Numa audiência a representantes da Associação dos Espoliados de Angola e da Associação dos Espoliados de Moçambique, que decorreu na Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, todos os partidos presentes -- PCP esteve ausente e a deputada do Bloco de Es querda Marisa Matias chegou apenas no final -- manifestaram vontade de resolver a situação.
"A colonização não foi perfeita, a descolonização não foi perfeita", disse o deputado do PSD Bruno Ventura, que recordou a intenção do Governo, expressa no Orçamento do Estado para 2025, de constituir um grupo de trabalho durante este ano para resolver os pedidos de indemnização, os seus valores e o modo como serão atribuídos.
E garantiu: "Tudo faremos para que a justiça seja feita".
Tal como o deputado Rodrigo Saraiva (Iniciativa Liberal), para quem deverá ser possível, em breve, "cumprir o desejo" dos espoliados, que é serem ressarcidos do valor de alguns dos bens que perderam nas ex-colónias portuguesas, após o 25 de Abril de 1974.
Diogo Pacheco de Amorim (Chega) começou por afirmar que "o processo dito de descolonização foi uma vergonha, tal como este processo tem sido tratado ao longo dos tempos".
"Tudo faremos para que o Estado, neste caso específico, seja uma pessoa de bem", disse.
Paulo Pisco (PS) considerou que este é um assunto que não deve cair.
"A colonização não foi perfeita, a descolonização não foi perfeita. É fácil olhar para trás e ajuizar o que foi feito há 30/40 anos", observou.
Firmino Fonseca, da Associação dos Espoliados de Moçambique, evocou as várias Constituições portuguesas para concluir que o direito à propriedade e de indemnização estão consagrados.
E referiu que muitos dos processos com o levantamento de bens perdidos, com vista a pedidos de indemnização, não estão em condições de serem avaliados, pois não apresentavam bens com valores passíveis de compensação, como as galinhas que alguns portugueses lá deixaram.
Por esta razão, adiantou Firmino Fonseca, dos cerca de 60.000 pedidos que deram entrada, apenas entre 5.000 ou 6.000 poderão ser objeto de avaliação.
Estes pedidos estão à guarda do instituto Camões desde 2012, no Arquivo dos Espoliados dos Antigos Territórios Ultramarinos, que integra pedidos de indemnização ao Estado dos bens e valores deixados naqueles países pelos cidadãos portugueses, entre outros documentos.
Em 1982, o Camões identificou cerca de 46.000 requerimentos relativos a Angola, Moçambique e Guiné.
Segundo Elisabete Oliveira, da direção da Associação dos Espoliados de Angola (AEANG), este arquivo à guarda do Camões é "o espelho concreto" da realidade dos espoliados do ex-ultramar português.
Esta espoliada, que viu o pai perder todos os seus bens em Angola, disse que já foi ao Camões fazer a habilitação de herdeiros, para poder continuar esta luta, e que já deu indicações aos filhos para prosseguirem a mesma, se a situação não se resolver enquanto for viva.
A presidente da Associação dos Espoliados de Moçambique, Maria Clara Norton Brandão, reiterou o seu pedido de ajuda e de justiça -- que já a levou ao parlamento várias vezes --, afirmando que "há pessoas que estão a passar muitas necessidades devido a esta situação".
"É vergonhoso e inaceitável o Estado ter esta situação e não a resolver", acusou.
Após o 25 de Abril de 1974 e a independência das ex-colónias portuguesas em África, vieram para Portugal 463.315 cidadãos portugueses, segundo o último recenseamento dos desalojados, realizado em 1977, número atualizado para 471.427, de acordo com o Censos de 1981.
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