António Costa e Jerónimo de Sousa sentaram-se à 'mesa', esta segunda-feira, para 'esgrimir' forças com vista às eleições legislativas. Na antena da SIC, os líder partidários protagonizaram uma conversa em que os momentos de tensão foram escassos.
No 'aquecer dos motores', o debate centrou-se na relação do Partido Socialista e do Partido Comunista durante os quatro anos de Geringonça. Com efeito, Costa foi perentório ao rejeitar a ideia de que tenha sido mais fácil trabalhar com o PCP do que com os restantes membros da solução governativa. Já Jerónimo de Sousa negou que o PCP tenha saído fragilizado por ter feito parte da Geringonça.
Questionado relativamente à possibilidade de reedição da Geringonça, o primeiro-ministro 'chutou' a questão, preferindo responder que as soluções serão avaliadas "em função dos resultados eleitorais".
O tema central do debate radicou nas leis laborais, com Costa e Jerónimo a assumirem posições distintas. Para o líder socialista, a nova lei laboral traduz o combate à precariedade. Mas não é esse o entendimento do comunista.
Já quanto à possibilidade de permanência de Mário Centeno num futuro governo do PS, Costa não respondeu de forma direta, mas deixou a possibilidade a pairar no ar: "Não é preciso ter grande dotes para perceber que quem tem de formar uma equipa não deixa no banco os melhores jogadores que pode pôr a jogar".
Por sua vez, Jerónimo de Sousa afastou a ideia de deixar o cargo à disposição num futuro próximo, aproveitando ainda para deixar uma mensagem aos "apressados": "Tenham mais serenidade".
Fique com os principais temas que marcaram o debate:
Em que situações foi mais fácil trabalhar com o PCP do que com o Bloco de Esquerda?
António Costa: Nunca disse que foi mais fácil trabalhar com o PCP. Não seria justo fazer comparações. Há de facto divergências insanáveis [com o PCP], mas há quatro anos percebemos que havia condições para fazermos coisas em comum. Tudo o que assinámos foi cumprido. As relações foram sempre bilaterais, tivemos sempre relações de trabalho paralelas.
É um elogio que traz água no bico?
Jerónimo de Sousa: Preferimos valorizar o que se conseguiu, num quadro exigente. Houve uma contribuição para aquisição de direitos que muitos julgavam perdidos. Conseguimos coisas que valorizamos muito, como os passes sociais. Passados quatro anos, manteria a mesma seriedade no relacionamento [com António Costa].
Em função dos resultados eleitorais, veremos quais as soluções que existem
Se em 'equipa que nunca não se mexe', porque não admite que a solução governativa é para manter?
António Costa: Em função dos resultados eleitorais, veremos quais as soluções que existem. O PS tem sido o único partido que tem assumido o resultado desta governação. Veja que o PCP assume uma parte, mas sublinha as limitações. Nós orgulhamo-nos de dizer que cumprimos tudo o que assumimos e provámos que estes compromissos não eram incompatíveis.
O PCP não perdeu com a Geringonça
Sente que o PCP perdeu com a Geringonça?
Jerónimo de Sousa: Os resultados falam por si. E se colocamos a necessidade do reforço da posição da CDU, tem que ver com o que foi alcançado e com o caminho que é preciso traçar. O PCP não perdeu com a Geringonça. É de valorizar o que conseguimos com a nossa proposta, como os manuais escolares. Esta medida foi importantíssima para as famílias.
É por isso que o PCP tem agitado a bandeira alertando para a maioria absoluta do PS?
Jerónimo de Sousa: Sempre que houve dificuldade em matéria de direitos laborais, a opção era encostar ao PSD ou ao CDS para fazer aprovar a legislação. É um exemplo do perigo de andar para trás.
PS diz que há menos precariedade, PCP tem visão diferente.
António Costa: Um dos desafios do país é demográfico e a resposta passa por devolver aos jovens a confiança no futuro e para isso é fundamental combater os fatores de precariedade, como a habitação. Definimos também o combate à precariedade no mercado de trabalho.
São sempre os salários a pagar as crises
PCP tem leitura diferente da lei laboral?
Jerónimo de Sousa: Não é por acaso que os patrões estão de acordo com a alteração à lei laboral. O Presidente da República promulgou esta lei com uma nota. Se existirem crises, quem vai pagar é quem trabalha. São sempre os salários a pagar as crises. A questão dos salários e dos direitos continua a ser central na vida das pessoas.
É uma fortíssima medida contra a precariedade
António Costa: A questão dos contratos a prazo poderia durar até seis anos, agora é de seis meses num quadro de contrato definitivo. Verificado esse período, fica o contrato para a vida. É uma fortíssima medida contra a precariedade. Esta é a primeira legislação que, aprovada no mundo do trabalho desde 1976, em vez de comprimir, alagar os direitos. Não podem dizer que é um retrocesso, é um avanço. Esta legislação resultado de um acordo em concertação.
Previsão da resposta do Tribunal Constitucional?
António Costa: A nossa convição é de que é constitucional.
O PCP sempre considerou o PS um partido que aplicava políticas de Direita. Aprovou Orçamentos do Estado (OE). O PCP não é responsável pela política dos últimos quatro anos?
Jerónimo de Sousa: Em relação aos OE havia disponibilidade para exame comum. Foram incluídas nesses orçamentos centenas de propostas do PCP. Recuso-me a aceitar responsabilidade em matérias com as quais discordo.
Quanto à negociação do salário mínimo, agora passou para a concertação social. O que mudou?
António Costa: Com o PCP nunca houve acordo para o salário mínimo. Em 2015 era possível fixar qual a meta de recuperação porque tínhamos tido anos de congelação. Com o BE foi definido um calendário que foi aceite pela concertação. Agora houve um aumento de 20% do salário e estamos em condições de nos sentarmos à mesa. Com a subida do salário, estamos próximos do mediano. Temos de fazer um esforço conjunto e negociar com os parceiros sociais para que haja recuperação significativa dos rendimentos. É fundamental que os salários tenham progressão e a negociação deve ser mais global.
Jerónimo de Sousa: Uma das medidas que tomámos foi a valorização dos salários do público e do privado e o reforço do salário mínimo nacional. Temos a consciência que não basta a proposta do PCP. Os 850 euros foram apresentados num quadro de negociação e de evolução, onde os trabalhadores e a sua luta vão ter um papel determinante. É um erro propor um aumento de 12 ou 13 euros. Isto não é negociação nenhuma.
O PCP estaria disponível para aprovar OE mais restritivos?
Jerónimo de Sousa: É um exercício difícil. É perante conteúdos concretos que decidíramos. Quero manifestar que se alguém pensa que vamos voltar para trás com congelamento de salários ou seguir um caminho de voltar para trás em matérias de direitos, se isto estiver refletido nas propostas de lei ou de OE, não terão alimento por parte do PCP.
Os convites para o Governo farei quando tiver legitimidade para os fazer. Não é preciso ter grande dotes para perceber que quem tem de formar uma equipa não deixa no banco os melhores jogadores
Olhando para o futuro, Mário Centeno é o rosto das metas mas também da asfixia de serviços públicos. Se ganhar as eleições, convida-o para ser ministro?
António Costa: Importa saber se serei o primeiro-ministro. Centeno é candidato a deputado e está comprometido com a atividade política. Todos fazemos apreciação positiva do trabalho que desenvolveu. Os convites para o Governo farei quando tiver legitimidade para os fazer. Não é preciso ter grande dotes para perceber que quem tem de formar uma equipa não deixa no banco os melhores jogadores que pode pôr a jogar.
A questão do secretário-geral não está posta. Os apressados que tenham mais serenidade
Chegado aos 72 anos, 15 no PCP, com o partido em queda. Jerónimo é parte do problema ou da solução?
Jerónimo de Sousa: A opinião é refletida sobre o que ouço, a questão do secretário-geral não está posta. Os apressados que tenham mais serenidade. Vou fazer esta campanha com toda a disponibilidade, determinação e força para conseguir este grande objetivo da CDU. Há quem afunile a vida para as eleições, mas se reduzisse a minha atividade a pensar no resultado das eleições, estaria aqui a mais.
É parte da solução?
Jerónimo de Sousa: É o que acham os meus camaradas. A minha [opinião] logo a direi.