Na proposta de recomendação que o vereador do Bloco de Esquerda, Sérgio Aires, leva à reunião do executivo de segunda-feira, a que a Lusa teve hoje acesso, refere-se que "as preocupantes notícias vindas a público, indicando a possibilidade de aumento muito significativo de novos hotéis no Porto", deve "suscitar a reflexão e debate sobre a ocupação e usos do solo na cidade".
"Com base nos dados do 'Licenciamento de Empreendimentos Turísticos' (2.º semestre de 2024), da Direção Municipal de Desenvolvimento Urbano, conclui-se que nos serviços da Câmara Municipal tramitaram no último ano 145 processos para empreendimentos turísticos, dos quais 87 se referem a hotéis, localizados em grande parte no centro histórico do Porto", assinala Sérgio Aires.
Outros números apresentados na proposta pelo vereador mostram que, segundo o Instituto Nacional de Estatística, havia "161 hotéis no Porto em 2023", enquanto os do Registo Nacional de Empreendimentos Turísticos do Turismo de Portugal avançam com "252 hotéis na cidade a muito curto prazo, um aumento superior a 50%".
"O Porto terá quase o dobro de Lisboa: 7,61 hotéis por quilómetro quadrado", lê-se no documento.
Defendendo que os impactos de uma tal concentração de uso do edificado para empreendimentos turísticos devem merecer toda a atenção dos decisores municipais, Sérgio Aires alerta para a sobrecarga das infraestruturas urbanas como o sistema de escoamento das águas pluviais e redes de saneamento, já ameaçadas pelos fenómenos atmosféricos extremos.
"'A teoria dos limiares' mostra-nos que a relação entre edificação e infraestruturas urbanas deve ser sempre objeto de atenção. E há também, e não menos importante, a alteração profunda no tecido humano e social da baixa do Porto, com o afastamento forçado de muita gente que ali residia", continua o vereador.
Na proposta, Sérgio Aires recorda que a classificação do Centro Histórico do Porto - "paisagem urbana excecional que testemunha uma história de dois milénios" - como "Património Mundial da Humanidade" pela Unesco, em dezembro de 1996, entre outras razões "pelo tecido urbano e pelos numerosos edifícios históricos", impõe a obrigação de manter aquele património aberto à fruição de todos os povos do mundo.
No documento, o autarca lembra também que em 2019 surgiram os primeiros alertas do ICOMOS (Conselho Internacional dos Monumentos e Sítios) sobre a "alteração grave da coerência arquitetónica e urbanística" e "perda significativa da autenticidade histórica", circunstâncias previstas nas orientações técnicas do Comité do Património Mundial e que levaram em 2009 à perda de classificação da cidade de Dresden (Alemanha) como Património Mundial, ou, mais recentemente, à intervenção da mesma entidade junto do município de Florença (Itália) devido à gestão inadequada da pressão turística.
Além da moratória de um ano no licenciamento de novos hotéis, a proposta do BE recomenda ao executivo que elabore um estudo sobre a carga turística na cidade, os seus impactos e os seus limites, que ative o Conselho Municipal de Turismo, criado em 2019, e elabore e coloque à discussão pública um Plano Municipal de Turismo.
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