa armadilha" no que diz respeito à recente polémica com o Chega.
No seu habitual espaço de comentário, na SIC, o antigo líder do Bloco de Esquerda começou por abordar um dos momentos que marcou o dia - a audiência do Chega, em Belém, a pedido do partido, e na qual André Ventura pediu uma intervenção de Marcelo junto de Augusto Santos Silva.
Na opinião do comentador, Marcelo "destrunfou" o encontro, ao reduzi-lo à "banalidade" da sua posição presidencial.
"Marcelo Rebelo de Sousa destrunfou a audiência de hoje, reduzindo-a à banalidade da sua posição presidencial, de ouvir os partidos quando eles lhe pedem e não dando qualquer importância. Fez muitíssimo bem"
Contudo, na sua análise, o também economista destacou que "há três problemas envolvidos nesta questão".
Primeiramente, "a motivação" de Augusto Santos Silva. "Ele quer destacar-se por via deste conflito e isso tem um risco para ele, que é a banalização de um conflito que lhe correu muito bem nas primeira pressões. Ele foi muito elegante, contundente e incisivo na resposta ao Chega, mas não o pode fazer em permanência, o que leva a um segundo problema", notou.
"O presidente da Assembleia, ao intervir sobre questões do discurso político, creio que não está a perceber a diferença entre recusar propostas que, sendo inconstitucionais, não devem ser admitidas e a sua intervenção sobre o discurso dos deputados", acrescentou.
"Porque um deputado não pode apresentar uma proposta inconstitucional, contra a Constituição, mas pode fazer um discurso criticando a Constituição, por mais que isso choque os nossos valores, ou as nossas opiniões. Mas isso faz parte do debate político e creio que Augusto Santos Silva está a pisar um pouco este risco", continuou o antigo líder bloquista.
Em terceiro lugar, Francisco Louçã destacou que "este jogo pode-se banalizar" para André Ventura que "falhou", mas o mesmo não acontece com Augusto Santos Silva.
"Em terceiro lugar, esta polémica interessa também a Ventura, por isso tentou engrandece-la com a visita a Belém. Falhou e está numa situação muito difícil porque, na verdade, não há nenhuma base regimental, não há nenhuma base de procedimento para fazer esta censura ao presidente [do Parlamento]", afirmou.
"Se ela fosse aceite e mesmo que fosse aprovada - coisa que não tem nenhuma hipótese, o Chega está isolado - não teria qualquer consequência, porque um presidente não pode ser demitido por esta via, ao contrário de um Governo. E, por outro lado, porque o Chega se tem algum protesto a fazer sobre a condução da presidência fá-lo perante o plenário, já o tem anunciado algumas vezes, tem feito uma vez ficando isolado, não tem feito doutras, é tudo um pequeno jogo", destacou.
"O problema é que este jogo pode-se banalizar para Ventura, não se pode balizar para Augusto Santos Silva. E creio que, por isso, o presidente da Assembleia está-se a colocar numa armadilha", completou.
Recorde-se que o Presidente da República recebeu esta segunda-feira o Chega, a pedido do partido. Após a audiência, André Ventura falou aos jornalistas e indicou que chamou "a atenção" do chefe de Estado para o "comportamento" do presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva.
Ventura indicou que Santos Silva elegeu o Chega "como alvo" e acusa-o de "atropelar sistematicamente o regimento" do Parlamento, uma opinião que, segundo o político, é partilhada por outros partidos.
Já Marcelo recusou comentar o assunto, dizendo que não se pronuncia sobre problemas internos do Parlamento.
O pedido de audiência surgiu depois de, na semana passada, os deputados do Chega terem abandonado o hemiciclo em protesto contra a condução dos trabalhos pelo presidente da Assembleia da República depois de este ter comentado uma intervenção de Ventura sobre estrangeiros em Portugal, recendo aplausos das outras bancadas.
Antes, o Chega já tinha divulgado um projeto de resolução em que se pretende condenar o comportamento do presidente da Assembleia da República por ausência de imparcialidade e de isenção no exercício do seu cargo.
Já o presidente da Assembleia explicou, em entrevista à noite à RTP2, que qualquer intervenção no parlamento "pode motivar outras intervenções, críticas, protestos, defesas da honra e outras figuras regimentais que servem para criticar tudo o que do ponto de vista de um deputado ou deputada mereça crítica".
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