Georgina Deiratani, uma síria cristã de 37 anos, vive em Moscovo desde 2002 e diz à agência France-Presse que ficou "em choque" desde a fuga do Presidente Bashar al-Assad, quando este foi deposto pelos rebeldes.
"Todos me dizem 'Mabrook', parabéns, mas, para mim, é o fim da Síria", disse Deiratani, comentando a atual situação na Síria, de que guarda memórias de harmonia
"Vivíamos todos bem juntos: judeus, cristãos, muçulmanos, todos na mesma rua. Desejei um feliz Ramadão aos meus amigos, deram-me os parabéns pelo Natal", explicou esta síria cristã.
A Rússia, aliada de longa data da família al-Assad, tinha cerca de 7.000 sírios em 2017, incluindo 2.000 que solicitaram o estatuto de refugiado, segundo as autoridades russas, que não divulgaram novos números oficiais desde então.
Para Deiratani, o colapso do regime em poucos dias, no início de dezembro, é ainda mais chocante porque são os islamitas que estão numa posição de força.
Bashar al-Assad fugiu para a Rússia, que desta vez não conseguiu salvar o seu regime, que entrou em colapso após apenas 11 dias de uma ofensiva liderada por uma coligação de rebeldes ligados a um antigo ramo sírio do movimento terrorista Al-Qaeda.
"Um terrorista continua a ser um terrorista, seja qual for a sua organização", argumenta a jovem que diz ter "muito medo" pelos cristãos no seu país de origem.
Segundo Georgina Deiranati, uma igreja cristã, construída pelo seu avô arquiteto, anunciou na semana passada que tinha cancelado o seu serviço religioso semanal, sem explicação, pela primeira vez em anos.
Um outro relato de receio vem de Ali, em engenheiro de 33 anos, originário da região de Latakia, antigo bastião da família Assad, no oeste da Síria, Ali, que vive na capital russa há cerca de dois anos, onde está a terminar um doutoramento.
"Os que estão agora no poder na Síria estão na lista dos terroristas e isto é um grande perigo para as minorias sírias", disse este muçulmano alauita, como Bashar al-Assad.
Esta seita minoritária, um ramo do Islão xiita, ocupava um lugar de destaque na elite que rodeava o Presidente deposto.
Ali não quis revelar o seu apelido, alegando o risco de perseguição contra os seus pais, que permaneceram na Síria.
"Toda a gente tem medo em Latakia. Derrubaram as estátuas do pai de Bashar al-Assad, Hafez, e destruíram o seu túmulo", explica este engenheiro, que cita testemunhos de familiares na Síria, segundo os quais dois estudantes foram mortos "só porque eram alauitas", o ramo do Islão seguido pelo regime do ditador.
Ali, porém, compreende a raiva dos sírios contra Bashar al-Assad.
"Não estamos a tentar esconder os crimes do antigo regime, era uma máquina para extorquir dinheiro à população", relata Ali.
Georgina Deiranati descreve o ex-Presidente como um "animal selvagem", mas julga que os sírios "aprenderam a viver com a sua lei".
"O que esperar agora? Portanto, adeus à Pátria para sempre!", acrescenta a jovem, que ainda ia regularmente à Síria.
Ali, por sua vez, quer esperar que a comunidade internacional proteja as minorias na Síria e que a Rússia -- que mantém relações privilegiadas com Damasco desde os tempos soviéticos -- também intervenha.
"Mas a Rússia não pode intervir sem que lhe seja solicitada ajuda oficialmente e não há nenhuma pessoa séria no poder na Síria neste momento para o fazer", lamenta Ali.
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