"O ajuste direto de 184 mil euros que a Polícia Municipal realizou é ilegal, visto que assenta em 'urgência imperiosa'", afirmou a vereadora do BE, Beatriz Gomes Dias, considerando que a justificação deste contrato é "ilegítima", uma vez que a situação das pessoas que dormiam em tendas junto à Igreja dos Anjos já era conhecida há vários meses.
Em causa está a operação de realojamento de 55 cidadãos imigrantes em situação de sem-abrigo que pernoitavam junto à Igreja dos Anjos, em Arroios, que foi realizada em 04 de outubro, com o recurso a pensões e 'hostels' da cidade.
O anúncio desse realojamento foi feito pelo presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Carlos Moedas (PSD), no seu discurso durante a cerimónia evocativa do 05 de Outubro de 1910 - Implantação da República.
A agência Lusa questionou a CML sobre esse contrato por ajuste direto efetuado pela Polícia Municipal de Lisboa, mas aguarda ainda uma resposta.
De acordo com a vereação do BE, a ação de retirada das pessoas em situação de sem-abrigo foi realizada pela Polícia Municipal "sem qualquer acompanhamento social por parte da equipa que tem essa competência".
Em outubro, a liderança PSD/CDS-PP afirmou que esta operação envolveu o apoio de várias entidades, nomeadamente a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, a Segurança Social, a Junta de Freguesia de Arroios, a Polícia de Segurança Pública (PSP) e a Comunidade Vida e Paz.
Além de questionar ter sido a Polícia Municipal a dirigir a operação, por ser "um serviço não competente para a matéria", o BE considera que foram utilizados "meios de questionável legitimidade", em particular o contrato por ajuste direto, ou seja, sem concurso público.
Segundo a vereadora do BE, a Polícia Municipal efetuou um ajuste direto para a "aquisição de serviços de alojamento em função de urgência imperiosa e salvaguarda do interesse público", no valor de 184.356 euros, contrato que foi exarado em 14 de novembro, mais de um mês após a operação, e registado em 12 de dezembro, vigorando até 03 de abril.
"A aquisição de serviços em função de urgência imperiosa é dos instrumentos mais restritivos e só deveria ser utilizada para situações inesperadas e em que as respostas não são possíveis de ser planeadas", apontou o BE, reforçando que as pessoas em situação de extrema vulnerabilidade pernoitavam na zona dos Anjos "há meses" e, por isso, "seria possível precaver o seu acolhimento de outra forma".
Beatriz Gomes Dias disse ainda que a resposta encontrada deveria ter sido de caráter mais estrutural e frisou que "não existe qualquer fundamento jurídico para o recurso ao ajuste direto por urgência imperiosa", acusando Carlos Moedas de "instrumentalizar" as pessoas em situação de sem-abrigo para a "ação de propaganda" na cerimónia do 05 de Outubro.
O BE lembrou ainda que, antes desta operação, o presidente da CML defendeu a criação de centro de acolhimento para apoiar as pessoas em situação de sem-abrigo na zona dos Anjos, concluindo que "afinal apenas as colocou em 'hostels' no centro de Lisboa".
Em novembro, por proposta do BE, a CML aprovou a criação de uma resposta de acolhimento integrada para as pessoas em situação de sem-abrigo que pernoitavam junto à Igreja dos Anjos, assegurando cuidados básicos como higiene, alimentação, saúde e apoio na regularização.
Essa proposta foi viabilizada com os votos contra da liderança de PSD/CDS-PP (que governa sem maioria absoluta) e os votos a favor dos restantes, nomeadamente PS, Cidadãos Por Lisboa (eleitos pela coligação PS/Livre), PCP, Livre e BE.
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