Ilia Iachin, de 39 anos e deputado municipal moscovita na altura em que foi detido, é acusado de ter "divulgado falsas informações" sobre o exército russo com "incitação ao ódio", um crime punível com dez anos de prisão.
O ministério público acusa-o de ter condenado, numa mensagem em direto na plataforma digital YouTube, "o assassínio de civis" na cidade ucraniana de Bucha, perto de Kiev, onde o exército russo foi acusado de cometer atrocidades, o que Moscovo nega.
Na audiência, Iachin exigiu ser libertado enquanto decorrer o seu julgamento, argumentando não ter qualquer intenção de fugir à justiça saindo do país.
"Se eu quisesse fugir, tê-lo-ia feito há muito tempo", afirmou, a partir do compartimento envidraçado reservado aos arguidos, acrescentando: "Amo o meu país e estou disposto a sacrificar a minha liberdade para viver aqui (...) Sou um patriota russo".
Iachin compareceu na audiência bem-humorado, dirigindo-se ao tribunal num tom brincalhão e chegando mesmo a obter alguns sorrisos dos austeros magistrados russos.
Perante o procurador do ministério público que pedia a extensão da sua prisão preventiva por mais seis meses, uma das advogadas do opositor russo, Maria Eismont, assegurou que o seu cliente não tem qualquer intenção de "se esconder".
A advogada de defesa sublinhou igualmente que Iachin se tinha deslocado à Turquia antes de ser detido, em junho, e que tinha regressado à Rússia de livre vontade, apesar de conhecer os riscos que corria.
Ilia Iachin é um dos últimos opositores com visibilidade pública ao Presidente russo, Vladimir Putin, a não ter abandonado a Rússia perante a repressão, que levou muitos críticos do Kremlin a preferir o exílio à prisão.
Depois de detido, em junho, foi-lhe aplicada a medida de coação de prisão preventiva em julho, o que não o impediu de continuar a criticar duramente as autoridades e a condenar a intervenção militar russa na Ucrânia.
No início de novembro, acusou os juízes russos de "estarem ao serviço" do poder e de darem a Putin um "sentimento de impunidade", afirmando: "Esse sentimento acabou por levar o nosso país a uma guerra sangrenta e a dezenas de milhares de vítimas".
Iachin foi processado com base em artigos do Código Penal introduzidos pouco depois do início da guerra na Ucrânia, a 24 de fevereiro deste ano, e que punem aqueles que "descredibilizam" o exército ou sobre ele "publicam informações falsas".
Essa legislação é vaga e o seu âmbito de aplicação muito amplo, nela vendo os críticos do Kremlin um instrumento "multiusos" para perseguir judicialmente todas as vozes críticas da "operação militar especial" na Ucrânia.
"Esta lei [sobre as informações falsas] é absolutamente ilegal", condenou Anastasia Léonova, de 48 anos, que foi ao tribunal com a filha para apoiar o opositor, acusando as autoridades de quererem "remeter as pessoas ao silêncio".
"Reuníamo-nos todas as quintas-feiras na cozinha para assistir aos discursos de Iachin. Eu, a minha mãe e a minha avó de 87 anos", prosseguiu a filha de Anastasia, Olga Léonova, de 20 anos.
"A única forma que temos de o ajudar e apoiar é vir ao tribunal", acrescentou.
Iachin pertencia ao círculo próximo do opositor Boris Nemtsov, assassinado em 2015, mas também ao do ativista anticorrupção Alexeï Navalny, na prisão desde o início de 2021, depois de ter sobrevivido a um envenenamento que comprovou ter sido ordenado pelo Kremlin.
O julgamento que se iniciou hoje é um dos muitos casos judiciais contra políticos da oposição ou simples cidadãos que criticaram a guerra russa na Ucrânia.
Em julho, um deputado municipal da oposição de Moscovo, Alexeï Gorinov, foi julgado por divulgar "informações falsas" sobre o exército russo, depois de ter criticado o conflito na Ucrânia, e condenado a sete anos de prisão.
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