O líder do Partido Social Democrata (PSD), Luís Montenegro, atirou farpas ao primeiro-ministro, António Costa, considerando que o chefe do Executivo tem medo “da falta de confiança que os portugueses hoje sentem no Governo”. No rescaldo das declarações proferidas pelo antigo Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, o responsável apontou ainda que ignorar aquilo que o ex-chefe de Estado “referiu na sua intervenção de sábado é atuar no domínio do fanatismo político, do estado de negação”.
“Temos um país onde as pessoas, as famílias, as empresas pagam impostos máximos e recebem em troca serviços mínimos. Somos um país que, efetivamente, tem problemas estruturais que o Governo não resolve e que são a realidade concreta das pessoas. São o dia a dia das pessoas. Ignorar isto, que é o mesmo que dizer ignorar aquilo que o Presidente Cavaco Silva referiu na sua intervenção de sábado é atuar no domínio do fanatismo político, do estado de negação, o que é um duplo problema para Portugal”, começou por dizer Montenegro, em declarações à imprensa, à entrada para um jantar no âmbito das Jornadas Parlamentares do PSD, no Funchal.
Na ótica do social democrata, o que “faltava mesmo” a Portugal era “ter um Governo que vive noutro país, noutra realidade”.
“Efetivamente, cada vez mais o país, os portugueses, as famílias portuguesas caminham para um estado em que há um esgotamento da confiança no Governo e uma vontade de mudar de Governo”, complementou, adiantando que todos os partidos têm uma opinião unânime quanto à alienação do Partido Socialista (PS) face às circunstâncias que o país enfrenta no momento.
“Quer à direita do PS, quer à esquerda, nesse aspeto a opinião é unânime. O PS e o primeiro-ministro vivem noutra realidade. Quando o doutor António Costa vem erguer esse 'papão da Direita' e puxa por essa palavra, significa que está mesmo nervoso e que está com medo daquilo que lhe está a acontecer, da falta de confiança que os portugueses hoje sentem no Governo”, apontou.
Montenegro lançou ainda que António Costa deixou uma coisa por dizer na sua reação ao discurso de Cavaco Silva, nomeadamente onde é que o antigo chefe de Estado errou.
“Onde é que o professor Cavaco Silva errou no diagnóstico que fez de Portugal? Veio com frases feitas, é verdade, treinado, é verdade, como aliás os seus dirigentes do PS já tinham feito nos últimos dias, mas não disse ao país que era mentira que hoje as pessoas não suportam grande parte das despesas que têm no fim do mês e que são de bens essenciais. Que as pessoas querem ir ao médico, e não têm um médico para as atender. Querem ir a uma urgência e está fechada, ou ficam horas e horas à espera. Pagam impostos em tudo, é uma asfixia fiscal por todo o lado. Na escola, temos professores desmotivados e alunos sem professores. Na Justiça, por aquilo que se vai sabendo, grandes casos de investigações de anos parece que correm o risco de prescrever. Este é o país real. E era sobre isto que o doutor António Costa deveria falar e explicar o que é que está a fazer para inverter esta situação”, elencou.
Para o líder do PSD, as críticas do PS não passam de “frases feitas que foram soadas ao ouvido dos dirigentes do PS para tentarem desviar a atenção – carregam nas palavras para fugir ao conteúdo”.
E salientou: “Aquilo que se pede ao partido que suporta o Governo, aquilo que se pede ao primeiro-ministro, é que responda ao conteúdo das nossas intervenções e, neste caso concreto, não é uma pessoa qualquer, é alguém que foi 10 anos primeiro-ministro, 10 anos Presidente da República, e não é alguém que esteja na refrega política do dia a dia. Intervém no espaço público muito poucas vezes, o que devia ser um sinal para que o PS e o primeiro-ministro ouvissem com mais atenção.”
“Estamos numa fase em que o PS e o primeiro-ministro denotam grande nervosismo político, um estado de negação que é preocupante”, rematou Montenegro.
De notar que em causa estão as duras críticas do antigo chefe de Estado ao Governo de António Costa, tendo mesmo convidado o primeiro-ministro a apresentar a sua demissão.
O chefe do Governo já reagiu, esta segunda-feira, tendo acusado o antecessor de Marcelo Rebelo de Sousa “de querer criar o mais rapidamente possível uma crise política artificial, de forma a não dar tempo a que os portugueses sintam, como têm direito a sentir, os benefícios da recuperação económica”.
O Presidente da República, por seu turno, escusou-se a comentar a polémica, mas deu a entender que não ignorou a análise do antecessor, citando a escritora Sophia de Mello Breyner para o efeito, tal como proferiu Cavaco Silva no seu discurso: "Vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar."
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