Em dia de apresentação da proposta de Orçamento do Estado para 2025 (OE2025), o presidente do Chega, André Ventura, conseguiu que o único assunto em discussão não fosse o documento e acabou a espoletar uma controvérsia, que levou grande parte do Governo, incluindo o primeiro-ministro, Luís Montenegro, a reagir.
A troca de acusações desta quinta-feira começou depois de André Ventura, numa entrevista à TVI/CNN Portugal, afirmar que o primeiro-ministro lhe propôs em privado um acordo com vista à aprovação do OE2025, que admitia que pudesse integrar o Governo.
"O primeiro-ministro mentiu", acusou o líder do Chega, referindo que, na terça-feira, Luís Montenegro "disse que o Chega não era um parceiro confiável, que ele nunca contou com o Chega e que o Chega foi arredado das negociações".
De acordo com André Ventura, "isto é falso, o primeiro-ministro negociou com o Chega, quis negociar com o Chega" e propôs "um acordo para este ano", admitindo "que mais para a frente o Chega viesse a integrar o Governo".
O presidente do Chega disse que esta proposta lhe foi apresentada no encontro que os dois tiveram em 23 de setembro. "Mas já tínhamos falado disso também, antes do verão", indicou, referindo que recusou esta proposta porque só aceitaria um acordo para a legislatura.
Ventura disse reconhecer a "gravidade" das suas afirmações, mas disse estar "farto" que o seu partido seja "espezinhado". "Eu entrei de boa fé em conversações e o primeiro-ministro optou por outra coisa: esconder o Chega, dizer que com o Chega 'nunca na vida', mas ficar à espera da viabilização do Chega", acrescentou.
"Nunca o Governo propôs acordo ao Chega. É simplesmente mentira"
A resposta não tardou. Na rede social X (antigo Twitter), o primeiro-ministro apressou-se a desmentir André Ventura.
Nunca o Governo propôs um acordo ao Chega.
— Luís Montenegro (@LMontenegropm) October 10, 2024
O que acaba de ser dito pelo Presidente desse partido é simplesmente MENTIRA.
É grave mas não passa de Mentira e Desespero.
"Nunca o Governo propôs um acordo ao Chega. O que acaba de ser dito pelo presidente desse partido é simplesmente MENTIRA. É grave mas não passa de Mentira e Desespero", atirou o chefe do Executivo, que foi o primeiro membro do Governo a comentar as declarações do líder do Chega.
"André Ventura não é credível"
Além de Montenegro, vários ministros decidiram pronunciar-se. Os governantes saíram em defesa do primeiro-ministro, colocando em causa a "credibilidade" de Ventura.
O ministro da Presidência, António Leitão Amaro, defendeu que "André Ventura não é credível" e aquilo que "diz não pode ser tomado a sério". "O que ele disse hoje é um sinal de quem não tem nada para dizer. Já disse tudo e o seu contrário", disse o governante, em declarações à estação Now, acrescentando que "não tem fundamento nenhum".
E reforçou: "O que diz André Ventura tem credibilidade zero. Disse isso e amanhã ou depois está a dizer outra coisa completamente diferente".
Já o ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, descreveu como "inqualificáveis" a "postura e a atitude" de André Ventura e negou que o Governo tenha feito qualquer acordo com o partido de extrema-direita.
"A resposta é muito simples, é categoricamente 'não'. Confesso que tenho até alguma dificuldade em comentar e muito mais em qualificar a postura e a atitude do líder do Chega. São de facto inqualificáveis", afirmou o ministro, quando questionado sobre a veracidade das declarações de André Ventura, em entrevista à SIC Notícias.
O ministro disse ser necessário fazer um "esforço para desvalorizar e não dar a relevância" que André Ventura "pretende". "A falta de credibilidade absoluta por parte de André Ventura e do seu partido mostra que seria perigoso - muito perigoso - para o país se tivessem capacidade de influenciar, de alguma maneira, o destino do país", atirou.
O ministro da Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida, também se pronunciou e lembrou que "o primeiro-ministro já desmentiu o líder do Chega". "O país sabe quanto vale a palavra do primeiro-ministro e quanto vale a palavra do líder do Chega" porque "o país sabe muito bem em quem confiar", defendeu.
"Não sei se vale a pena discutir o que acabou de dizer André Ventura porque o melhor é esperar pelo que ele vai dizer amanhã. O normal é desdizer no dia seguinte o que disse no dia anterior. Não é para levar a sério", ironizou, em entrevista à CNN Portugal.
"Boa sorte a tentar enganar o PS"
Nas redes sociais, já depois do desmentido de Montenegro, André Ventura voltou à carga, dirigindo-se diretamente ao primeiro-ministro.
"Sr. Primeiro-Ministro, mentiu no passado e voltou a mentir hoje. É tempo de dizer a verdade aos portugueses! E sabe bem qual é a verdade! Boa sorte a tentar enganar o PS", atirou o presidente do Chega.
É ainda de realçar que, na entrevista de ontem, André Ventura lembrou o apelo que fez ao primeiro-ministro ao início da tarde, através de uma declaração aos jornalistas e numa carta, para que o Governo apresente uma nova proposta de Orçamento do Estado para o próximo ano. Se tal não acontecer e for votada na generalidade a proposta que ontem foi entregue no Parlamento, o Chega votará contra, reiterou Ventura.
Ventura disse ainda que, se o Orçamento for aprovado na generalidade, o Chega "viabilizará todas as propostas que baixem os impostos", incluindo o IRC.
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