Este foi um dos pontos de divergência entre os líderes do Bloco de Esquerda e do Livre, num debate transmitido pela SIC Notícias que decorreu num tom cordial e terminou com o salientar de vários pontos em comum, como a necessidade de impor leques salariais nas empresas e o desejo de eleger mais deputados à esquerda.
Contudo, o frente-a-frente arrancou com Rui Tavares a vincar que o Livre tem uma forte "convicção europeísta" e que o atual plano internacional demonstra a importância da União Europeia, numa tentativa de marcar diferenças entre os dois partidos.
Mariana Mortágua contrapôs logo de seguida que o BE "sempre se assumiu como um partido europeísta de esquerda" mas que não deixa de criticar posições da Comissão Europeia.
"Gostar da Europa é poder criticá-la quando ela joga contra si própria. Esse espírito crítico é importante", argumentou.
Na resposta, Rui Tavares -- que foi eurodeputado independente eleito pelo BE entre 2009 e 2011, e abandonou o cargo em desacordo com o então líder, Francisco Louçã, - lembrou uma frase de um dos fundadores bloquistas e atual cabeça-de-lista por Leiria, Fernando Rosas, em 2016.
"Acho que é preciso ser consequente em relação à Europa. E aí há debates que são intensos e em que temos, se for preciso, as cicatrizes para mostrar, de ter tido a coragem de assumir determinadas posições. Quando foi o referendo do 'Brexit' lembro-me de ouvir o Fernando Rosas a dizer que não se devia chorar uma lágrima pelo fim da União Europeia. É uma diferença histórica grande", atirou.
Tavares continuou, argumentando que o Livre "nunca defendeu a saída do Euro" e que Francisco Louçã, outro fundador bloquista e cabeça de lista nestas eleições por Braga, "escreveu um livro", lançado em 2014, intitulado "Solução -- Novo Escudo. O que Fazer no Dia Seguinte à Saída de Portugal do Euro".
A coordenadora do BE contra argumentou que o partido "nunca propôs a saída do Euro" e que "chorou uma lágrima pela União Europeia quando a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu esmagaram a Grécia".
"Qualquer pessoa de esquerda que passou por esse momento de violência, de políticas antidemocráticas, de políticas erradas em que as instituições europeias ultrapassaram os seus poderes e usaram-nos contra as democracias, acho que se não ficámos todos um bocadinho mais vacinados e céticos sobre as instituições europeias, isso diz muito sobre nós", respondeu, criticando as "regras injustas" da Comissão Europeia.
Neste ponto do debate, Mariana Mortágua aproveitou para salientar que o BE rejeita o investimento armamento, afirmando que o Livre é a favor.
"Não me parece que a esquerda possa aceitar que o projeto económico da Europa seja o armamento", considerou.
Rui Tavares afirmou que não quer que a UE pense que "Putin é uma gripezinha, como dizia Bolsonaro da Covid-19", e considerou que a comunidade europeia tem que investir em Defesa sem colocar em causa a transição ecológica e o investimento social, utilizando, por exemplo, a emissão de dívida comum.
"Claro que é uma batalha difícil e é por isso que é preciso não a largar, e preciso fazê-la sempre, sem estados de alma e passar do «contra» ao «como». Também somos do contra quando temos que ser", defendeu.
Mariana Mortágua rejeitou que a UE se "endivide até aos dentes" para investir em armamento e considerou errada "a ideia de que Putin vem num tanque montado e que nos vai entrar pela fronteira espanhola".
O debate terminou num tom mais concordante, com Tavares a defender a imposição de leques salariais que determinem um rácio entre o salário mais baixo e o salário mais alto dentro de uma empresa para acabar com "diferenciais absolutamente obscenos, que criam uma casta à parte de CEO's para quem verdadeiramente nem o céu é o limite".
Mortágua, que se manifestou a favor destes leques salariais, propôs que empresas como a do setor do têxtil, que entrem em falência, passem para as mãos dos trabalhadores, através de apoio estatal.
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