No âmbito da cerimónia comemorativa do 5 de Outubro, na Praça do Município, em Lisboa, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa fez o seu discurso aludindo à mudança das instituições internacionais e portuguesas: "Ou mudam a bem ou mudarão a mal", ou seja, "tarde e atabalhoadamente".
O chefe de Estado evocou ainda "a guerra global feita de muitas outras guerras" e alertou para os tantos que insistem "em não ver que a balança de poderes do mundo está em mudança".
Na análise do Presidente da República isto poderá acontecer se houver atrasos com o clima, a energia, a inteligência artificial ou em relação ao "peso das comunidades" como as Nações Unidas, União Europeia, CPLP, NATO ou mundo ibero-americano.
"Tudo isso poderá suceder com a incapacidade ou a lentidão do superar da pobreza e das desigualdades sociais, ou no reconhecimento do papel da mulher, ou do papel das minorias migrantes e em particular dos jovens", alertou.
Num discurso com 11 minutos de duração, Marcelo Rebelo de Sousa começou com uma reflexão de "como eram diferentes o mundo, a Europa e Portugal há 100 anos", quando tinham passado apenas 13 sobre a proclamação da República, numa altura em que "o tempo parecia lento, especialmente nos espaços rurais" e "o dia a dia era a agricultura, salvo em centros industriais escassos".
O discurso de Marcelo Rebelo de Sousa foi maioritariamente elogiado pelos representantes dos partidos, que consideraram uma "reflexão interessante", "mobilizador", com uma "excelente contextualização histórica", contudo, houve quem achasse que o Presidente da República mostrou "algum desfasamento face à realidade" uma vez que o problema da habitação ficou de fora da sua exposição.
"Reflexão interessante", discurso "mobilizador" ou "desfasamento"? As reações - da esquerda à direita
O primeiro-ministro António Costa considerou que o discurso foi uma "reflexão interessante" do chefe de Estado para alertar que "é preciso antecipar as questões para tomar boas decisões".
"O discurso do senhor Presidente da República foi uma reflexão particularmente interessante para aquele alerta que todos temos que estar, que é preciso antecipar as questões para tomar as boas decisões", considerou Costa.
No parecer do líder parlamentar do Partido Socialista (PS), Marcelo salientou que Portugal "tem sido um ator muito relevante no quadro internacional", assim como focou questões pertinentes como as alterações climáticas e os jovens.
"Pareceu-me uma intervenção muito orientada para o futuro, para os problemas que temos que resolver, mas muito para o futuro, falando de desafios que estão muito no quadro, não só das preocupações, mas das políticas do PS", salientou Eurico Brilhante Dias.
Por sua vez, o secretário-geral do Partido Social Democrata (PSD) considerou que o chefe de Estado fez "uma intervenção muito colada ao país real", ao país dos "portugueses em concreto, das dificuldades dos professores, dos médicos, das forças de segurança, dos oficiais de Justiça, dos enfermeiros, daqueles que pagam demasiados impostos e têm pouco rendimento".
"Creio que a grande mensagem da intervenção do senhor Presidente da República que aqui saudava, foi a descolagem que ele identifica entre o país real e o país, como ele dizia, oficial", considerou Hugo Soares.
O líder da Iniciativa Liberal (IL) também concordou com as palavras proferidas por Marcelo, contudo, considerou-as "uma mensagem clara para o primeiro-ministro".
"O primeiro-ministro converteu-se nestes oito anos numa espécie de residente não habitual, anda por cá, mas não sabe exatamente o que se passa no país", disse aos jornalistas Rui Rocha.
"Mobilizador". Foi assim que o presidente do Chega descreveu discurso do Presidente da República, congratulando-se ainda com o anúncio do presidente da Câmara de Lisboa sobre a celebração do 25 de Novembro.
"Deixou um discurso mobilizador no qual nos revemos. Acho que é uma análise histórica bastante interessante. Conseguiu deixar a mensagem [de que] ou mudamos a bem e agora nas grandes questões da segurança, migrações, clima, jovens ou essas mudanças acontecerão contra a nós e a mal", disse André Ventura, salientando que foi "consensual no apelo à mudança" e "deu um recado a António Costa" ao deixar claro que "nas entrelinhas da história" que o primeiro-ministro "muda agora ou a mudança acontecerá contra si e a democracia".
Também o deputado único do Livre destacou a excelente contextualização histórica" dos perigos que a democracia enfrenta" no discurso do Presidente da República.
"O Presidente da República fez um discurso em que fez uma excelente contextualização histórica daquilo que são as debilidades de uma democracia quando deixa que populistas, nacionalistas, autoritários se aproveitem das regras do jogo para subverter o próprio jogo, ou seja, para acabar com a democracia. Isso é uma lição da história que não tem tanto tempo quanto isso, e com a qual devemos estar muito atentos", referiu Rui Tavares, em declarações à RTP.
Por outro lado, o Bloco de Esquerda (BE) criticou o discurso de Marcelo por ter deixado de fora o problema da habitação, mostrando "algum desfasamento face à realidade".
"Estamos a repetir os mesmos erros, na questão da habitação em particular, que ao ser negado esse direito, está a empurrar muitas pessoas para fora do país. Nós temos o problema a ser repetido e não haver uma palavra do Presidente da República sobre a habitação, algo que fez com que centenas de milhares de pessoas saíssem à rua por todo o país no último fim de semana, mostra algum desfasamento face à realidade", criticou Pedro Filipe Soares, salientando a "falha na apresentação de soluções" e falta de foco num dos "grandes problemas na fixação dos jovens que é a habitação".
Na opinião do Partido Comunista Português (PCP), "a questão da mudança que foi colocada pelo próprio Presidente da República exige opções políticas concretas" para dar resposta a problemas em áreas como a saúde, educação ou habitação.
"Registamos no discurso do senhor Presidente da República uma consideração genérica relativamente aos problemas mais gerais, quer do ponto de vista nacional, quer do ponto de vista internacional. Mas a questão da mudança que foi colocada pelo próprio Presidente da República, isso exige opções políticas concretas para dar resposta às questões mais prementes com as quais estamos confrontados neste momento no nosso país", ressaltou Paula Santos.
De recordar que se comemoraram, esta quinta-feira, os 113 anos desde a Implantação da República, a 5 de Outubro de 1910.
Nos Paços do Concelho, em Lisboa, o local onde aconteceu o marco histórico, estiveram, além de Marcelo Rebelo de Sousa, o primeiro-ministro, António Costa, o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva e o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas.
O autarca de Lisboa surpreendeu com o anúncio de que a Câmara Municipal de Lisboa vai organizar um evento comemorativo do 25 de Novembro de 1975.
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