A proposta de lei do Governo que reforça as penalizações para os maquinistas ferroviários e estabelece a proibição de desempenhar funções sob influência de álcool, estupefacientes ou substâncias psicotrópicas foi aprovada na generalidade, com os votos contra do BE e do PCP e a abstenção da IL e do PAN.
O documento baixa à especialidade, ou seja, será agora trabalhado com maior pormenor na comissão parlamentar de Economia, Obras Públicas e Habitação.
"Com esta proposta de lei simplificamos, unificamos e atualizamos os mecanismos de segurança do transporte ferroviário, reforçando o respeito e a confiança nos profissionais do setor ferroviário em Portugal, a quem endereço os meus cumprimentos, pois acreditamos que são um dos principais interessados", afirmou a secretária de Estado da Mobilidade, Cristina Dias, durante o debate que precedeu a votação.
A governante salientou que o teor máximo de álcool permitido de 0,2 gramas por litro de sangue é já aplicado nos regulamentos internos de vários operadores ferroviários, como por exemplo a CP -- Comboios de Portugal.
Da parte do PS, o deputado José Carlos Barbosa acusou o Governo de ter estabelecido um nexo de causalidade "erróneo" e "ofensivo" ao "associar inequivocamente" o mau desempenho de Portugal nos 'rankings' de segurança ferroviária e a taxa de álcool dos maquinistas.
Falando num "ataque sem precedente aos maquinistas" que "devia ter resultado num pedido de desculpas imediato", o socialista realçou que "este erro de comunicação do Governo" levou a uma greve que teve custos para o país de, segundo os seus cálculos, mais de 500.000 euros em receitas de bilheteiras só no Metro do Porto e na CP, além dos impactos nas empresas de mercadorias e na mobilidade dos cidadãos.
Já o deputado Paulo Cavaleiro, do PSD, disse que o Governo está "a fazer aquilo que não foi feito" e Paulo Núncio, do CDS-PP, perguntou "o que andou o PS a fazer entre 2016 e o ano passado, para não ter transposto esta diretiva".
"O PS andou a reabrir linhas que vocês fecharam, a reabrir oficinas que vocês fecharam, reabriu o processo de alta velocidade que vocês pararam, lançou a compra de novos comboios que vocês pararam", respondeu José Carlos Barbosa.
Nos pedidos de esclarecimento ao Governo, aos quais o executivo não respondeu, apesar de dispor de tempo, o deputado António Filipe, do PCP, quis saber se o Governo tencionava pedir desculpa aos maquinistas pela forma como o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, "os insultou" quando apresentou esta proposta aprovada em Conselho de Ministros, em novembro, por ter feito uma "associação entre consumo de álcool e acidentes ferroviários, quando na verdade não há um único caso de acidente ferroviário que tenha sido motivado por álcool dos maquinistas".
Da parte do Chega, a deputada Luísa Areosa perguntou ao Governo se "em Portugal existem casos que justifiquem este agravamento [das penalizações] ou são apenas diretivas externas" impostas pela União Europeia, enquanto o deputado Raul Melo quis saber se o ministro da Presidência "ainda considera que os maquinistas são alcoólicos", classificando as suas declarações de "infelizes".
Pelo Bloco de Esquerda (BE), o deputado José Soeiro criticou o facto de o Governo se ter esquecido de incluir no diploma a audição dos sindicatos que representam os trabalhadores, bem como o "contexto e o modo como a proposta foi anunciada".
"Segurança ferroviária, sim senhor, dos maquinistas, com certeza que sim, transposição da diretiva, não vemos objeção, agora culpabilizar trabalhadores pelas falhas de investimento público, isso é que não", salientou o deputado bloquista.
Pela Iniciativa Liberal (IL), Albino Ramos considerou "uma desilusão que os grandes feitos deste Governo em matéria de ferrovia seja uma luta contra os maquinistas e um par de decisões que em nada contribuem para a melhoria do serviço".
Já a deputada Isabel Mendes Lopes, do Livre, considerou que "não é a antagonizar os maquinistas" que se melhora a ferrovia e considerou as declarações do ministro Leitão Amaro "infelizes e irresponsáveis", enquanto da parte do PAN, Inês Sousa Real considerou que se devia estar a "debater como está atrasada a modernização da ferrovia" e a concretizar a Estratégia Nacional de Prevenção do Suicídio Ferroviário, aprovada em 2023.
Na sua intervenção de encerramento do debate, a secretária de Estado da Mobilidade reiterou a "total confiança" nos profissionais ferroviários e vincou: "o Governo não fez, não faz, não pode fazer nenhuma relação de causalidade entre sinistralidade e qualquer outra razão que não aquela que vem nos relatórios".
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