A tragédia assolou as frentes de combates que dividem as áreas rebeldes e da oposição no noroeste da Síria e as que se encontram nas mãos do regime de Bashar al-Assad, os dois principais intervenientes na guerra iniciada em 2011 após as revoltas populares desencadeadas contra Damasco na altura da chamada "Primavera Árabe".
No entanto, refere a agência noticiosa espanhola EFE, mal afetou as áreas controladas pelos curdos no nordeste da Síria, rivais de ambos os lados.
A autoproclamada Administração Autónoma da Síria do Norte e do Leste (curda) enviou dois 'comboios' com ajuda humanitária para áreas controladas por Damasco na província de Alepo, no noroeste, mas ambos ainda estão parados no cruzamento de Al Tayha a aguardar "aprovação para entrar", confirmaram as autoridades locais na rede social Twitter.
O mesmo acontece com outro carregamento destinado às áreas opositoras rebeldes, as mais afetadas pelos terremotos, que está retido há dias num posto improvisado de fronteira.
A assistência humanitária para as áreas rebeldes foi direcionada para a província de Idlib, maioritariamente para Afrin, uma cidade muito afetada pela catástrofe e que a Turquia e respetivas milícias aliadas tomaram aos sírios curdos durante uma ofensiva transfronteiriça lançada em 2018.
Na passada sexta-feira, as Forças Sírias Democráticas (FSD), uma aliança armada liderada pelos curdos e afiliada na Administração Autónoma, acusaram "fações armadas apoiadas pelos turcos" de bloquear a passagem do 'comboio humanitário' "pelo quinto dia consecutivo".
"Negar o acesso à ajuda a quem precisa é considerado pelo direito internacional como um crime contra a humanidade", denunciaram as FSD em comunicado.
Ancara considera o principal componente das FSD, as Unidades de Proteção Popular (YPG), que têm sido alvo das principais operações turcas na Síria nos últimos anos, um grupo terrorista, ameaçando-o com uma nova ofensiva há apenas três meses, depois de os responsabilizar por um ataque terrorista em Istambul.
Outra ajuda doada pelos curdos à província de Alepo e que o regime de al-Assad impediu de passar na passagem de Al Tahya não teve muito mais sorte.
"O regime exige obter 50% da ajuda antes de permitir que continue. O 'comboio humanitário' inclui camiões cisterna com combustível e material e equipamento para as equipas de resgate, aléwm de alimentos, material médico-hospitalar oferecido pelo Crescente Vermelho Curdo", disse o diretor do Observatório Sírio de Direitos Humanos, Rami Abderrahman.
Segundo o responsável da ONG, com sede no Reino Unido e com uma vasta rede de colaboradores no terreno, Damasco acabou por deixar passar apenas o combustível, um bem escasso no país, e o carregamento foi encaminhado para zonas nas mãos das forças governamentais sírias.
No sábado à noite, a rede de jornalistas Rojava Information Center (RIC) conversou com membros de um 'comboio humanitário' curdo do Crescente Vermelho, a quem o Governo sírio exigiu que entregasse metade de suprimentos, incluindo uma ambulância, a fim de as afetar às áreas afetadas pelo terremoto.
Por sua vez, o governo sírio anunciou que está disposto a levar ajuda a áreas de oposição, incluindo Idlib, considerado o último reduto rebelde do país árabe e onde vigora um cessar-fogo desde 2020, apenas respeitado pela metade.
Fonte diplomática, que solicitou anonimato, indicou à EFE que está a caminho de Idlib um 'comboio humanitário' enviado diretamente pelo executivo de al-Assad para entrar para doar ajuda a áreas nas mãos dos rebeldes, com quem a entrega foi negociada através da mediação dos Emirados Árabes Unidos (EAU).
O 'comboio humanitário' esteve na noite de quinta-feira em Saraqib, zona reconquistada por Damasco há três anos, à espera de sinal verde para entrar em território rebelde que, até há apenas uma semana, era regularmente alvo da artilharia de Damasco e de bombardeamentos da aliada Rússia.
No entanto, a entrega ainda não ocorreu, presumivelmente devido à rejeição da ajuda por parte de alguns dos grupos que operam na região, a maioria sob a égide da aliança islâmica Organismo de Libertação do Levante (OLL).
É muito possível, sustenta a EFE, que o emaranhado de inimizades sírias também esteja por trás do atraso na chegada da ajuda da ONU à área, acessível apenas diretamente pelo outro lado da fronteira turca ou por áreas sírias em mãos de atores rivais.
As Nações Unidas, que enviaram apenas três 'comboios humanitários' transfronteiriços para a região em quase uma semana de emergência, apresentaram argumentos vagos para o atraso, como os danos causados sismos em estradas que outras fontes confirmaram desde o início estarem transitáveis.
Sábado, a Organização Mundial da Saúde (OMS) indicou que esperava "luz verde" para trazer ajuda das áreas de Damasco, sem especificar de quem deveria vir a aprovação.
O Governo de al-Assad sempre se opôs ao envio diretos de ajuda a partir da Turquia, que faz fronteira com Idlib, e exige que toda a ajuda às regiões de oposição passe pelas suas mãos, posição que Moscovo se encarregou de impor ao Conselho de Segurança da ONU em nome do seu aliado.
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